Li as 190 páginas da ação de Janot, o real coordenador político de Dilma, contra Cunha: entenda o jogo!
Caros, o texto é longo e detalhista e deriva da leitura que fiz da ação cautelar apresentada por Rodrigo Janot contra Eduardo Cunha. São 190 páginas. Textos longos, no entanto, não assustam os leitores deste blog. Luiz Edson Fachin, relator no STF das ações do PCdoB contra o rito do impeachment, mal havia terminado de ler o seu voto, que derrotou de modo acachapante as teses do governo (e da Procuradoria-Geral da República), e Rodrigo Janot, hoje verdadeiro articulador político do governo Dilma, veio a público com uma bomba: protocolou no STF o pedido de afastamento de Eduardo Cunha da Presidência da Câmara. Faz tempo que ele lida com essa hipótese, como escrevi aqui no dia 23 de outubro. É parte da operação “Fica-Dilma”, na qual Janot está engajado de corpo e alma.
Vamos com calma.
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E por que Janot fez isso? Há uma penca de coisas. A síntese da acusação de Janot é esta: Cunha “vem utilizando o cargo em interesse próprio e ilícito unicamente para evitar que as investigações contra ele continuem e cheguem ao esclarecimento de suas condutas, bem como para reiterar nas práticas delitivas”. Janot aponta nada menos de 11 atos que demonstrariam esse uso indevido do cargo:
1 – Eduardo Cunha valeu-se de estrutura da Câmara para cobrar informações sobre o grupo Mitsui, forma encontrada para cobrar propina de US$ 5 milhões; 2 – O deputado se valeu do seu cargo para ajudar a extorquir o grupo Schahin; 3 – Cunha usou sua posição para pressionar a advogada Beatriz Catta Preta, que cuidava da delação premiada de nada menos de nove acusados; 4 – o presidente da Câmara teria contratado a empresa de investigação Kroll não para apurar crimes contra a Petrobras, mas para procurar elementos contra pessoas que fizeram delação premiada; 5 – utilizou a CPI da Petrobras para, mais uma vez, pressionar o grupo Schahin e familiares de Alberto Youssef; 6 – estaria tentando criar empecilhos para afastar a aplicação da lei penal. A PGR cita como exemplo proposta de aliado de Cunha para impedir um delator premiado de mudar a sua versão; 7 – Cunha estaria usando cargo para retaliar deputados que se mobilizam contra ele; são citados os casos de Chico Alencar e de Jean Wyllys; 8 – uso do cargo para obter vantagens ilícitas: é citado o caso do BTG. Cunha teria recebido dinheiro do banco para fazer uma emenda a uma MP que seria do interesse da instituição financeira; 9 – obstrução dos trabalhos do Conselho de Ética; 10 – pessoas ligadas a Cunha teriam feito ameaças a Fausto Pinato, o antigo relator do processo no Conselho de Ética; 11 – novas ameaças a Fausto Pinato.
Carioca Engenharia Atenção! Também nesta quarta, veio a público a informação, publicado pelo site da revista Época, com dados certamente vazados pelo Ministério Público Federal, segundo os quais Cunha teria recebido da Carioca Engenharia a bolada de R$ 52 milhões em propina em dois bancos: Israel Discount Bank e UBS, que ficam, respectivamente, em Israel e na Suíça.
A propina vinha do quê? Segundo o Ministério Público, para criar facilidades para que a empresa recebesse R$ 3,5 bilhões do FGTS-FI, o fundo de investimento que usa recursos do Fundo de Garantia. Um aliado de Cunha, Fábio Cleto, cuidava do FGTS e de loterias na Caixa Econômica Federal. Demitido pela presidente Dilma Rousseff na última quinta, ele era vice-presidente de Fundos de Governo e de Loterias da Caixa. Em acordos de delação premiada, os donos da empresa, Ricardo Pernambuco e Ricardo Pernambuco Júnior, afirmaram ter feito o pagamento.
Essa acusação não está na ação cautelar contra Cunha enviada por Janot ao Supremo.
Vamos ver As onze acusações contra Cunha que estão no documento enviado por Janot não são novas. Todas elas estão incluídas em algum dos inquéritos em curso da Lava Jato, exceção feita às que dizem respeito a Fausto Pinato. Há, na lista, coisas graves — como a suposta ameaça ao ex-relator do processo contra Cunha no Conselho —, mas há apenas chororô, como a suposta perseguição a deputados do PSOL.
A ação de Janot tem 190 páginas. Não foi redigida em um dia. Está pronta faz tempo. Por que foi apresentada justamente nesta quarta-feira, quando as esquerdas estão nas ruas contra Cunha e quando o Supremo toma uma decisão sobre o rito do impeachment?
A ação de Janot lista papéis encontrados nas residências de Cunha que provariam que ele está usando o cargo para criar dificuldades para a apuração: documentos referentes a contas na suíça; relatórios sobre a atividade de parlamentares que são da sua turma; cópias de boletim de ocorrência registrado por Pinato e contra Pinato; papelada sobre CPI da Petrobras…
O que eu acho? a: Cunha já deveria ter deixado a Presidência da Câmara quando ficou claro que tem contas no exterior; b: a partir de agora, ele mais atrapalha o impeachment do que ajuda.
Dito isso, considero: a: há elementos de sobra para dar sequência ao processo contra Cunha; b: há elementos de sobra para a Câmara cassar o mandato de Cunha.
Isso quer dizer que a ação cautelar de Janot é boa? Com a devida vênia, não é, não! Acho, sim, que Cunha tem de deixar a Presidência da Câmara e que tem de ter o mandato cassado. A depender do que se colha, tem de ser preso. Mas dentro do devido processo legal.
Com todo o respeito, parte dos motivos apresentados por Janot na cautelar tem apenas a ver com exercício regular da função de deputado. O procurador-geral afirmar que a apresentação de um projeto de lei caracteriza tentativa de impedir a aplicação da lei penal é um insulto à inteligência. Tome-se outro caso, o suposto pagamento do BTG a Cunha: até agora, além de um manuscrito, não há prova nenhuma disso. Ao contrário até: a emenda que ele apresentou era contrária ao interesse do BTG.
O que virá? Vamos pensar. Se o relatório de Fachin tivesse sido favorável ao governo e se o STF estivesse inclinado a interferir no rito do impeachment, acho que Janot não teria apresentado a sua ação cautelar, que é fraca.
Como a tendência é o Supremo endossar o voto de Fachin — o que significará uma derrota significativa para Cunha —, Janot fareja a possibilidade de o tribunal dar uma no cravo e outra na ferradura: dá continuidade ao rito, mas afasta Cunha, por quem ninguém vai brigar. E, nesse caso, o Planalto ficará feliz. REINALDO AZEVEDO