Aneel contraria área técnica e aprova aumento de 52% na bandeira vermelha 2
29 de junho de 2021 | 12h01
Atualizado 29 de junho de 2021 | 14h00
BRASÍLIA - A Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) aprovou nesta terça-feira, 29, por 4 votos favoráveis a 1, um reajuste de 52% na bandeira vermelha patamar 2. A partir de julho, a taxa adicional cobrada nas contas de luz passará de R$ 6,24 a cada 100 quilowatts-hora (kWh) para R$ 9,49.
Esse valor, no entanto, poderá ser ainda maior já em agosto e nos próximos meses, já que a agência irá rever os parâmetros para cálculo da bandeira. A consulta pública para a revisão pode ser aberta ainda nesta terça, em reunião extraordinária. Isso porque, mesmo com o reajuste, há 46% de chances de faltar recursos para cobrir os custos da contratação de térmicas para manter o abastecimento no País.
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Como mostrou o Estadão/Broadcast, os técnicos calcularam que o novo patamar da bandeira vermelha nível 2 deveria subir para algo entre R$ 11,50 e R$ 12,00 a cada 100 kWh. Esse seria o valor necessário para cobrir todo o custo adicional com o acionamento de termelétricas ao longo do segundo semestre deste ano, diante da situação crítica dos reservatórios.
Banceira vermelha patamar 2 passa a custar R$ 9,49 a cada 100 kWh consumidos. Foto: Paulo Whitaker/Reuters
Mas, o relator do processo, diretor Sandoval Feitosa, afirmou que seria necessário alterar as regras da agência para aprovar um reajuste nesse patamar. Nesse sentido, o diretor apresentou um reajuste de 1,67%, que representaria uma cobrança adicional de R$ 6,49 a cada 100 kWh. Apesar de reconhecer o cenário excepcional, devido à pior crise hídrica dos últimos 91 anos, o diretor afirmou que é justo que uma mudança nas regras seja submetida a uma nova consulta pública, para que o processo tenha transparência e previsibilidade.
O entendimento que prevaleceu na diretoria, no entanto, é que o cenário crítico exige um reajuste que comporte os custos e dê um sinal mais claro aos consumidores da situação já a partir do mês de julho, sob risco de um reajuste ainda maior no mês de agosto ou até mesmo no ano que vem, quando um possível déficit na conta bandeiras seria repassado aos consumidores por meio dos reajustes anuais de cada distribuidora.
A proposta aprovada foi apresentada pelo diretor-geral da agência, André Pepitone, que sugeriu uma alteração no parâmetro dos cálculos, que passa a incorporar todos os cenários previstos para os próximos meses. Por causa da crise hídrica, as estimativas apontam para os piores cenários, o que resulta no aumento. “A gente não está promovendo aumento porque gosta ou porque quer, é uma realidade. O custo está aqui, está presente, o que estamos decidindo é o que fazer com esse custo. Se apresento agora, se apresento depois. Se apresentar depois vou ter esse custo corrigido pela Selic (a taxa básica de juros)”, afirmou.
A agência também aprovou reajuste nas bandeiras amarela e vermelha patamar 1. Pela proposta, a taxa cobrada quando a agência acionar a bandeira amarela irá aumentar 39,5%, de R$ 1,343 a cada 100 kWh para R$ 1,874. A bandeira vermelha 1, passará de R$ 4,169 a cada 100 quilowatts-hora (kWh) consumidos para R$ 3,971- redução de 4,75%.
Sistema de bandeiras
O sistema de bandeiras tarifárias foi criado em 2015. As cores e modalidades -verde, amarela ou vermelha - indicam se haverá ou não cobrança extra nas contas de luz.
A bandeira verde, quando não há cobrança adicional, representa que o custo para produzir energia no País está baixo. Já o acionamento das bandeiras amarela e vermelha representa um aumento no custo da geração e a necessidade de acionamento de térmicas, o que está ligado principalmente ao volume dos reservatórios das usinas hidrelétricas e a previsão de chuvas.
Considerando que o País entrou no período seco com nível crítico nos reservatórios, a projeção da área técnica da Aneel é que a bandeira vermelha em seu segundo patamar seja mantida, pelo menos, até novembro.
