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Com 26% das mortes no mundo, América Latina só aplicou 6% das vacinas contra a Covid-19

Camila Zarur = O GLOBO

 

IDOSO NO SIBATE

 

RIO — A América Latina e o Caribe são uma das regiões do mundo mais afetadas pela pandemia. Apesar de representar apenas 8% da população mundial, a região registrou 26% das mortes e 18% dos casos da Covid-19. E, ainda que alguns dos países já tenham começado sua campanha de vacinação contra o vírus, a imunização segue a passos lentos e não consegue acompanhar o avanço das contaminações. Das 33 nações, 18 ainda não começaram a imunizar a população ou não têm dados públicos sobre percentual de vacinados. 

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Ao todo, foram 21 milhões de infecções e mais de 670 mil mortes pela doença na região, sem contar a subnotificação. Junto com os Estados Unidos e o Canadá, o continente americano é o lugar onde mais pessoas se contaminaram e morreram devido à crise sanitária. No entanto, das 227 milhões de doses contra a Covid-19 aplicadas no mundo até sexta-feira, apenas 6%, ou 13,9 milhões, o foram na América Latina e no Caribe.

São poucos os exemplos de campanhas bem-sucedidas. Um deles é o Chile, onde, até o momento, cerca de 16% da população já recebeu a primeira dose da vacina. Usando os imunizantes da Pfizer, da AstraZeneca e da Sinovac, o país pretende imunizar até 75% das pessoas em seis meses — o suficiente para atingir a imunidade necessária à volta da normalidade, segundo apontam especialistas. 

Em segundo lugar no ranking, com quase dois dígitos de diferença, está a ilha caribenha de Barbados, que, a cada 100 pessoas, conseguiu vacinar 7. No entanto, nenhuma recebeu a segunda dose da vacina. Em seguida aparece o Brasil, com 2,9% da população vacinada com a primeira dose e 0,7% com a segunda.  A maioria dos países latino-americanos e caribenhos, porém, ainda não começou a vacinação ou imunizou um número pouco expressivo de pessoas. Um dos motivos para isso é que as nações de rendas mais baixa ficaram atrás na corrida pelo imunizante, ultrapassadas por países mais ricos que fecharam logo acordos com as farmacêuticas. No entanto, até aqueles que tomaram a dianteira enfrentam dificuldades de produção e entrega das vacinas.  

— Mesmo países ricos que compraram muitas vacinas não as estão recebendo, porque alguns tiveram problemas de produção, outro aparentemente compraram mais do que [as farmacêuticas] tinham capacidade de entregar, outros enfrentam problemas com a liberação de exportação — pontuou o subdiretor da Organização Pan-Americana da Saúde (Opas), Jarbas Barbosa, em uma entrevista coletiva na semana passada. — Mesmo países que estabeleceram acordos bilaterais estão com dificuldades de receber suas vacinas.

Um dos problemas que adia a entrega das vacinas é a falta de insumos para sua produção. Um exemplo disso é o caso dos 200 milhões de imunizantes da AstraZeneca que serão produzidos em conjunto por Argentina e México. A vacina que já foi produzida está armazenada porque o laboratório mexicano responsável por envasá-la ainda não conseguiu receber frascos e filtros, como mostrou na semana passada o jornal El País.

Muitos países da região conseguiram começar a vacinação por causa de acordos diretos com as farmacêuticas ou devido a pequenas doações. É o caso da ilha de Dominica, que recebeu 70 mil doses da Astrazeneca doadas pelo governo indiano. Suriname começou a vacinar com mil doses que recebeu de Barbados e espera receber outras 50 mil da Índia.

Isso, porém, não é suficiente para a vacinação de 500 milhões de pessoas, ou 76% dos habitantes da região, porcentagem necessária para chegar à imunidade coletiva. Para isso, muitos dos países dependem das vacinas que serão entregues através do consórcio Covax. Iniciativa da Organização Mundial de Saúde (OMS), da Aliança para a Vacinação (Gavi) e da Coalizão para Inovações em Preparação para Epidemias (Cepi), o Covax tem como meta fornecer imunizantes para ao menos 20% da população de cada país participante. Na região, apenas Cuba, que começou os testes da fase três de sua própria vacina, não faz parte do mecanismo. 

— Para países pequenos e de baixa ou média renda, seria muito difícil sem o Covax conseguir negociar com os fabricantes, porque eles sabem que a demanda é muito maior do que a oferta que estaria disponível no curto prazo — explicou o diretor da Gavi, Santiago Cornejo, à rádio americana WLRN.

