Eunício e Ciro: tudo junto e misturado
Sim, a política é dinâmica, mas recomenda-se evitar fazer o distinto público de bobo. Nos últimos dias, a crônica política deu conta de um encontro entre o senador Eunício Oliveira (PMDB), o governador Camilo Santana (PT) e o prefeito Roberto Cláudio (PDT). O regabofe ocorreu em 31 de agosto, no Coco Bambu, de Brasília, casa que vive apinhada de clientes. Portanto, o trio escolheu a dedo um lugar para ver e ser visto. Bem cearense, não é?
Em entrevista ao O POVO (edição da última segunda-feira), Eunício Oliveira “não negou as conversas de bastidores de que seu grupo político estaria se reaproximando do petista (Camilo) com possibilidade de estarem juntos novamente nas eleições de 2018”. Sim, creiam!
Ao decidir conversar com o governador e com o prefeito, Eunício sabe muito bem que está conversando também com o ex-governador Cid Gomes e com o restante da família que detém a hegemonia da política cearense. Inclua-se na lista Ciro Gomes, cuja eloquência verbal proferiu uma impressionante sequência de vitupérios contra o senador.
Vamos a um singelo resumo de palavras dirigidas por Ciro ao presidente do Senado: aventureiro, mentiroso, lambanceiro, mistura de Pinóquio com irmão metralha, um pinotralha. Diga-se que esse fabuloso conjunto foi dito de uma só vez, em 2014, em ato de inauguração do comitê de Camilo Santana. Desde então, muitos outros “conjuntos” foram pronunciados. O coroamento: Ciro disse que a eleição de Eunício para presidir o Senado era “uma vergonha”.
Durante a campanha de 2014, escrevi algumas vezes a respeito. Chamava a atenção o fato de Eunício Oliveira, candidato contra Camilo, calar-se diante da metralhadora verbal de Ciro. Alertava que calar-se diante de tão fortes ataques correspondia a consentir. Quase sempre, o senador preferiu reforçar o fígado e aguentar calado. No fim das contas, a derrota na disputa. Sinal de que uma parte do eleitorado acreditou em Ciro.
Mais recentemente, Eunício se saiu com essa: “A oposição terá candidato ao governo e candidato na chapa majoritária para senador. Ninguém se iluda, eu saio da política, mas não faço acordo com esse cidadão chamado Ciro Gomes, que só sabe denegrir. Ninguém sabe do que ele vive, mas vai todos os dias para as rádios e televisão denegrir a vida alheia. Eu não me junto com gente desse tipo”.
Pois é. A não ser que se queira passar a ideia de que Ciro não tem nada a ver com quem o ladeia. Camilo é Camilo, Roberto é Roberto e... Cid é Cid. Bingo! É essa a ideia. Camilo para governador, Zezinho para a vice, Cid para senador e Eunício também para senador. E Ciro? Ora, Ciro dá uma pausa na língua e faz a sua campanha presidencial deixando o Ceará com os cearenses.
Não haverá na trama excesso de esperteza? Afinal, até na política há limites para determinados tipos de pacotes a serem colocados à disposição do eleitor. Diante da podridão que nossa política produziu nos últimos anos, há sempre a possibilidade de o estômago do eleitor estar em fase, digamos, de alta sensibilidade. Assim, é grande o risco de regurgitar o que lhe empurram goela abaixo. PMDB CUSTOMIZADO
A movimentação de Eunício Oliveira, que aceitou o convite de Camilo e RC para o ensaio de um xote, sugere que o PMDB vai adotar em 2018 a postura que já se tornou especialidade do partido. Ou seja, mesmo que a sigla componha uma chapa com candidato a presidente da República, não se obrigará a seguir a mesma composição nos estados.
Não é só o senador cearense que se movimenta nessa linha. Em Alagoas, Renan Calheiros passeia pela mesma calçada. Não foi à toa que se abraçou o Lula-lá (e vice-versa) na passagem do petista pelo Estado. Lá, Renan quer salvar a sua pele e a de seu filho, que governa o Estado.
É o velho PMDB de guerra. A ideia de sempre é se amoldar às circunstâncias mais favoráveis de cada estado, eleger uma grande bancada para o Congresso e salvar a pele dos que precisam de foro privilegiado. Se for possível eleger governadores, ótimo. Porém, não se trata de uma prioridade.
Quanto ao próximo presidente da República, o PMDB vai fazer o que sempre fez. Como fiel da balança para formar a maioria parlamentar, venderá (caro) o seu apoio ao futuro ocupante do Palácio do Planalto.
EFEITO PALOCCI NO CEARÁ São tantos e avassaladores os acontecimentos que, no Brasil, a articulação política passou a ter curtíssima validade. É que a Lava Jato virou cacique e precisa ser consultada antes dos protagonistas adotarem qualquer caminho e fecharem qualquer acerto para o ano que vem.
É bom que se diga que a trama política relatada na abertura desta coluna acerca do Ceará pode ter perdido muito de sua viabilidade. Tudo tinha sentido até o momento em que Antônio Palocci, numa calma bovina, recolocou Lula no centro da Lava Jato.
Agora, já não se sabe ao certo se o embrulhado Lula será candidato a presidente. Pior: já não se sabe ao certo se será bom negócio para parte dessa inusitada aliança cearense (PMDB-PT-PDT) carregar nas costas a candidatura do ex-presidente condenado em primeira instância e acusado pelo seu mais fiel escudeiro.
BERÇO ESPLÊNDIDO E a oposição? A preço de hoje, Camilo Santana é imbatível. Afinal, até aqui, não há concorrente disponível. Especula-se, é verdade! Mas especulação não disputa voto. A especulação tem nome: o executivo e administrador Geraldo Luciano. Ainda há quem fale em Tasso Jereissati, mas os mais íntimos amigos do tucano não apostam um níquel na possibilidade.
Geraldo Luciano é um respeitável desconhecido do grande público. Em eleição curta, trata-se de um problema. Porém, sua trajetória se enquadra no perfil que parte significativa do eleitorado gostaria de ver na disputa. No caso, um nome com currículo reluzente, que nunca tenha se envolvido com a política e seja capaz de atrair votos com um programa de governo e não com a promessa de distribuir cargos a rodo.
Do jeito que está a política brasileira, um pré-candidato desconhecido é uma desvantagem na mesma dimensão em que é uma vantagem. Não carrega desgastes. No entanto, o calendário impõe que nome com tais características seja trabalhado com a devida antecipação.
FÁBIO CAMPOS / OPOVO