Inventar a própria roda
A falta de opções na disputa presidencial pode ser definida pela atual situação refletida nas pesquisas de opinião, especialmente as das empresas mais bem equipadas, IPEC ( ex-Ibope), e Datafolha. O brasileiro votou em Bolsonaro para tirar o PT, e está votando no ex-presidente Lula para para tirar Bolsonaro do governo. Não apareceu alternativa, a famosa terceira via, que permita acabar com esse jogo de empurra de um lado para outro, que acaba dando errado.
Sempre estamos escolhendo o “menos ruim”, que se revela posteriormente inevitavelmente ruim. Desde a redemocratização, só elegemos candidatos populistas, como Collor, Lula, Dilma, Bolsonaro. Com exceção do Plano Real que elegeu Fernando Henrique Cardoso, que não foi feito para ser populista, mas atingiu o bolso dos cidadãos ao conter a hiperinflação. Já havíamos tido uma experiência anterior com o Plano Cruzado, que, ao derrubar a inflação temporariamente, deu a vitória ao MDB de Sarney em todo o país.
O diretor do DataFolha, Mauro Paulino, diz que o eleitor vota pragmaticamente, naquele que vai ajudá-lo no sofrido dia a dia. A prioridade do brasileiro médio é o bolso e a sobrevivência, e essa situação hoje está muito agravada. Cerca de 15 milhões de brasileiros estão desempregados, a inflação dos mais pobres já ultrapassa os 10% da inflação oficial, 27 milhões de brasileiros vivem abaixo da linha de pobreza, cerca de 50 milhões são tecnicamente pobres, a fome nos dá diariamente exemplos terríveis de gente disputando ossos com resto de carne e famílias inteiras morando nas ruas das grandes cidades.
Num ambiente desses, mesmo que houvesse um grande político à disposição da terceira via, não há espaço para grandes discussões. A questão vira, para a maioria dos eleitores, “quem vai me ajudar", “quem pode me ajudar”, ou quem convence mais pessoas que é a solução milagrosa para resolver os problemas. Na campanha, existe um milagre prometido, hoje é o que leva Lula a poder vencer no primeiro turno: promessa de picanha e cerveja para todo mundo, a volta a um tempo que nunca houve.
Quando começa o governo, a realidade se impõe a essas promessas vãs, a esses sonhos de que uma pessoa só resolverá o problema do Brasil. Estamos numa situação muito complicada. Você elege qualquer um que venda ilusões, que consiga passar para a população uma expectativa de melhoria. Foi assim em 2018 com Bolsonaro, e está sendo assim em 2022 com Lula, que aparece como o grande salvador da Pátria. Não é à toa que o ex-juiz Sérgio Moro já está dando uma guinada em sua proposta de governo, pondo mais ênfase na criação de um projeto nacional contra a pobreza, deixando o combate à corrupção como necessário, mas não suficiente para governar o país de hoje, pois a emergência é outra.
Se o governo Bolsonaro seguisse os rumos que prometia, de apoio a políticas anti corrupção, não haveria clima no país para a reviravolta jurídica que beneficiou o ex-presidente Lula e todos os condenados pela Operação Lava Jato. Também não é por acaso que Lula busca o ex-tucano Geraldo Alckmim para vice, é um aceno para o eleitor de centro. Difícil vai ser Alckmim encontrar uma justificativa para passar por cima de seus discursos inflamados contra Lula e os corruptos do PT na campanha de 2016.
O Lula do primeiro governo, que levou tucanos para postos chaves como o Banco Central e outros do ministério da Fazenda, não é o verdadeiro Lula. O PT foi muito intolerante com todos os tucanos que estavam no governo Lula. Se Antonio Palocci não fosse tão forte politicamente na ocasião, tinham saído todos os tucanos que estavam lá ajudando a fazer um governo equilibrado financeiramente, que deu chance, num momento econômico bom do mundo, de Lula avançar nos programas sociais.
Quem será o petista que assegurará a Geraldo Alckmim um papel não decorativo num eventual governo Lula? Ele terá mandato, estará protegido, mas não será ouvido nem cheirado se a ala radical do petismo dominar o governo. Quando o PT resolveu fazer a sua política econômica, começou a derrocada que deu na tragédia do governo Dilma. O problema é que nunca há governos seguidos com uma política de estado. Cada um quer inventar sua própria roda.