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Esquenta o jogo eleitoral

De acordo com a sabedoria das redes sociais, uma das maiores desvantagens do Brasil ter se despedido mais cedo da Copa do Mundo é que o País viu-se obrigado a voltar a discutir prematuramente suas notícias de sempre. E elas, pegando emprestado o termo adotado pela presidente do Superior Tribunal de Justiça, Laurita Vaz, são “teratológicas”. Além do vai-e-vem das tentativas e pedaladas do ex-presidente Lula para escapar da prisão, provocam também pesadelos as articulações para a mais imprevisível eleição do País desde a redemocratização.

 

Às vésperas das convenções e da definição das alianças, os partidos tradicionais parecem caminhar na contramão dos anseios populares – ou seja, rumo ao abismo. Em que pese a irrefreável vontade do eleitor por um candidato capaz de personificar a renovação, em contraposição ao jogo surrado de velhos métodos e fórmulas, o “novo” acabou não sendo contemplado na cédula eleitoral.

 

O espelho desse quadro desalentador são as pesquisas de intenções de voto, lideradas hoje não por um aspirante ao Planalto de carne e osso, mas por um elemento abstrato: “o branco, nulo e indeciso”. Em seguida, figuram candidatos que há tempos percorrem a estrada da velha política, mas travestidos de novidade encantam segmentos expressivos do eleitorado pelas beiradas do espectro político: Jair Bolsonaro (PSL) e Ciro Gomes (PDT).

 

Mais ou menos do mesmo

Bem ou mal, Bolsonaro representa algo inédito desde a ascensão da centro-esquerda ao poder, no longínquo ano de 1994, que polarizou o debate entre PT e PSDB por 25 anos: a volta da direita ao tabuleiro do jogo sucessório, a despeito das suspeitas que cercam suas recentes inclinações liberais. Ciro Gomes nem isso. Para chegar lá, precisa provar que não é mais do mesmo. Ou menos do mesmo.

Os demais integrantes do rol de candidatos considerados competitivos, como Geraldo Alckmin (PSDB) e Marina Silva (Rede), seja pela capilaridade de suas legendas ou pelo recall de eleições anteriores, assumem um desafio maior, além é claro de confirmar que estão mesmo no páreo: mostrar ao eleitor como, mesmo sendo o crème de la crème de uma política aparentemente rejeitada pela população, podem fazer diferente para mudar os rumos do Brasil. Correm por fora Alvaro Dias, do Podemos, apostando na bem-vinda refundação da República, e Henrique Meirelles, a quem caberá manejar a portentosa máquina do MDB.

 

O cenário ainda pulverizado de 11 candidatos, no qual o imponderável ainda prevalece, pode ganhar contornos mais nítidos a partir do anúncio sobre quem irá marchar ao lado de quem, ou seja, as alianças. Mas para tornar tudo ainda mais imprevisível, os partidos decidiram adiar até o último minuto as convenções eleitorais, momento em que os aspirantes ao Planalto serão homologados. Com exceção do PDT, que lançará Ciro Gomes na semana que vem, e do PSL, que marcou a convenção destinada a oficializar Bolsonaro para o domingo 22, todos os demais partidos postergaram suas definições.

O PSB radicalizou: deixou sua convenção para o último dia, 5 de agosto. PSDB, MDB, PT, Podemos e Rede para a véspera. Já o PP marcou sua convenção para 2 de agosto. E o DEM ainda nem definiu a data. Para se ter um parâmetro, em 2014, os três principais nomes na disputa já tinham oficializado suas candidaturas em junho. O presidente do PDT, Carlos Lupi, resolveu seguir na contramão da tendência. “Antecipamos porque queremos reforçar com clareza que Ciro Gomes é nosso candidato”, explica ele.

Apesar da platitude de Lupi, a expectativa no meio político é a de que o lançamento de Ciro esquente de vez os motores da corrida eleitoral. Na quarta-feira 18, dois dias depois da convenção, o PSB deverá anunciar qual será seu caminho nas eleições. Ciro, obviamente, faz figa para ter os socialistas como aliados. De acordo com parlamentares do PSB ouvidos por ISTOÉ, essa é uma hipótese bem provável, embora ainda não definida.

