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No Brasil o que espanta é a certeza da impunidade, diz norte-americana

 

ara a brasilianista norte-americana Barbara Weinstein, o que chama mais atenção nos casos de corrupção brasileiros que se noticiam nos EUA é a atitude dos envolvidos, "com a certeza da impunidade e ainda fazendo o possível para não serem pegos e não terem de retroceder a uma situação de brasileiros comuns".

Professora da Universidade de Nova York, Weinstein acaba de lançar "The Color of Modernity" (Duke University Press), em que analisa as representações de São Paulo em dois momentos da história do século 20 –a Revolução de 1932, e o quarto centenário da cidade, em 1954. "Nessa época, houve grande produção de livros e de outras interpretações cujo objetivo era identificar São Paulo com um Brasil que deu certo."

Leia, abaixo, a entrevista que Weinstein concedeu àFolha, por Skype.

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Folha - O que chama sua atenção sobre a corrupção no Brasil e a atual crise política? Barbara Weinstein- Me escandaliza menos a questão sobre se os envolvidos nos escândalos tinham ou não direito de fazer o que fizeram –obviamente que não tinham. O que mais me espanta é a capacidade de atuarem dessa forma com a certeza de uma total impunidade. Essa atitude certamente não existiria num país que, historicamente, fosse mais igualitário.

A desigualdade é o que permite que certas pessoas no Brasil de hoje se achem capazes de roubar e, além disso, de se proporem a fazer de tudo para não serem pegos ou correrem o risco de retroceder, de ficarem mais pobres ou de terem de viver como um brasileiro comum.

Existe, no Brasil, a combinação de duas coisas: uma ideia enraizada de que se deve fazer o possível para conseguir obter o máximo de sua posição de privilégio e, ao mesmo tempo, uma sociedade que não se vê capaz de colocar um freio nessa situação.

Quando compara com os EUA, o que vê? Os EUA têm uma particularidade. Muita coisa coisa que acontece aqui não conta como corrupção porque está dentro da lei, mas é moralmente errado e isso tem impacto na situação de pessoas menos privilegiadas.

A sra. acha que o desrespeito histórico do Brasil com a "res-publica" (coisa pública) demonstra que nossa transformação em República foi incompleta? Sim, está incompleta, o que descrevi acima é um exemplo disso, o outro é o fato de ainda estar disseminada a ideia de que se chega a um cargo público para ajudar amigos, parentes e aliados, e não para realizar um serviço público.

Creio que no Brasil hoje o que estamos vendo é uma atitude errada tanto dos governantes como do setor privado. Dos dois lados está sendo uma vergonha, portanto não creio que seja um problema de opor o desenvolvimentismo estatal ao neoliberalismo. Não é nem isso nem aquilo, há outro problema por trás de tudo.

E há também uma questão circunstancial, houve um crescimento muito rápido do país nos últimos anos, antes da crise, e isso abriu espaço para que muita gente tentasse aproveitar ao máximo essa situação de prosperidade, ao mesmo tempo em que não existiam ainda os mecanismos para controlar esse tipo de comportamento.

O modo como se responsabiliza o presidente, na América Latina, é parecido ao modo como se responsabiliza o presidente nos EUA, em situações similares? Não, a América Latina tem uma relação mais forte de amor e ódio com o governante de turno. Enquanto na Europa, pelo fato de boa parte dos países serem parlamentaristas, os partidos costumam ser mais responsabilizados do que os chefes de governo, com exceção de casos como os de Margaret Thatcher (1925-2013).

Nos EUA, temos uma situação híbrida, o presidente é o alvo de muitas críticas, mas ao mesmo tempo é também bastante identificado com seu partido. Quem odeia Obama hoje odeia também os democratas. Assim como quem odiava George Bush odiava também o partido republicano.

A sra. acredita que a América Latina esteja dando uma guinada à direita, com as recentes vitórias da oposição na Argentina e na Venezuela? Outro dia assisti a uma conferência do intelectual mexicano Jorge Castañeda, ele dizia exatamente isso, que vivemos uma guinada à direita, e a explicação seria que há uma incapacidade dos governos de manter o mesmo nível de gastos sociais de antes. Isso dá espaço, portanto, para propostas políticas menos comprometidas com esses mesmos programas sociais.

Mas eu faria uma ressalva, creio que estamos num contexto econômico tão difícil que o problema não é a falta de disciplina dos governos da esquerda. Não creio que novos governos nem de direita nem de esquerda terão facilidade para lidar com essa situação.

Como especialista em Brasil, o que as pessoas nos EUA perguntam, quando se referem à atual crise? Muita gente tem me procurado para falar da situação, o que é bom sinal, porque significa que a ignorância sobre o Brasil, que ainda existe, diminuiu. Não me perguntam apenas sobre o Pelé, hoje querem saber também o que está acontecendo.

Mas de modo geral as pessoas têm um preconceito de que o Brasil é um país corrupto e as notícias apenas confirmam esse preconceito.

Outra coisa que sempre me perguntam é se a bronca das pessoas com Dilma tem a ver com o fato de ela ser mulher. E se fosse um homem enfrentando a mesma situação, se seria criticado de forma tão feroz. Perguntam se ela está mais vulnerável por isso. Acho que é uma reação interessante, e costumo responder dizendo que esse não é o elemento principal da crise, mas concordo com o fato de que o tom das críticas e a linguagem forte que vem sendo usada contra ela se refere, sim, ao fato de ela ser mulher.

 

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