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Problema do governo não está na comunicação

EDITORIAL DE O GLOBO

 

Na reunião ministerial de segunda-feira, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva tentou esboçar reação à queda de popularidade. Cobrou de seus ministros que façam mais, viajem mais pelo Brasil e divulguem mais suas realizações. Atribuiu as deficiências do governo sobretudo a falhas de comunicação.

 

É um diagnóstico que ignora o problema real. Está correta sua percepção de que é preciso fazer bem mais do que foi entregue em pouco mais de um ano de mandato — e as pesquisas refletem isso. Mas, por mais que o governo esteja perdendo a disputa estridente nas redes sociais, é um despropósito atribuir a queda de popularidade a outra coisa senão à avalanche de problemas que assombram os brasileiros.

 

É verdade que, na economia, os resultados têm sido satisfatórios. A inflação está controlada, o desemprego caiu, e a renda subiu. Mas esses fatores não têm sido suficientes para alavancar a imagem de Lula. Nem mesmo programas sociais como o Bolsa Família, noutros tempos garantia de dividendos políticos, têm surtido o mesmo efeito. O povo quer mais.

Não se pode menosprezar a experiência do cidadão no dia a dia. Na saúde, uma das maiores preocupações da população, o Brasil enfrenta uma epidemia de dengue que não dá trégua. Em pouco mais de dois meses, a doença superou o recorde de 2015 e já registra quase 1,9 milhão de casos. As mortes somam 561 (outras 1.020 estão em investigação). As respostas do governo têm sido tímidas. Houve demora nas campanhas para combater os focos do mosquito transmissor da doença e para começar a vacinar os adolescentes.

 

Outra epidemia que se alastra de forma impiedosa é a violência. Não se pode fingir que nada acontece. Em diferentes regiões, brasileiros têm sido expostos a episódios brutais de assassinatos, roubos, feminicídios, estupros e se sentem desamparados. A principal política do governo federal tem sido empurrar a responsabilidade aos estados, que, sozinhos, não têm como combater facções criminosas transnacionais. A fuga do presídio de Mossoró e a busca inglória aos fugitivos são um triste retrato da segurança.

 

Na educação, outra área em que as expectativas são altas, o desempenho também é sofrível. A reforma do ensino médio, aprovada em 2017, foi suspensa e continua empacada no Congresso. O MEC não se esforça para destravá-la. Perde-se tempo em discussões intermináveis, e nada avança.

 

Lula teve o mérito de resgatar a democracia brasileira do abismo em que fora lançada por Bolsonaro. Mas o contraste com o passado vai esmaecendo com o tempo, e resta o presente. No terceiro mandato, ele tem reciclado programas dos anteriores em vez de dar respostas condizentes com os anseios atuais do Brasil. Preocupa-se mais com aparições internacionais e uma guerra a milhares de quilômetros de distância do que com desejos e carências concretos da população.

 

Melhorar a comunicação não esvaziará postos de saúde e hospitais abarrotados com doentes infectados pela dengue sem atendimento adequado. Nem impedirá que famílias chorem os mortos na guerra diária da violência. Ou evitará que estudantes fracassem em exames e na carreira devido à péssima qualidade do ensino. Lula está certo ao dizer que o governo precisa fazer mais. Mas não se trata de problema de comunicação. O que o governo precisa é trabalhar mais — e trabalhar direito.

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