Data venia, meritíssimos
Heranças do sistema lusitano, forjado sob profunda influência do direito romano-canônico, o demasiado formalismo e a linguagem empolada do Judiciário brasileiro começam a dar sinais de que podem rumar ao passado.
A exemplo de países mais desenvolvidos, que há tempos buscam tornar os meandros jurídicos mais palatáveis aos não iniciados no direito, o Brasil tem dado passos assertivos nesse sentido.
Recentemente completou-se um ano da criação do Pacto do Judiciário pela Linguagem Simples, iniciativa do Conselho Nacional de Justiça que já conta com a adesão da maioria dos tribunais do país —as exceções mais notáveis são o Tribunal Superior Eleitoral e o Supremo Tribunal Federal, este não subordinado ao CNJ.
Um desses esforços é a criação de um modelo padrão para as ementas: o resumo do que foi decidido nas cortes deve preconizar uma estrutura objetiva que facilite a compreensão tanto da comunidade jurídica e das partes como da população em geral.
Difundir versões sintéticas, menos rebuscadas, é imperioso para que o cidadão comum tome conhecimento dos impactos de determinada decisão em seu cotidiano, além de servir de estímulo para que busque seus direitos.
Mas não só. Para fins mais triviais, como a convocação de mesários por parte da Justiça Eleitoral dos estados para trabalhar nas eleições, o formato agilizou consideravelmente esse processo.
O Tribunal Regional Eleitoral do Paraná, por exemplo, abdicou de texto labiríntico e floreios forenses para ir direto ao ponto, com diretrizes claras e distribuídas em tópicos. Resultado: houve queda significativa no número de dúvidas, o que imprimiu celeridade na formação das turmas.
Há que ir além, sem dúvida. O famigerado juridiquês não se resolve somente com mudanças de vocabulário. Especialistas reforçam a importância da padronização dos métodos nos tribunais (o que ainda não se vê), hierarquização e estruturação de frases e parágrafos e, sobretudo, organização visual que favoreça a absorção das informações.
Nas palavras do ministro Luís Roberto Barroso, presidente do STF e do CNJ, a linguagem não pode ser instrumento de poder que "exclui do debate quem não tem aquela chave do conhecimento".
Jargões são inerentes a qualquer profissão, e é desejável que termos técnicos sejam levados à risca pelos operadores do direito. Entretanto a real democratização do sistema de justiça, ainda restrita a parcela diminuta dos brasileiros, começará com a difusão plena de seus preceitos.