Além de possibilitar aos consumidores adaptar seu consumo, o sistema de bandeiras também atenua os efeitos no orçamento das distribuidoras. Anteriormente, o custo da energia era repassado às tarifas uma vez por ano, no reajuste anual de cada empresa, com incidência de juros. Agora, esse custo é cobrado e repassado às empresas mensalmente.
O revés de Bolsonaro em sua cruzada contra a urna eletrônica
No último sábado (27), os presidentes de 11 partidos, inclusive de legendas aliadas ao presidente Jair Bolsonaro, como o PP e o PL, decidiram se opor publicamente à Proposta de Emenda Constitucional (PEC) para reintroduzir o sistema que utiliza o voto impresso no Brasil. O texto, apresentado pela deputada bolsonarista Bia Kicis, também é rechaçado por ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) e do Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Para ser aprovada, a PEC precisa do apoio de pelo menos 308 deputados, mas apenas os parlamentares pertencentes aos partidos reunidos no sábado já somam 326 dos 513 votos.
Ainda assim, o governo mantém a defesa da proposta que, segundo Bolsonaro, busca impedir supostas fraudes no processo eleitoral. Esses indícios de fraude alegados pelo presidente, porém, jamais foram comprovados, e Bolsonaro, inclusive, já foi interpelado judicialmente para apresentar provas, o que ainda não fez. Mas, apesar da manifestação pública dos partidos, a tramitação da PEC avança na Câmara dos Deputados e, na segunda-feira (28), o relator, deputado bolsonarista Filipe Barros, apresentou seu parecer na Comissão Especial. De acordo com o documento, torna-se obrigatória a impressão do voto, que seria depositado automaticamente em uma urna, sem nenhum contato manual. O eleitor poderia conferir o voto pela sua impressão, que também seria utilizada para fins de auditagem da apuração. Os especialistas em direito eleitoral, no entanto, advertem que é justamente a reintrodução do papel no processo que abre caminho para eventuais fraudes. Entendimento compartilhado também pelo presidente do TSE, o ministro Luis Roberto Barroso. No Ao Ponto desta terça-feira, a colunista Bela Megale e o advogado, professor e membro da Academia Brasileira de Direito Eleitoral e Político Rafael Morgental analisam como a articulação contra a proposta de Bolsonaro pode impactar os planos de mudar o sistema de votação. Eles também avaliam quais são os riscos que essa alteração poderia trazer para a lisura da disputa eleitoral, em especial durante a eleição presidencial de 2022.
Publicado de segunda a sexta-feira, às 6h, nas principais plataformas de podcast e no site do GLOBO, o Ao Ponto é apresentado pelos jornalistas Carolina Morand e Roberto Maltchik, sempre abordando acontecimentos relevantes do dia. O episódio também pode ser ouvido na página de Podcasts do GLOBO. Você pode seguir a gente em plataformas como Spotify, iTunes, Deezer e também na Globoplay.
Lula ajuda Bolsonaro - Por Merval Pereira
A base da estratégia político-eleitoral do presidente Jair Bolsonaro é colocar-se como único capaz de derrotar Lula e o PT nas urnas, para o bem do país, que, caso contrário, cairá nas mãos dos “comunistas”. Parte dos eleitores foi para Bolsonaro em 2018 devido a esse temor, e as Forças Armadas acreditam que o comunismo é uma ameaça real, não um fantasma alimentado por Bolsonaro.
O desastre do governo já fez com que, segundo recente pesquisa do Ipec, mais de 50% dos seus eleitores tenham desistido de mantê-lo no poder, muitos dispostos a votar no PT desta vez. Sabemos que a China hoje é mais capitalista do que comunista, por isso é um erro estratégico fatal tratarmos a segunda maior economia do mundo como uma inimiga, deixando de lado a oportunidade de compartilhar os avanços tecnológicos e de nos beneficiarmos dos avanços da economia do nosso maior parceiro comercial.
Mas apostar que a China quer se integrar efetivamente ao sistema econômico ocidental, aceitando as regras da Organização Mundial do Comércio (OMC) ou submetendo-se, embora relutantemente, às normas da Organização Mundial da Saúde (OMS) durante esta pandemia da Covid-19, não significa esquecer que a China é uma ditadura que precisa ser pressionada para que os princípios da democracia avancem, impedindo, ou tornando mais constrangedor, o cerceamento da liberdade de expressão, como fizeram agora com o Apple Daily em Hong Kong.
