Previdência: mudança no cálculo do valor do benefício afeta mais a elite do funcionalismo
BRASÍLIA - A reforma da Previdência muda a forma de calcular o valor das aposentadorias — uma medida que vai afetar a todos os trabalhadores, mas principalmente a elite dos servidores públicos, que computa na conta os últimos salários da carreira, um grupo historicamente mais beneficiado. O texto reduz a base de cálculo ao determinar que vale a média de todas as contribuições realizadas pelos segurados ao longo da vida, não apenas os maiores salários de contribuição. As regras valem para servidores federais, estaduais e municipais.
No caso do INSS, o impacto da mudança na sistemática do cálculo da aposentadoria não é tão expressivo, porque os salários de contribuição no setor privado não costumam ter grande variação, segundo técnicos da equipe econômica. Além disso, o benefício do setor privado é limitado ao teto de R$ 5.839. Já para os servidores, o efeito é maior, porque eles ingressam na carreira com salários mais baixos, mas têm rápida progressão.
Um analista do Banco Central, por exemplo, entra na carreira ganhando R$ 16.900 e se aposenta com R$ 24.200, conforme dados de 2017.
Valor ‘per capita’ maior
Segundo cálculos do economista e especialista em Previdência Arnaldo Lima, a mudança na base de cálculo dos funcionários públicos resultará em uma redução no valor do benefício de R$ 337,26. No caso do INSS, a diminuição é de R$ 112,06. Os números foram tabulados com base em rendimentos da Relação Anual de Informações Sociais (Rais).
A decisão do governo de endurecer as regras de forma mais enfática para os servidores ocorre porque esse grupo tem hoje muito mais benefícios do que os demais trabalhadores. Isso acaba fazendo com que a categoria se aposente mais cedo, com proventos mais elevados, o que resulta em um déficit per capita maior.
Em, 2018, o déficit do regime próprio de previdência dos servidores públicos da União atingiu R$ 51 bilhões, para pagar 680,2 mil aposentados e pensionistas. No INSS, o rombo ficou em R$ 196 bilhões, para um universo de 30,2 milhões de pessoas. Em valores per capita, porém, o déficit no setor público é de R$53,8 mil, enquanto no setor privado é de R$ 5,3 mil.
A média de idade de aposentadoria no setor privado é de 60,8 anos para homens e mulheres, contra 59 no público.
A forma como os servidores serão afetados vai depender da data de ingresso no serviço público. Atualmente, há varias regras de aposentadoria para os servidores, decorrentes de outras reformas: quem entrou até 1999; até 2003; entre 2004 e 2012; e a partir de 2013.
Quem entrou a partir de 2004 será mais atingido pela mudança na regra de cálculo porque o valor da benefício é definido com base em 70% da média das maiores contribuições. O teto para os proventos da aposentadoria é o dos ministros do Supremo Tribunal Federal, de R$ 39 mil. Com a reforma, passa valer a média de todas as contribuições, e o percentual de cálculo, na largada, cai de 70% para 60%.
Quem entrou até 2003 tem direito à paridade (mesmo reajuste salarial dos ativos) e integralidade (último salário da carreira). Com a reforma, esses dois benefícios só serão mantidos se o servidor atingir idade mínima de 65 anos (homem) e 62 anos (mulher). Caso queira se aposentar antes, receberá valor proporcional.
O GLOBO/ Geralda Doca e Marcello Corrêa