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Brasil tem recorde nas apreensões de cocaína em 2018

SÃO PAULO - O Brasil nunca apreendeu tanta cocaína quanto neste ano. Foram 75 toneladas dadroga entre janeiro até o começo de dezembro, 56% mais do que ao longo de todo o ano passado, segundo levantamento da Polícia Federal (PF) feito a pedido do GLOBO. Em relação a 2012, primeiro registro da série histórica, o salto é ainda maior, de 275%. Se os números expõem um rigor maior na fiscalização, revelam também um fato nada animador: há mais cocaína circulando no país. As áreas de cultivo da folha de coca, matéria-prima da cocaína, vêm numa tendência de crescimento, puxada pelos vizinhos Peru, Bolívia e Colômbia, segundo o World Drug Report 2017, relatório produzido pelo braço da ONU para Drogas e Crime (UNODC). Além de mais droga disponível, organizações criminosas brasileiras que dominam o tráfico estão fortalecidas.

— Até pouco tempo, o PCC (Primeiro Comando da Capital) não exportava. Depois que aumentou o controle no Paraguai, tem mais facilidade de mandar droga para o Brasil e para o exterior — diz o analista criminal Guaracy Mingardi, integrante do Fórum Brasileiro de Segurança Pública.

O padrão de exportação das facções vem chamando a atenção das autoridades brasileiras desde 2013. Um ano depois, a Polícia Federal deflagrou a Oversea, primeira operação que identificou o modo de atuação das facções nos portos. Na impossibilidade de guardar seus 16 mil quilômetros de fronteira e impedir a entrada da cocaína, a PF passou a investir na fiscalização na saída. Só neste ano, a polícia já apreendeu 30,6 toneladas de cocaína nos portos, diante das 18 toneladas no ano passado: 70% a mais.

A maior parte dessa droga foi encontrada em Santos, onde a quantidade interceptada chegou a 22,7 toneladas, contra 11,5 em 2017. De acordo com investigações do Ministério Público Federal, o PCC usa o porto de Santos para escoar cocaína a aliados da máfia italiana da Calábria, a Drangueta, e ao clã Saric, da Sérvia. Esses grupos são responsáveis pela distribuição da cocaína no continente.

Investigadores atribuem o aumento das apreensões no porto de Santos a ações de inteligência e à instalação de escâneres pela Receita Federal. Desde abril de 2016, uma portaria determinou que todo contêiner com destino a países europeus fosse escaneado na saída do porto, não só mais na entrada. A medida fez crescer a apreensão de cocaína: o salto foi de 1,05 tonelada em 2015 para 10,6 toneladas no ano seguinte.

Brasil consome mais

De acordo com investigadores, os criminosos não demoraram a burlar a nova regra do escâner. Passaram a infiltrar a droga em cargas a serem despachadas para o Brasil e que, portanto, não seriam fiscalizadas. Já dentro do porto, cooptavam funcionários a fim de transferir a mercadoria ilícita para o contêiner a caminho da Europa. A PF instalou câmeras de segurança nessa área, e os bandidos encontraram outra saída: o embarque da droga quando o navio já deixou o porto. Há consenso ainda de que falta efetivo de agentes para fiscalizar os quase oito milhões de metros quadrados de área do porto, que este ano já movimentou 110,6 milhões de toneladas de cargas.

Embora a apreensão recorde seja louvável, especialistas reforçam a necessidade de ações voltadas à quebra da estrutura das organizações criminosas.

— Quando você apreende a droga e não desmancha a rede, não adianta muito. Para acabar com a organização você precisa fechar a rota, prender o gerente e o dono da droga, não só atacar os crimes isolados — diz o analista criminal Guaracy Mingardi.

O Brasil é um dos países que mais consomem cocaína no mundo, de acordo com relatório da UNODC. Estimativas apontam que 1,75% da população adulta no país consome cocaína, quatro vezes mais do que a média mundial, de 0,4%.

A maior organização criminosa do Brasil fincou raiz no Paraguai depois do assassinato cinematográfico de um narcotraficante conhecido como o rei da fronteira. Numa emboscada arquitetada pelo PCC, Jorge Rafaat Toumani foi executado em junho de 2016 na cidade fronteiriça de Pedro Juan Caballero. Sua morte destravou o caminho para o PCC se instalar no país.

O Paraguai é estratégico para a facção. É um dos cinco mais importantes fornecedores de maconha do mundo, segundo o World Drug Report 2016, relatório produzido pelo UNODC. Por sua localização geográfica, funciona ainda como base do tráfico da cocaína produzida na Bolívia, no Peru e na Colômbia.

Em solo paraguaio a droga é preparada e distribuída para o Brasil e países da África e da Europa. Depois da morte de Rafaat e do controle do país vizinho, a facção vem crescendo rapidamente. Estimativa do Ministério Público de São Paulo mostra que o número total de membros do PCC passou de oito mil, em 2014, para 30 mil, em 2018 — salto de 275%.

Ao enviar a droga para fora, os lucros das organizações criminosas são extraordinários. A cocaína é adquirida nos países produtores — como Bolívia, Peru e Colômbia — por valores que variam de U$S 2,5 mil a U$S 3 mil o quilo (em torno de R$ 10 mil). O valor se refere à droga “tipo exportação”, com pureza acima de 90%, exigência no exterior.

Na Europa, o quilo de cocaína é vendido por cerca de € 25 mil a € 30 mil (em torno de R$ 110 mil). Desse valor, são abatidos custos de transporte por meio de “mulas” e logística. Descontadas as despesas, a estimativa da Polícia Federal é que a exportação de um quilo de cocaína renda R$ 26 mil. O GLOBO

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