Espiral de violência na política tem de ser contida
Por Editorial / O GLOBO
Não existe dimensão mais alarmante da violência política que o homicídio. Na terça-feira, o candidato a vereador em Nova Iguaçu Joãozinho Fernandes (Avante) foi morto a tiros. Em quatro meses, pelo menos oito candidatos, parentes ou assessores foram assassinados na Baixada Fluminense. Em todo o país, 35 lideranças políticas morreram de janeiro a junho, de acordo com o Observatório da Violência Política e Eleitoral no Brasil, organizado pela Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (Unirio). Na comparação com o último ciclo eleitoral municipal, o registro de ocorrências — de homicídios a agressões ou ameaças — cresceu 9,35%.
Mesmo sem resultar em morte, os casos são preocupantes, como demonstra a campanha degradante para prefeito de São Paulo. Em debate no dia 15 de setembro, o candidato José Luiz Datena (PSDB) respondeu às repetidas provocações de Pablo Marçal (PRTB) desferindo uma cadeirada no oponente. Duas semanas depois, em novo debate, um cinegrafista da equipe de Marçal deu um soco no rosto do publicitário de Ricardo Nunes (MDB). No começo de agosto, o candidato do PSOL à Prefeitura de Teresina, Francinaldo Leão, registrou boletim de ocorrência depois de ter sido agredido com uma cabeçada pelo prefeito Dr. Pessoa (PRD), que busca a reeleição.
Se nada for feito, a tendência é que a espiral de violência siga em rota ascendente. Por isso investigadores devem tratar crimes com viés eleitoral como prioritários, e os julgamentos precisam ser céleres. Esses atentados são ataques à vida e também à democracia. Nas palavras felizes da ministra Cármen Lúcia, presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), a “violência praticada no ambiente da política desrespeita não apenas o agredido, senão que ofende toda a sociedade e a própria democracia”.
Em discurso na última terça-feira, ela citou despreparo, descaso ou tática ilegítima e desqualificada das campanhas políticas. Seja qual for a causa ou a intenção para os atos violentos, argumentou Cármen Lúcia, não há justificativa. “Atenta-se contra cidadãs e cidadãos, atacam-se pessoas e instituições e, na mais subalterna e incivil descompostura, impõe-se às pessoas honradas do país, que querem apenas entender as propostas que os candidatos oferecem para a sua cidade, sejam elas obrigadas a assistir a cenas abjetas e criminosas, que rebaixam a política a cenas de pugilato, desrazão e notícias de crimes”, disse.
Cármen Lúcia acertou ao conclamar os partidos para que “tomem tenência” da situação. Afinal, campanhas eleitorais são financiadas com dinheiro público. Juntos, os 29 partidos receberão R$ 4,9 bilhões para a corrida eleitoral deste ano. Segundo ela, as legendas não podem “pactuar com desatinos e cóleras expostas em cenas de vilania e desrespeito aos princípios básicos da convivência democrática”. A transformação de debates em ringues eleitorais deve ser investigada pela polícia, pelo Ministério Público e pelos tribunais eleitorais.
É também necessário que os legisladores e o TSE se debrucem sobre o assunto para encontrar formas de coibir as agressões. Por fim, os partidos devem escolher melhor seus candidatos e, depois de episódios de violência, retirar suas candidaturas. A democracia, é sempre bom lembrar, proporciona a solução de conflitos pelo uso da palavra, e não da força.