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Eleições 2022: Bolsonaro avançou mais em cidades que dependem do Auxílio Brasil

Por Marlen Couto e Nicolas Iory — Rio e São Paulo /  O GLOBO

 

Com 1,76 milhão de eleitores a mais que no primeiro turno de 2018, o presidente Jair Bolsonaro (PL) avançou principalmente sobre regiões do país mais dependentes do Auxílio Brasil, sua principal aposta para atrair nas urnas o apoio dos brasileiros de baixa renda. Um cruzamento feito pelo GLOBO, a partir de dados do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e do Ministério da Cidadania, revela que 52% destes votos tiveram origem em municípios em que a maioria da população recebe o benefício.

 

Hoje, o programa atende 20,6 milhões de famílias, número que vai aumentar para 21,1 milhões já antes do segundo turno. Ao todo, são beneficiadas mais de 53 milhões de pessoas. O Brasil tem 1.455 cidades em que pelo menos metade dos habitantes recebeu pagamentos do Auxílio Brasil em setembro. Em 1.241 delas — oito a cada dez —, Bolsonaro expandiu o eleitorado em quatro anos.

Em números absolutos, o maior crescimento ocorreu em Itaituba (PA), cidade de cem mil habitantes, onde 50% dos moradores recebem o benefício do governo federal. O candidato do PL teve um acréscimo de 10.761 votos, garantindo uma vantagem ainda maior sobre o petista Luiz Inácio Lula da Silva (21 pontos) do que contra Fernando Haddad (11 pontos), candidato do PT em 2018.

No Nordeste, única região em que Bolsonaro perdeu para Haddad em 2018 e onde Lula teve maior vantagem na votação do último domingo, o candidato à reeleição conseguiu aumentar seu desempenho em 85% das cidades em que pelo menos metade da população recebe o benefício — das 1.192, elevou o próprio patamar em 1.019.

Apesar de ter melhorado seu desempenho nas cidades altamente dependentes do Auxílio Brasil, Bolsonaro perdeu para Lula em 97% desses municípios. O ex-presidente amealhou nessas localidades 2,5 milhões de votos a mais que os obtidos por Haddad.

Impulso ao programa

Dentro da estratégia de estreitar a margem para Lula nessa fatia do eleitorado, o presidente prometeu criar um 13º para mulheres inscritas no Auxílio Brasil, e a Caixa passará a ofertar crédito consignado a beneficiários do programa, uma operação da qual os grandes bancos decidiram ficar de fora. Logo no dia seguinte ao primeiro turno, Bolsonaro decidiu antecipar em sete dias os pagamentos da próxima parcela do Auxílio Brasil — os valores começarão a ser depositados a partir de terça-feira.

Professor da Fundação Dom Cabral e autor do livro “Dinheiro, eleições e poder: as engrenagens do sistema político brasileiro”, Bruno Carazza avalia que os dados indicam que Bolsonaro avançou sobre redutos eleitorais de Lula, ainda que não o suficiente para ficar à frente:

— Em um país dividido regionalmente e por renda, o que vai fazer diferença é entender quanto cada um vai conquistar de votos no território alheio.

Ao longo da campanha, diferentes pesquisas de opinião pública indicavam haver preferência dos eleitores que recebem o Auxílio Brasil por Lula. O Datafolha divulgado a três dias do primeiro turno mostrava que 58% dos beneficiários do programa declaravam a intenção de votar no petista, contra 26% que diziam apoiar Bolsonaro.

O cientista político Fernando Meireles, autor de pesquisa do Cebrap/FGV sobre a distribuição dos votos em Bolsonaro, destaca que a melhora no desempenho do presidente em cidades irrigadas pelos recursos do Auxílio Brasil não depende só dos beneficiários diretos do programa:

— Quando, de uma hora para outra, você coloca muito dinheiro em determinado município, você muda a realidade da economia local. Várias famílias passam a mudar seu padrão de consumo, o comércio local é fomentado, e pessoas passam a ter acesso a outras opções de lazer, por exemplo.

Mais benefício, mais votos

Bolsonaro foi o mais votado no primeiro turno em nove das dez unidades da federação onde seu governo mais ampliou o número de beneficiários. Por outro lado, em nove dos dez estados em que o total de lares assistidos pelos recursos federais cresceu menos durante a gestão bolsonarista, o mais votado foi o ex-presidente Lula.

No Rio de Janeiro e no Distrito Federal, a quantidade de beneficiários dobrou durante o governo Bolsonaro: chegou a 1,7 milhão de famílias no Rio e a 147 mil no Distrito Federal. O presidente obteve mais da metade dos votos na eleição do último domingo nesses locais.

O candidato à reeleição foi também o mais votado em Santa Catarina, Espírito Santo, Mato Grosso, Rio Grande do Sul, Mato Grosso do Sul, São Paulo e Goiás. No ranking dos dez estados onde o número de famílias atendidas mais cresceu, o único em que Bolsonaro teve menos votos que Lula foi o Amapá, justamente o décimo da lista. Na lista dos dez em que a expansão do programa foi menor, o único em que o presidente venceu nas urnas foi Roraima.

O professor Sérgio Simoni Junior, da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, pondera que não é possível atribuir só ao Auxílio Brasil a votação do candidato do PL nas áreas em que o programa foi turbinado, mas vê nas ações de transferência de renda um elemento capaz de influenciar na decisão de voto. Para ele, a campanha demorou para “levantar a bandeira do Auxílio Brasil” e não conseguiu extrair ao máximo o ganho eleitoral do programa, que substituiu o Bolsa Família.

— A pandemia trouxe consequências, como a expansão da pobreza, e a classe média baixa teve acesso ao benefício pela primeira vez. Pode ser que essa classe que perdeu renda e começou a ser contemplada pelo programa tenha passado a apoiar Bolsonaro e que isso tenha influenciado no resultado do primeiro turno.(Colaborou Victória Cócolo)

 

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