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Um remendo nas contas públicas

Por Notas & Informações / O ESTADÃO DE SP

 

O esperado novo bloqueio de despesas públicas, de R$ 5 bilhões, para evitar o descumprimento do limite de despesas, é apenas mais um remendo no esfarrapado arcabouço fiscal. A pouco mais de um mês de concluir a metade do mandato, o governo Lula da Silva ainda tem de recorrer a medidas paliativas para cumprir o limite inferior da meta, que prevê um rombo de até R$ 28 bilhões neste ano.

 

Para fechar 2024 no centro da meta fiscal, com déficit zero, como prevê o arcabouço, o governo necessitaria de um incremento adicional de R$ 42,3 bilhões na arrecadação do último bimestre, segundo cálculos da Instituição Fiscal Independente (IFI), órgão de monitoramento vinculado ao Senado.

 

Para a IFI, este não parece ser um cenário factível, pois demandaria surpresas ou uma ajuda extra – e isso apesar dos 11 recordes mensais sucessivos na arrecadação, que levaram a receita pública federal a acumular R$ 2,18 trilhões até outubro.

 

O motivo é simples como os conceitos da aritmética básica: as receitas têm sido em muito superadas pelas despesas. E o mais recente Relatório de Acompanhamento Fiscal da IFI deixa muito claro o porquê. Medidas pactuadas antes mesmo da posse de Lula da Silva e ações adotadas no primeiro ano de sua gestão tornaram ainda mais complexo o frágil equilíbrio das contas públicas.

 

O relatório confirma o que este jornal tem apontado com insistência sobre as consequências de medidas mal planejadas e movidas por aspirações eleitoreiras e populistas, como as que marcam a economia sob o bastão de Lula da Silva. As quatro políticas públicas mais custosas ao erário tiveram precisamente esse perfil.

 

São elas a manutenção do benefício de R$ 600 para o Bolsa Família, uma deferência feita no período mais crítico da covid-19 e que deveria ter sido revista após a pandemia; o reajuste do salário mínimo, atrelado também ao crescimento econômico, além do cálculo pela inflação; a indexação dos pisos para Saúde e Educação às receitas, e não mais limitadas à inflação, como estabelecia o teto de gastos; e a criação de mais dois fundos públicos para promover o desenvolvimento regional e compensar benefícios fiscais como contrapartida à aprovação da reforma tributária.

 

Juntas, essas quatro políticas públicas vão gerar um custo entre R$ 2,3 trilhões e R$ 3 trilhões em uma década. São medidas com peso permanente, não apenas pontual. Assim sendo, para garantir um rearranjo estrutural nas contas públicas, o tão esperado pacote de despesas deveria revê-las, assim como apresentar medidas para conter o avanço exponencial dos gastos com previdência e assistência social.

 

Mas, ao que tudo indica, Lula da Silva parece propenso, quando muito, a alterar as regras na política de valorização do salário mínimo. Talvez tenha sido convencido de que elevar de forma tão intensa o piso pode escancarar a insustentabilidade do arcabouço fiscal antes mesmo do fim de seu mandato – algo que, aliás, já começa a acontecer.

 

Bloqueios, como se sabe, não são cortes, mas apenas uma espécie de congelamento para limitar o aumento do gasto a 2,5% ao ano, já descontada a inflação. E é muito preocupante que tenha de se recorrer a eles em um momento de arrecadação vigorosa, pois isso revela o tamanho da dificuldade do governo para manter as contas minimamente equilibradas.

 

No acumulado até outubro, o País registrou o melhor resultado de toda a série histórica, iniciada em 1995. As receitas tiveram alta de 9,69% em relação a igual período de 2023, já descontada a inflação. Junte-se a isso a contribuição bilionária da Petrobras, que acaba de anunciar a distribuição de dividendos extraordinários de R$ 20 bilhões, o que renderá ao Tesouro um repasse total de R$ 23,46 bilhões no ano.

 

Contar somente com receitas para cumprir a meta fiscal não é, nem nunca foi, uma decisão prudente, sobretudo quando não se mexe na dinâmica das despesas. O fato de que nem mesmo os recordes históricos de arrecadação facilitaram o trabalho da equipe econômica na busca da meta fiscal deixa muito claro onde o problema de fato está. E o relatório da IFI aponta quem é o maior responsável por isso.

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