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Demissão de presidente da Petrobrás é mais um episódio na longa sucessão de desgraças nas estatais

J. R. Guzzo, O Estado de S.Paulo

24 de fevereiro de 2021 | 16h26

A demissão do presidente da Petrobrás, Roberto Castello Banco, foi um desastre – mais um, na verdade, numa longa sucessão de desgraças que se repetem há anos nas empresas estatais e em que o perdedor não muda nunca. Quem perde é sempre o povo brasileiro, de um jeito ou de outro: pode perder com um ataque direto ao seu bolso ou, então, pagando a sua cota-parte na calamidade geral do gasto público deste país.

O último episódio da série foi da primeira modalidade - a agressão, sem a menor vergonha, ao patrimônio pessoal dos cidadãos que confiaram na empresa. Foi mais uma demonstração, entre tantas, de um vício incurável do poder público como ele realmente é no Brasil: a mania dos governos em tratar como seu, ou simplesmente ignorar, o patrimônio privado de quem investe seu capital nas empresas estatais cujas ações são negociadas no mercado. 

No caso, a demissão do presidente da Petrobrás, por pura conveniência de ordem política, gerou prejuízos imediatos para os seus acionistas particulares, aqui e no exterior – o valor das ações despencou no ato, como sempre acontece a cada vez que o investidor percebe que uma empresa está deixando obviamente de lado as regras básicas de gestão de um negócio feito para dar lucro.

Bolsonaro e Silva e Luna
O presidente Jair Bolsonaro e o general Joaquim Silva e Luna, indicado para a chefia da Petrobrás Foto: MAURO PIMENTEL / AFP (19/2/2020)

De cara, a demissão do presidente da Petrobrás fez as suas ações caírem quase 20%; ao longo do fim de semana, a empresa perdeu 100 bilhões de reais em seu valor de mercado. É claro que estes números, como é normal nas bolsas de valores, podem se alterar com o tempo; mas não dá para negar que a reação foi muito ruim. Mais: como a confiança do público pagante está abalada, e com toda a razão, a onda de prejuízo ameaça se estender a outras empresas estatais que têm ações no mercado aberto.

Diante de tudo isso, a posição clássica dos governos – e o governo Bolsonaro acaba de provar, mais uma vez, que não é diferente dos outros – é dizer sempre a mesma coisa. “E daí? Problema de quem tem ação da Petrobrás. Problema de banqueiro. Problema de rico. O governo não tem

nada de ficar dando satisfação para ‘o mercado’. Aqui a gente está pensando no Brasil, e não na Bolsa. Chupa, Bolsa.” É a histórica incapacidade do poder público nacional em respeitar o que é dos outros.

O presidente da Petrobrás foi demitido porque a gasolina e o diesel estão caros, e os caminhoneiros andam inquietos; todas as outras justificativas não passam de uma repetição de desculpas bobas. Se o homem era ruim de serviço, não comparecia ao local trabalho e ainda por cima custava muito caro, como alegam agora, por que ele não foi demitido antes? Falta de tempo é que não foi: Castello Branco estava lá há

dois anos inteiros. Toda essa conversa não engana ninguém, salvo os que fazem questão de ser enganados: a gasolina é cara porque tem de pagar 45% de imposto na bomba, sem dó nem piedade, e o mecanismo que manda no Brasil prefere a morte a mexer de verdade – não de mentirinha, como vivem fazendo – nos impostos dos quais o cidadão não tem como escapar.

É sempre muito mais interessante socar a culpa no lombo da Petrobrás – que é um monopólio infame e inimigo do Brasil, mas tem de praticar os preços do mercado internacional do petróleo para não ter prejuízo e não pode ser responsabilizado, por si só, pelos preços cobrados do consumidor. Tudo conto do vigário, como sempre: cobrar menos pelos combustíveis obriga o governo a ir buscar esse dinheiro em algum lugar, e esse lugar é, obrigatoriamente, o mesmo de sempre: o bolso do próprio consumidor.

Mas essas coisas dão para muita gente a impressão de que o presidente da República está agindo – e rendem um bom ibope. É o que interessa.

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