À espera do PT

Ao mesmo tempo em que busca o PSB à esquerda, Ciro tenta duas outras alianças importantes na centro-direita, o DEM e o PP. As chances nos dois partidos a favor do candidato do PDT oscilam. Se as direções dos partidos tendem para Ciro, boa parte da militância e dos parlamentares considera complicada uma aliança com um nome mais identificado com a esquerda e que declarou ser contrário, por exemplo, à reforma trabalhista, que os dois partidos defendem.

Tanto as decisões do PSB como do DEM e do PP, no entanto, hoje estão muito relacionadas à definição do PT. Pesquisas em poder do DEM e do PP apontam que haveria boa chance de Lula conseguir transferir para outro nome os votos hoje registrados para ele. O problema é que o partido não define sua estratégia. É provável que insista ao máximo com Lula, lançando-o no dia 4 de agosto, mesmo sabendo que ele não disputará a eleição, até a derradeira decisão do Tribunal Superior Eleitoral de barrar sua candidatura. Somente aí anunciará de fato seu plano B. “Haverá tempo dele ser conhecido? Ou vamos entregar a eleição por WO?”, questiona um senador do PT. O mais provável é que o Plano B do PT seja mesmo o ex-prefeito de São Paulo Fernando Haddad. Mas ainda há resistências a essa solução. Há quem defenda um nome do Nordeste, região onde historicamente Lula e o PT contabilizam maior aprovação.

Cada enxadada, uma minhoca

Quem defende no DEM e no PP a “solução Ciro” entende que ele poderia neutralizar o crescimento de um candidato do PT. Para outros, porém, o melhor seria apostar justamente naquele que manteve a polarização com Lula, Jair Bolsonaro. O candidato do PSL tenta obter os apoios nos dois partidos pelas beiradas, conversando com parlamentares, não com a direção. Seu coordenador de campanha, Ônix Lorenzoni (RS), inclusive, é deputado pelo DEM.

Oficialmente, as principais conversas de Bolsonaro para aliança são com o PR, partido marcado pelas denúncias de corrupção desde o mensalão, que condenou seu presidente, Valdemar da Costa Neto. O fechamento de uma aliança com o PR, no entanto, lhe traria inegáveis vantagens: faria dobrar os poucos segundos de tempo de TV de que hoje dispõe. Por outro lado, Bolsonaro teria de relativizar seu discurso segundo o qual só existem dois caminhos possíveis para bandidos: a execução ou a prisão. O problema é que, na política, tal caminho radical atrapalha muito qualquer associação. “Para onde der uma enxadada, vai encontrar minhoca. Então, isso não pode ser empecilho”, disse um integrante da campanha.

“Haverá tempo dele (candidato do PT) ser conhecido ou vamos entregar a eleição por WO?” Senador do PT, que pediu para não ser identificado

Em condições normais de temperatura e pressão, o candidato do PSDB, Geraldo Alckmin, deveria ser o desaguadouro de todas as alianças de centro-direita. Ele ainda busca obter esses apoios. Acredita na possibilidade de crescer quando o jogo estiver mais bem definido, a partir da propaganda eleitoral na TV. Mas o fato de patinar nas pesquisas sem qualquer viés de crescimento vai tornando cada vez mais difícil sua jornada.

Quando a fase não é boa, tudo joga contra. Na última semana, por exemplo, Alckmin se fechou em copas. Intramuros, dedicou-se a estancar as articulações, que vira e mexe brotam no ninho tucano, destinadas a substituí-lo por João Doria. O tucano é pré-candidato ao governo de São Paulo, mas permanece como alternativa para a disputa ao Planalto por encarnar o “novo” acalentado pela população e ser alguém com “punch” necessário para enfrentar os extremos representados por Bolsonaro e Ciro.

