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Ainda os ciclos eleitorais

Em sete eleições federais realizadas desde a volta da democracia, de 1982 a 2014, captadas pela Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD), a pobreza cai em todos os anos eleitorais e sobe em todos os anos pós-eleitorais, com exceção de 2007. A queda média de pobreza em ano eleitoral foi 12,82% e o aumento no ano pós eleitoral foi de 14,92%. Essa é uma das conclusões de estudos levados a cabo pelo economista Marcelo Neri, da Fundação Getulio Vargas do Rio, especialista em distribuição de renda. Neri foi presidente do IPEA e ministro de Assuntos Estratégicos do governo Dilma.

Ele diz que se retirarmos o ano de 1986 da amostra, que corresponde ao ano do Plano Cruzado, onde o ciclo eleitoral foi mais marcado, a queda de pobreza foi de 8,34% em ano eleitoral seguido de aumento médio de 8,2% em anos subsequentes. A literatura sobre ciclos eleitorais, como tratamos na quinta-feira, descreve o comportamento de políticos que embelezam seus sucessos em anos de eleição, de forma a influenciar os resultados do pleito, e no ano seguinte apresentam ajustes na economia, gerando o resultado oposto.

Os instrumentos usados eleitoralmente no Brasil são diversos, desde flutuação macroeconômica promovida por políticas fiscais ou planos de estabilização sintonizados com o calendário das urnas, passando pelo controle seletivo de preços públicos administrados como eletricidade e gasolina, chegando a mudanças nas transferências públicas como benefícios sociais e previdenciários.  

De oito eleições federais de 1978 a 2013 analisadas, nos anos eleitorais houve oito aumentos reais na renda mediana, enquanto nos anos imediatamente após as eleições foram sete reduções. Observando o período entre 1981 e 2013, nos anos de eleição, o crescimento real médio da renda mediana foi de 11,33% enquanto, nos anos seguintes àqueles em que ocorreram os pleitos, a queda líquida foi de -7,3%. Resultados qualitativamente semelhantes foram encontrados nas estatísticas relacionadas com a pobreza.

Os estudos coordenados por Marcelo Neri na FGV-Rio mostram que, de 1992 a 2006, os aumentos de renda foram maiores nos anos de eleição, caracterizando o ciclo  eleitoral. Naqueles anos, em média, a renda oriunda de programas sociais teve o maior aumento (22,57%), seguido dos benefícios da previdência social (10,51%) e da renda do trabalho em geral (3,16%). Nos anúncios recentes os R$ 400 mínimos por Família do Auxílio Brasil praticamente dobra o benefício médio do antigo Programa Bolsa Família. Entretanto, este benefício deixa de vigorar em janeiro de 2023, logo depois das eleições. Ou seja, funciona como um piso temporariamente retrátil em termos nominais.

Quando janeiro de 2023 chegar, diz Neri, a inflação já terá reduzido este valor. Além disso, os R$ 400, embora eficazes em termos de marketing político, não levam em conta o tamanho nem o grau de pobreza de cada família. O princípio de que quanto mais pobres e maiores as famílias maiores são as necessidades de recursos envolvidas é perdido. “No bojo da crise de 1999, gestamos e depois parimos o Bolsa Escola federal; em meio às agruras da crise de 2003, nasceu o Bolsa Família. Na atual crise desaprendemos lições básicas e voltamos ao tempo de distribuição de cestas básicas em período eleitoral”, lamenta o economista.

Em termos de multiplicadores de gastos públicos, segundo Marcelo Neri, cada real gasto com Bolsa Família dispara um multiplicador 3 vezes maior que o dos gastos previdenciários com anúncio de antecipação de 13º benefício; 5 vezes maior que os do FGTS - usado de novo em 2022 como ferramenta anticíclica; 1,68 mais que o abono salarial do PIS-Pasep. Para Marcelo Neri, uma lição é que se olharmos primeiro para os mais pobres, buscando protege-los, freando os aumentos da desigualdade, preservamos também o movimento da economia como um todo.

As medidas adicionais anunciadas pelo governo federal como consignação de empréstimos de beneficiários do Auxílio Brasil e do BPC, aumento da parcela consignável das pensões e aposentadorias inovam no oportunismo eleitoral. A eleição de 2022, a décima realizada desde a histórica eleição direta para governadores em 1982, parece inovar em resgatar práticas antigas marcadas de oportunismo eleitoral.

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