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A política e as crises - folha de sp

Acontecimentos ciclópicos, como a emergência sanitária que há mais de um ano se abate sobre todo o planeta em sincronia, deixam inevitavelmente marcas na política.

Basta notar o impacto da pandemia de coronavírus em duas das principais reviravoltas dos últimos cinco anos: a vitória do brexit no Reino Unido e o triunfo de Donald Trump nos EUA, ambas em 2016.

No primeiro caso, a convulsão neopopulista transformou-se, dobrada pela premência da epidemia, num governo conservador tradicional, sob a versão atenuada de Boris Johnson. No segundo, o negacionismo irresponsável ajudou a derrotar o incumbente da Casa Branca, fato pouco frequente na história eleitoral norte-americana.

O Brasil não ficaria de fora dessa grande onda. Consuma-se a desmoralização, em meio à trágica aceleração de internações e mortes, de um presidente da República estrambótico e irresponsável.

Em paralelo, o acerto de contas do establishment político e jurídico com a Lava Jato --em parte impulsionado pelos abusos cometidos por procuradores e juízes, em parte embalado pelo desejo de escapar das garras da lei-- devolveu o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) ao jogo eleitoral de 2022.

De imediato, a peripécia parece que ajudou a precipitar na gestão de Jair Bolsonaro uma comichão rumo às vacinas e até ao uso de máscaras em atos públicos. Reação muito tardia, e por ora ainda deveras postiça e hipócrita para ser levada a sério, infelizmente.

Personalidades que traçavam rota para a candidatura presidencial agora refazem seus cálculos. É o caso do governador João Doria (PSDB), do ex-ministro Ciro Gomes (PDT), do ativista Guilherme Boulos (PSOL) e do apresentador de TV Luciano Huck, pleiteante a aventureiro da rodada.

O quadro se reorganiza com a reabilitação do desafiante que encarna como ninguém os 13 anos do PT no governo, com suas notáveis conquistas, concentradas na área social, e trepidantes fracassos na economia dos anos finais e na convivência desabrida com a corrupção.

O quadro se reorganiza, mas não se define. Há variáveis poderosas em atuação --a pandemia, o desemprego, a fragilização das contas públicas, a escalada no preço dos alimentos, a valorização das abordagens técnicas dos problemas coletivos-- capazes de colocar tudo de pernas para o ar até o distante outubro do ano que vem.

Seria uma lástima se a reentrada de Lula no certame eleitoral reavivasse a polarização estéril com o bolsonarismo, o que parece animar militantes dos dois lados. O Brasil já conhece os estragos que o dogmatismo causa e não merece atravessar mais quatro anos de destruição do futuro a partir de 2023.

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