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Inquérito contra Temer no STF tem base discutível

Podem até dar motivo para impeachment as conversas entre Joesley Batista e Michel Temer (afinal, já se destituiu uma presidente por menos). Não é cabal e indiscutível, contudo, a fundamentação encontrada pelo Procurador-Geral da República, Rodrigo Janot, para suspeitar de Temer.

No pedido de inquérito que encaminhou ao Supremo Tribunal Federal, Janot vê, com razão, sinais claros de ilegalidade no comportamento do deputado Rodrigo Loures (PMDB-PR), ex-assessor de Temer, e do senador Aécio Neves (PSDB-MG).

Quanto a Temer, o pedido cita três possíveis crimes: corrupção, obstrução da Justiça e participação em organização criminosa.

Vejamos o ponto sobre obstrução de Justiça. No pedido, Janot afirma que Aécio está articulado com Temer para "impedir que as investigações da Lava-Jato avancem, seja por meio de medidas legislativas, seja por meio da indicação de delegados que conduzirão os inquéritos".

Será isso mesmo? Aécio fala, nas gravações, do seu interesse em promover a anistia ao caixa 2 e em aprovar a lei de abuso de autoridade.

Cabe perguntar em que medida querer modificar uma lei é sinônimo de obstruir a Justiça. Se fosse assim, um deputado a favor de liberar o aborto poderia ser acusado de tentar atrapalhar investigações contra clínicas clandestinas.

Pretender influir na indicação de delegados é acusação mais séria. De fato, Aécio fala de ações nesse sentido.

O curioso é que justamente ele se queixa para Joesley de insucesso nesse ponto.

No vocabulário de Aécio, "eles aqui são tão bunda mole, que eles não notaram o cara que vai distribuir os inquéritos para os delegados, você tem lá, sei lá, tem 2.000 delegados na Polícia Federal, aí tem que escolher dez caras...nem isso conseguiram terminar, eu, o Alexandre (de Moraes, ex-ministro da Justiça) e o Michel."

A transcrição não é clara. Aécio estaria reclamando do novo ministro da Justiça, Osmar Serraglio, de não conseguir terminar uma realocação geral de delegados que ele, Moraes e Michel Temer tinham tentado fazer?

Ou se trata de outro objetivo, no qual a trinca estava de acordo, a saber a demissão do responsável pela Operação Carne Fraca, que se considerou amplamente ter sido feita com estardalhaço e irresponsabilidade?

Seja como for, aos 17 minutos e 40 segundos da gravação, ouve-se Aécio dizer: "O Michel é que é um cagão". Por não ter feito, entende-se, o que Aécio queria.

Janot entende o contrário, afirmando haver entendimento entre Temer e Aécio na obstrução da Justiça.

E a operação para silenciar Eduardo Cunha? Aí, a conversa é entre Joesley e Temer. O empresário fala de sua própria situação diante das investigações, aparentemente segura naquele momento porque ele tinha um infiltrado no Ministério Público. Indica que "todo mês" vem pagando quantias a Eduardo Cunha e ao doleiro Lúcio Funaro e que está dando conta de trocar um procurador, "que está atrás de mim".

Temer ouve essas notícias de manipulação sem se indignar. Joesley diz ter "segurado" dois juízes, e o presidente diz "ótimo, ótimo" (12min 9s). Pode ser acusado de omitir-se das suas responsabilidades presidenciais; caso para impeachment, se quisermos.

No pedido de inquérito, Janot afirma: "depreende-se dos elementos colhidos o interesse de Temer em manter Cunha controlado".

Não é preciso bola de cristal para supor que o presidente prefira o silêncio de Cunha. Há o famoso "tem de manter isso", frase que Temer pronuncia quando Joesley diz estar em bons termos com Cunha. Seria com relação aos problemas que o próprio Joesley enfrenta como investigado na Justiça ou com relação aos de Temer?

Que Joesley esteja pagando Cunha a mando de Temer, para proteger Temer, não é coisa que transpareça das gravações, como "depreende" Janot.

Com tantas dúvidas, é claro que o inquérito deve ser feito, e que cabe ouvir Geddel Vieira Lima, o responsável pelas intermediações entre a JBS e o governo, antes que Temer indicasse o suspeitíssimo Rodrigo Loures. Mas nenhuma prova -exceto de que Temer foi omisso- surge com força da gravação, e Janot dá sinais de forçar um pouco as suas conclusões. FOLha de sp/ MARCELO COÊLHO

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