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Segundo Cornejo, fazer parte da iniciativa é um caminho para ter acesso às vacinas. Porém, o número de doses e cronograma de entregas estão sujeitos à capacidade de produção das farmacêuticas, assim como ao estabelecimento de acordos de fornecimento entre os produtores, a Opas e a Unicef.

Por causa disso, o Covax já teve que adiar a entrega dos primeiros lotes de imunizante, que estavam previstos para serem enviados entre janeiro e fevereiro. A previsão de agora é que os países latino-americanos e do Caribe recebam em março as cerca de 35 milhões de doses destinadas à região nesta primeira etapa. 

Segundo Barbosa, na primeira leva de vacinas a serem entregues, os países devem receber uma quantidade de doses equivalente a 2,2% a 2,6% de sua população. As exceções serão as nações muito pequenas, que vão receber uma quantidade proporcional maior, entre 16% e 20%, já que o envio de pequenas quantidades do imunizante sairia mais caro. O subdiretor da Opas, no entanto, é direto:

— Vamos ser muito claros, há uma quantidade limitada. Quanto mais acordos bilaterais são feitos, a disponibilidade começa a diminuir. O Covax é uma vitória muito importante para o mundo e deve ser fortalecido — ressalta Barbosa, que também afirma: — O prazo de entrega não é uma decisão, é uma realidade do mercado. Depende de uma negociação muito dura com todos os produtores sobre a quantidade que está disponível e como as vacinas serão transportadas do produtor para cada país.

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Prioridade global

Enquanto os países da região não conseguem acelerar a vacinação, o coronavírus continua a avançar. Ainda que a OMS aponte uma redução considerável de casos da doença no continente americano na última semana, essa tendência é puxada pelos Estados Unidos, que agilizou sua campanha de imunização e endureceu as medidas para conter o vírus. Na América Latina e no Caribe, o cenário da pandemia é misto. 

O Uruguai, que começará a vacina nesta segunda-feira, reduziu drasticamente os casos ao adotar restrições mais rígidas e fechar fronteiras. Porém, países como Peru, Barbados, Santa Lúcia e São Vicente e Granadina vem registrando um aumento crescente de novas infecções, como também é o caso do Brasil.

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A diretora da Opas, Carissa Etienne, afirmou que, devido à alta de casos, o acesso regional às vacinas deve ser uma “prioridade global”. 

— O poder de salvar vidas das vacinas não deve ser um privilégio de poucos, mas um direito de todos, especialmente dos países sob maior risco como os das Américas, que continuam sendo o epicentro da pandemia. Nossa região precisa de vacinas o mais rápido possível e o máximo possível para salvar vidas — declarou Etienne. — É por isso que pedimos à comunidade global que faça da vacinação contra a Covid-19 nas Américas uma prioridade global, pois é onde a necessidade e o risco são maiores.

“Fura-filas”

Além da escassez de vacinas e dos gargalos de distribuição, a América Latina e o Caribe enfrentam outro problema para ter uma imunização eficaz: os fura-filas, pessoas que são vacinadas antes dos grupos prioritários e, às vezes, antes mesmo do início da campanha.

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Na Argentina, os “fura-filas” levaram à renúncia do ministro da Saúde, Ginés Gonzáles García, depois que foi revelado um esquema apelidado de “vacinação VIP”, onde pessoas eram imunizadas antes graças a seus bons contatos com os altos escalões do governo. No Peru, o escândalo começou ao descobrirem que o ex-presidente Martín Vizcarra e sua mulher tomaram de forma secreta a vacina da Sinopharm, enviada para a fase três de testes realizada no país,  antes dele ser afastado do cargo, em setembro.

Em alguns países, o esquema é mais explícito, e autoridades puderam receber as vacinas antes dos grupos prioritários de maneira oficial. Em Dominica, o presidente, Charles Savarin, e a primeira-dama, Clara Savarin, junto com outros membros do governo, foram vacinados no dia 12 de fevereiro — 10 dias antes do início da vacinação começar. 

Em Santa Lúcia, o primeiro-ministro, Allen Chastanet, e sua mulher, Raquel Du Boulay-Chastanet, tomaram suas doses da AstraZeneca logo no primeiro dia da campanha de vacinação, no dia 17 deste mês. OBS: SIBATE FICA NA COLOMBIA

 

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