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Atas idênticas levantam suspeita de simulação de partidos na divisão de fundo eleitoral

BRASÍLIA

Se as eleições de 2018 foram marcadas por esquemas de candidatas laranjas nos partidos políticos, as de 2020 já começam sob suspeita de simulação de reuniões para definir os critérios de distribuição do bilionário fundo eleitoral, a maior fonte de recursos públicos para os candidatos a prefeito e vereador.

Folha identificou ao menos quatro partidos que entregaram ao TSE (Tribunal Superior Eleitoral) atas de reuniões partidárias com trechos idênticos entre si, um "Ctrl+C/Ctrl+V" que indica a suspeita de que siglas possam ter burlado exigências legais.

O PSL, por exemplo, saiu da condição de nanico em 2018 e terá neste ano direito à segunda maior fatia do bolo, quase R$ 200 milhões, por ter recebido uma expressiva votação na onda que elegeu Jair Bolsonaro presidente da República.

 
 

A ata da reunião em que o partido do deputado federal Luciano Bivar (PE) teria definido as diretrizes para distribuição dos seus recursos, datada de 3 de junho de 2020, traz a transcrição de uma situação que se assemelha nos mínimos detalhes, incluindo praticamente as mesmas palavras e os mesmos erros de português, a uma descrita na reunião do PL, com data de realização de quase um mês antes, 13 de maio.

Os dois partidos ocupam sedes vizinhas, no nono andar de um dos principais prédios de escritórios de Brasília.

A ata da reunião do PL descreve a seguinte cena, que teria se desenrolado às 15h do dia 13 de maio, uma quarta-feira, na sala 903 do Centro Empresarial Brasil 21, região central de Brasília:

"A senhora secretária-geral, Mariucia Tozatti, fez uso da palavra, para destacar a todos os presentes que entendia que o PL deveria, na distribuição de seus recursos, contemplar os mesmos critérios adotados pelo legislador, demonstrando o fortalecimento de suas bancadas no Congresso Nacional", diz o documento, que prossegue:

"O presidente [José Tadeu Candelária] franqueou a palavra aos demais presentes [não há vírgula] os quais se manifestaram favoráveis às manifestações feitas na presente Sessão. Diante de tais manifestações, o Senhor Presidente sugeriu a suspensão da presente Sessão para que se possa discutir e elaborar uma Resolução Administrativa desta Comissão Executiva Nacional, estabelecendo critérios da distribuição do Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC). A sugestão foi aprovada por unanimidade dos membros presentes, tendo a Sessão sido suspensa às 15h15".

A ata da reunião do PSL descreve uma cena incrivelmente similar, que teria se desenrolado às 9h do dia 3 de junho, também uma quarta-feira, em uma sala no corredor oposto ao do PL, a 906, sede nacional do partido.

"O senhor presidente opinou no sentido de que o PSL deveria, na distribuição dos seus recursos, contemplar os mesmos critérios adotados pelo legislador, demonstrando o fortalecimento de suas bancadas no Congresso Nacional", inicia o texto do PSL.

"O senhor presidente [Luciano Bivar] franqueou a palavra aos demais prestentes [não há vírgula] os quais se manifestaram favoráveis às manifestações feitas na presente reunião. Diante de tais manifestações, o senhor presidente sugeriu a suspensão da presente reunião para que se possa discutir e elaborar uma resolução interna desta comissão executiva nacional, estabelecendo critérios de distribuição do FEFC. A sugestão foi aprovada por unanimidade dos membros presentes, tendo a reunião sendo [sic] suspensa às 10h."

Para que cada um dos 33 partidos políticos receba a sua fatia do fundo eleitoral —que na eleição de 2020 irá ratear R$ 2,035 bilhões—, é preciso que ele reúna seus dirigentes e aprove uma resolução estabelecendo os critérios que irá utilizar para repassar a verba pública aos candidatos. Após isso, a sigla deve encaminhar toda a documentação ao TSE, além de fazer ampla divulgação em seus canais de comunicação.

O objetivo é aprimorar a gestão do dinheiro público, forçando a transparência e o estabelecimento de regras mais claras, além de tentar combater a tendência histórica de os caciques partidários decidirem, sem qualquer tipo de satisfação pública ou interna, qual candidato terá direito ao dinheiro e qual não terá.

Na prática, porém, algumas siglas optam por critérios vagos e subjetivos —uma muito usada é a da submissão da decisão à "conveniência partidária", sem detalhes sobre o que isso signifca na prática—, mantendo, assim, o controle sobre o dinheiro nas mãos dos principais dirigentes.

O PSL esteve em 2018 no centro do esquema das candidaturas laranjas, o que resultou em denúncia do Ministério Público contra o ministro do Turismo, Marcelo Álvaro Antônio, então presidente da sigla em Minas Gerais, e em indiciamento de Bivar pela Polícia Federal.

Uma das suspeitas foi o repasse de R$ 400 mil de dinheiro público do PSL para uma secretária de Bivar, Maria de Lourdes Paixão, 68, que oficialmente concorreu a deputada federal e teve apenas 274 votos.

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