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O mal que Lula faz à oposição

O Estado de S.Paulo

06 de fevereiro de 2022 | 03h00

Segundo o conto lulopetista, Luiz Inácio Lula da Silva seria o grande líder da esquerda brasileira, aquele que, nas últimas décadas, mais teria contribuído para o fortalecimento da chamada causa progressista no País. De acordo com a anedota, o ex-sindicalista encontrou resistência nos setores conservadores da sociedade, mas sua trajetória política seria a realização plena do sonho da esquerda: o operário que chega ao poder e transforma os caminhos da população. Nesse enredo, Lula seria o grande adversário da direita e o grande amigo da esquerda.

É fato que Lula, especialmente depois de forjar a desumana e antissocial divisão do País do “nós contra eles” e subverter a moralidade pública, encontrou e encontra forte oposição em parte considerável da população. Seria equivocado, no entanto, imaginar Luiz Inácio Lula da Silva como o grande benfeitor da causa da esquerda, tal como narra o conto lulopetista. A atuação do líder petista faz muito mal também à própria esquerda, submetendo-a a interesses particulares e impedindo sua livre organização e modernização.

Caso paradigmático é a contribuição de Lula para a permanência de Jair Bolsonaro no poder. Quando parcela significativa da população – especialmente, o eleitorado mais à esquerda –, indignada com a atuação do governo federal na pandemia, passou a pedir o impeachment de Bolsonaro, o PT fez mero jogo de cena. A omissão de Lula foi, no mínimo, incompatível com sua pretensa função de “grande liderança da esquerda”. Como se diz, o ex-sindicalista ficou na moita. Não fez nenhum movimento que pudesse acarretar eventual inelegibilidade de Bolsonaro. Afinal, sem o ex-capitão na corrida eleitoral, Lula teria muito mais dificuldade em sua campanha para voltar ao Palácio do Planalto.

 

Dessa forma, quando muitos se perguntam como foi possível que a nefasta atuação de Jair Bolsonaro na pandemia não tenha levado ao impeachment do presidente, é preciso advertir a ajuda especial de Luiz Inácio Lula da Silva ao ex-capitão. O PT contribuiu para o Congresso permanecer alheio ao tema.

Vale lembrar também que Lula – que agora procura expandir os contornos de sua candidatura, fazendo tratativas com políticos mais à direita – proibiu expressamente Fernando Haddad de fazer movimento similar em 2018, até mesmo no segundo turno. Na prisão em Curitiba, Lula não trabalhou pela vitória da esquerda, mas exclusivamente por sua causa pessoal.

Tudo isso, que talvez escandalize pessoas mais jovens, não é nenhuma novidade. A história do PT sempre foi a tentativa de submeter o campo da esquerda à sonhada hegemonia de Luiz Inácio Lula da Silva. Essa pretensão provocou muitos atritos e rupturas. É fato notório que muita gente, ligada às origens da legenda, se frustrou profundamente com as práticas e rumos adotados pelo PT.

Mas o mal que Lula faz à esquerda transcende os limites de seu partido. Tal pretensão de hegemonia abastardou o debate e a articulação de propostas políticas sérias mais à esquerda. Muitas vezes, a discussão de ideias e projetos no chamado campo progressista – tão necessária para uma democracia plural e madura – ficou inviabilizada pela atuação de Lula e de sua legenda, que, incapazes do diálogo, não tinham maiores pudores em impor seus interesses.

A campanha de desinformação do PT em 2014 contra a então candidata do PSB à Presidência da República, Marina Silva, é apenas um exemplo, entre muitos, de como Lula trata quem é de esquerda, mas não lhe presta vassalagem. Diante disso, compreende-se o fenômeno que se vê neste início de ano: a resistência de políticos com um pouco mais de experiência, que já sentiram na pele o modus operandi lulopetista, a apoiar a pré-candidatura de Lula.

A rigor, não é a direita que sofre com Lula. Quem mais padece e se vê tolhido pelo lulopetismo é o próprio campo da esquerda democrática e responsável, que, entre outros danos sofridos, se torna invisível para grande parte da população, ofuscado por um político parado no tempo que só se ocupa de si mesmo.

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