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Em Brasília, Bolsonaro abandona linguajar de candidato e adota estilo conciliador de político profissional

BRASÍLIA — Eleito presidente, Jair Bolsonaro desembarcou em Brasília, na última terça-feira, convencido de que sua missão agora é desfazer a imagem do candidato agressivo, que entrou em conflito com integrantes dos Três Poderes durante a campanha. Trocou críticas ao presidente Michel Temer e ao Supremo Tribunal Federal (STF) por declarações deconciliação. Conselheiros dele dizem que, “político experimentado”, Bolsonaro sabe que precisará ser “pacificador”, em nome da governabilidade.

 

—  Ele está dando um recado para aqueles que falavam que ele seria um ditador, um tirano. Não. Ele está começando a transição de forma harmônica e democrática, com discurso conciliador. Isso é sabedoria política —  diz o cientista político Antônio Flávio Testa, integrante da equipe de transição de Bolsonaro.

 

A decisão de Bolsonaro de participar da solenidade em homenagem aos 30 anos da Constituição, no Congresso, como sua primeira agenda em Brasília foi “extremamente estratégica”, diz um parlamentar próximo ao presidente eleito. Segundo ele, Bolsonaro comentou que, depois de seu respeito à Constituição ser colocado em xeque pelos adversários durante a campanha, “fazia questão” de dar demonstração de reverência à Carta Magna.

A confirmação da presença dele surpreendeu a equipe do presidente do Congresso, Eunício Oliveira (MDB-CE), que estava pensando em “algo menor” na organização do evento. Ao lado das autoridades, Bolsonaro, defensor da ditadura militar e de ditadores nos últimos anos, deu uma declaração enfática de que a Constituição é o “norte”, sendo elogiado pelos parlamentares presentes.

Com o presidente Michel Temer, Bolsonaro se reuniu na quarta-feira. O tom foi completamente diferente do que usou em maio do ano passado, já em pré-campanha. Em vídeo, perguntou:

- Que governo de porcaria é esse do Temer? Ainda fica com essa porcaria de reforma da Previdência, 65 anos. Não vai aprovar. Você, Temer, sua excelência, Temer, não vai aprovar a reforma da Previdência. Toma vergonha na cara. Assuma a pipoca desse governo. Assuma, pô. Corta a cabeça de quem está aí. (...) Seja homem.

Em entrevista depois do encontro com Temer, disse que “muita coisa (do atual governo) continuará” e agradeceu pela acolhida.

Testa diz que o “discurso da campanha é muito agressivo pelo acirramento da disputa” e que Bolsonaro precisava se distanciar da imagem desgastada de Temer.

- Ele usou muitas palavras para se posicionar politicamente e foi vencedor. Agora, ele venceu. E claro que ele é um politico profissional, tem sete mandatos como deputado e sabe que é necessário como presidente, estadista, adotar postura conciliadora, porque há uma interdependência entre os Poderes. Para seguir a Constituição à risca, você tem de ser conciliador, tem que negociar com os Poderes, com o Congresso. Tem de ter uma articulação muito mais de estadista de que candidato - diz o cientista político.

Um dos estrategistas da campanha de Bolsonaro, Testa diz que a visita cordial ao presidente do STF, Dias Toffoli, na quarta-feira, segue a mesma lógica:

- Elas conversaram como chefe de Poderes. Passou essa fase (da campanha). Agora, tem de trabalhar em um modelo de conciliação para recuperar a economia, fazer as reformas necessárias e uma série de questões que exigirão negociação com o Congresso e também com o Judiciário.

Nos últimos anos, Bolsonaro e os filhos políticos dispararam ataques aos ministros do Supremo, acusando-os de agir ideologicamente e legislar. Na pré-campanha, Bolsonaro chegou a sugerir aumentar o número de ministros da Corte, porque os atuais estariam envergonhado o país:

- As decisões do Supremo lamentavelmente tem envergonhado a todos nós nos últimos anos. Temos discutido passar para 21 ministros, para botar pelo menos dez isentos lá dentro.

Na campanha, circulou vídeo em que o deputado Eduardo Bolsonaro fala em fechar o tribunal, caso uma decisão impedisse seu pai de assumir o cargo.

Em meio ao desconforto entre o futuro ministro da Economia, Paulo Guedes, e parlamentares, pela declaração de que é necessário da uma “prensa” no Congresso para aprovação da reforma da Previdência, Bolsonaro também se esforçou para contemporizar. Disse que trabalhará com “convencimento”, e não prensa.

Sem acenos ao Ministério Público

Os acenos de Bolsonaro não se estenderam ao Ministério Público, por ora. Segundo relatos de presentes, no gabinete de Eunício Oliveira, antes do evento em homenagem à Constituição, o presidente eleito se manteve distante da procuradora-Geral da República, Raquel Dodge, que, em abril, o denunciou por racismo devido a supostas ofensas contra quilombolas e índios, feitas durante uma palestra do deputado.

Na solenidade, ouviu o discurso da procuradora-geral sem virar o rosto para a tribuna, com o olhar fixo no plenário. Não aplaudiu. Dodge fez uma forte defesa do cumprimento da Constituição, das minorias, de liberdade para os professores e para a imprensa, o que foi interpretado como recado a ele.

Crítico a veículos de comunicação durante a campanha, Bolsonaro também manteve tom elevado com repórteres. Na terça-feira, ao ser questionado sobre o cancelamento de uma visita que seria feita pelo governo brasileiro ao Egito, abandonou a coletiva de imprensa. No mesmo dia, sua equipe havia pedido ao Congresso para que repórteres fossem impedidos de entrar no plenário da Câmara na solenidade sobre a Constituição. Em princípio aceita, a exigência foi suspensa por Eunício Oliveira. o GLOBO

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