Busque abaixo o que você precisa!

Presidente honesto consegue governar sem toma-lá-dá-cá com o Congresso, diz Miro Teixeira

Gabriel Hirabahasi / O GLOBO

 

A Câmara dos Deputados perderá na próxima legislatura o atual decano da Casa, o deputado Miro Teixeira (Rede-RJ), que está em seu 11º mandato. O experiente parlamentar avalia que a fragmentação partidária é um dos motivos para o "toma-lá-dá-cá" entre o Palácio do Planalto e o Congresso, mas que um presidente eleito honesto conseguiria administrar o Executivo sem o que ele chama de "presidencialismo de cooptação". Teixeira afirma que a solução para o próximo mandatário, caso o eleito queira, é governar ao lado da opinião pública, "se não roubar e não deixar roubar". O deputado decidiu ser candidato ao Senado neste ano após mais de quatro décadas na Câmara. Não foi eleito e dará adeus ao Congresso em fevereiro do ano que vem. A seguir, trechos da entrevista com Miro Teixeira:

ÉPOCA - O senhor acredita que a próxima legislatura será pior que a atual?

Miro Teixeira - Não existe um Congresso igual ao outro. Cada mandato é diferente. Analisando a história, Fernando Collor foi eleito com uma bancada de apenas dois deputados ainda da Constituinte. Em 1992, ele sofre impeachment. Em 1993, tem a CPI dos Anões [esquema de corrupção de deputados na Comissão de Orçamento] e o plano Real. Fernando Henrique Cardoso se elege em 1994. Depois Lula é eleito em 2002. Depois é descoberto o esquema do mensalão. O mandato atual ficou marcado pela cassação de Eduardo Cunha e impeachment de Dilma Rousseff. Quero dizer que a análise de cada legislatura só é possível ser feita depois de acontecer. Quem diria que essas coisas aconteceriam no início da legislatura? Em 2014, quem diria que Cunha faria seus desmandos? Minha estimativa é que seja sempre melhor. Espero que não tenha solavancos [como no caso de Cunha e Dilma]. A democracia vai se refinando com os anos.

ÉPOCA - A renovação no Congresso Nacional é boa ou ruim?

Miro Teixeira - Há uma desinformação, porque na verdade menos de 20% dos deputados são novos. O resto é formada por ex-secretários de estado, ex-governadores, pessoas que já estavam na política. São mais ou menos 100 novos deputados. Eu acredito que todo mandato é novo. O parlamentar tem uma nova atuação. Sempre pode ter talentos novos que nunca tiveram mandatos e se revelam. Para mim, Nelson Jobim [eleito deputado constituinte em 1987, posteriormente ministro e presidente do Supremo Tribunal Federal e ministro da Defesa] é um exemplo clássico disso.

ÉPOCA - Nesta eleição, houve aumento no número de partidos representados no Congresso. Essa fragmentação partidária enfraquece ou fortalece o Congresso perante o próximo presidente?

Miro Teixeira - Existem duas correntes. Uma delas diz que os líderes devem decidir e os deputados devem seguir. Eu não me alinho a essa corrente. Acho que cada deputado tem o seu mandato e o dever de representar as pessoas que o colocaram lá. Só tem uma entidade capaz de dar ordem ao deputado, que é o povo. A fragmentação partidária levou à cooptação e ao troca-troca de cargos pela governabilidade. Espero que o Brasil abandone esse modelo, qualquer que seja o presidente.

ÉPOCA - E como fazer isso? Quer dizer, basta o presidente não praticar o toma-lá-dá-cá? Mas como então garantir a governabilidade?

Miro Teixeira - É possível. Itamar Franco, quando assumiu em substituição ao Collor, foi pressionado na composição dos ministérios. Ele respondeu que ninguém iria pressioná-lo ou ele abandonaria a Presidência ali. Ele não teve a menor suspeita de desonestidade no governo dele. A questão é que o parlamentar não administra o orçamento da República, é o Executivo. Essa corrupção só existe pela cumplicidade do Executivo. Se tem um presidente honesto que não roube e não deixe roubar, pode escolher o ministro que for, sem que envolva obrigação dos partidos mudar os votos. Vai conseguir administrar com a opinião pública. FHC ganhou no primeiro turno nas duas oportunidades e saiu com uma ampla base de apoio. Lula e Dilma, não. Tiveram de compor dessa maneira. Se o presidente eleito não entender a história, não vai governar. No troca-troca por cargos, o parlamentar começa atendendo o presidente, mas depois faz dele seu refém.

ÉPOCA - O senhor acredita que por isso o próximo presidente terá de fazer um governo com linha de centro, já que nenhum dos dois conseguiu ampla maioria na Câmara?

Miro Teixeira - Essa definição de centro, esquerda e direita voltaram agora depois de muito tempo. O muro de Berlim já caiu. Voltaram algumas expressões, como comunista e nazista, que são discussões absolutamente improdutivas. Essas expressões voltaram por oportunismo eleitoral. É óbvio que o Brasil não é um país comunista e nem tem tendências comunistas. Também não se tornará um país nazista. Esses assuntos são do começo do século 20. São uma imposição do pavor. Nem Fernando Haddad vai implantar o comunismo nem Bolsonaro, o nazismo. Afirmar isso é ofensivo à inteligência das pessoas.

ÉPOCA - Por que o senhor escolheu deixar a Câmara e concorrer ao Senado?

Miro Teixeira - Meu objetivo era ser candidato ao governo do Estado. Estudei para isso e planejei alternativas para o Rio de Janeiro, mas não foi possível por falta de coligação. Escolhi o Senado porque representa os estados, enquanto a Câmara, o povo. Não foi uma decisão apensa por disputar mais um mandato. Depois de ter percorrido uma boa trajetória na Câmara, preferi o outro caminho.

ÉPOCA - A Rede sai enfraquecida destas eleições por causa do desempenho da Marina Silva e na eleição de deputados?

Miro Teixeira - Não sai enfraquecido ou fortalecido. A partir de agora tem que analisar para as próximas eleições e tirar lições.

ÉPOCA - O que o senhor vai fazer da vida agora depois de tanto tempo no Congresso?

Miro Teixeira - Retomo a advocacia. Tinha suspendido há 3 anos para me dedicar a estudar a situação do Rio de Janeiro. Retomo agora. De vez em quando, também me aventurarei em um pouco de jornalismo.

Compartilhar Conteúdo

444