As querelas internas poderiam representar mais um obstáculo para Alckmin robustecer seu palanque, mas ele segue em seu inveterado otimismo. Aposta no poder de atração do PSDB para seduzir o DEM, e, com ele, todo o bloco que o presidente da Câmara, Rodrigo Maia, comanda — no qual figuram legendas como o PRB e o Solidariedade. Resolvidas as alianças, o tucano espera tocar o coração do eleitor com um discurso liberal. Sua intenção é acabar com a gastança de dinheiro público e privatizar o que for viável para deixar a máquina pública mais leve e eficiente. Na TV, Alckmin dirá que a aprovação de quase 55% dos paulistas, o credencia para mostrar ao País que, se ajudou São Paulo a se desenvolver, pode fazer o mesmo pelo Brasil.

O tempo de televisão que Alckmin guarda na cartola como trunfo será uma das deficiências de Marina Silva, da Rede. Embora segunda colocada nas pesquisas, Marina parece completamente à margem das discussões sobre alianças. Ela só deverá ter o apoio dos igualmente nanicos PHS e PMN. Assim, Marina vai para a disputa com um tempo mínimo de TV. A chance, inclusive, de vir a perder no futuro coeficiente eleitoral fez com que a Rede evitasse alguns palanques regionais para manter os nomes de possíveis governadores na disputa para deputado federal. Caso, por exemplo, de Miro Teixeira, no Rio de Janeiro. A Rede deverá ter apenas um único palanque forte nos estados. Joga suas fichas na eleição do governador o criador da Lei da Ficha Limpa, o juiz Márlon Reis, no Tocantins. Por ora é pouco. Muito pouco. Decepcionante até para os entusiastas da Rede.

Racha na esquerda

 

Quem se disse decepcionado, não com Marina, mas com o aliado PCdoB foi o ex-presidente Lula. Da sala da Polícia Federal que ocupa como cela em Curitiba, enquanto os petistas encenavam o teatro do absurdo pela sua soltura, Lula manifestou a contrariedade a interlocutores. Esperava ter os comunistas ao lado do PT na campanha. No caso do PCdoB, as razões são semelhantes às do PSB: a indefinição petista leva o partido a prosseguir com a campanha de Manuela D’Ávila. Ela espera manter votos no primeiro turno que a tornem influente no segundo turno, quando optaria pelo nome mais à esquerda na disputa. Raciocínio semelhante desenvolve Guilherme Boulos, do PSOL.

Numa tentativa de aglutinacão do centro, ao menos três presidenciáveis resolveram se reunir em um convescote para discutir alianças. São eles, Flávio Rocha, Affif Domingues e Paulo Rabello de Castro, que almoçaram com o ex-ministro Delfim Netto na terça-feira 10. Também pelo centro, Henrique Meirelles, ex-presidente do Banco Central e ex-ministro da Fazenda, sabe que é bem difícil que avance muito além dos baixíssimos índices que hoje ostenta nas pesquisas. Mas espera vir a se tornar um nome influente no debate. Especialmente pelo fato de ser candidato pelo maior partido do país. No quadro eleitoral incerto, Meirelles acaba sendo um símbolo da disputa deste ano. Uma eleição onde o líder das pesquisas é a ausência de votos, o candidato do maior partido do País é alguém que não tem voto algum.

Quadro atual está longe de dar aos eleitores garantia de responsabilidade macroeconômica

 

Se dispusesse de musculatura eleitoral suficiente para ser alçado aos píncaros da disputa, Meirelles ao menos poderia personificar a retomada econômica com segurança e credibilidade. Exagero ou não, é dessa maneira que ele pretende se apresentar na campanha. Infelizmente, o atual quadro eleitoral ainda está longe de dar aos eleitores alguma garantia mínima de responsabilidade macroeconômica e de iniciativas de reformas no próximo governo. A cristalização do favoritismo de candidatos com discursos que flertam com o extremismo e o populismo, nesta que é a eleição mais decisiva para o País desde a redemocratização, constitui — mais do que uma lamentável realidade — um alerta ao eleitor que ainda não decidiu o seu voto. A boa notícia é que ainda há uma longa e importante jornada a percorrer até o derradeiro escrutínio das urnas.

Mudanças urgentes
O próximo presidente da República, a ser eleito em outubro, terá questões prementes a resolver a partir de 1º de janeiro de 2019:

>> Reformas prioritárias
As reformas da Previdência, Tributária e Política são emergenciais, com propostas precisando ser encaminhadas ao Congresso nos primeiros meses de governo. ISTOÉ

 
 

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