Ou levando-a a participar dos esforços internacionais de preservação do meio ambiente, como vem fazendo, com projetos de redução da emissão de carbono na atmosfera. Contrapondo-se à posição esdrúxula do governo brasileiro em relação à China, o ex-presidente Lula deu uma entrevista ao jornal chinês Guancha, em que afirma que aquele país “estabeleceu um modelo de desenvolvimento para o mundo inteiro” e disse esperar que os países aprendam com o exemplo chinês.
Vá lá, mas nunca é demais lembrar que o desenvolvimento econômico chinês, embora louvável, tem aspectos inaceitáveis, como o uso de trabalho escravo, de trabalho infantil, o desrespeito pela propriedade intelectual, para citar pontos cruciais. Além de níveis de pobreza e desigualdade interna dos piores no mundo, mesmo que seja admirável o resgate de milhões de chineses da pobreza extrema nos últimos anos.
Mas foi no aspecto político que Lula errou feio. Ele afirmou que a China “é capaz de lutar contra o coronavírus tão rapidamente porque tem um partido político forte e um governo forte, porque o governo tem controle e poder de comando. O Brasil não tem isso, nem outros países”. Ora, é justamente “controle e poder” de comando que caracterizam uma ditadura.
Partido único e governo forte é a receita perfeita para a imposição de ideias e decisões do Partido Comunista da China, que comemorará seu centenário em 1º de julho. É verdade que, não apenas no Brasil, a relação entre democracia e capitalismo já não é mais tão absoluta quanto foi nos últimos anos do século passado.
Buscam-se modelos para aperfeiçoar a democracia representativa, que tem como um dos pilares a ideia de “uma pessoa, um voto”, criticada na China, pois não levaria às escolhas mais corretas, muito sujeitas a pressões financeiras. Os estudiosos ocidentais do modelo chinês acreditam que eles caminham para a implantação de um sistema político baseado na meritocracia, que resultaria num Parlamento que mais legitimamente representaria o conjunto da população, em contraposição aos formados pelos que se elegem pela força do dinheiro, ou por um dom natural de oratória, ou por ser famosos em seu ofício.
Há quem, na China, defenda que essa meritocracia já vem sendo adotada pelo sistema de “seleção natural” de dirigentes dentro do Partido Comunista. O afunilamento na escolha levaria os melhores a galgar degraus na hierarquia. Não me parece uma solução aceitável, pelo menos no mundo ocidental. O que temos de fazer é buscar a legitimação da democracia representativa por reformas estruturais na educação e na distribuição de renda e das regras eleitorais, para que o cidadão tenha capacidade de escolher melhor candidatos melhores. E não alcançaremos isso com partido único e governo forte.
Entenda o crime de prevaricação e como isso pode ser usado contra Bolsonaro no caso Covaxin
Prevaricação se tornou uma das palavras mais repetidas por opositores de Jair Bolsonaro desde que o deputado federal Luis Miranda (DEM-DF) deu detalhes na semana passada do encontro com o presidente da República no qual falou sobre as suspeitas envolvendo a importação da vacina Covaxin.
A oposição quer investigar se o presidente incorreu no delito ao deixar de comunicar investigadores sobre o assunto. Embora Bolsonaro tenha dito que iria avisar à Polícia Federal, nenhum inquérito sobre o assunto foi aberto.
Nesta segunda-feira (28), três senadores apresentaram no STF (Supremo Tribunal Federal) uma notícia-crime contra Bolsonaro por prevaricação.
Crime com pena branda, a prevaricação já alavancou suspeitas em outros governos e requer uma comprovação que pode ser complexa na Justiça.
O que é prevaricação? A prevaricação é um crime contra a administração pública que acontece quando o agente público deixa de agir da maneira que se espera dele e no qual é obtida alguma espécie de favorecimento. Exemplos são casos de policiais ou fiscais que não tomam providência diante de uma irregularidade, para proteger determinada pessoa.
O Código Penal especifica da seguinte maneira: "Retardar ou deixar de praticar, indevidamente, ato de ofício, ou praticá-lo contra expressa disposição de lei, para satisfazer interesse ou sentimento pessoal". O ato de ofício é aquele que se espera que o servidor faça independentemente de um pedido. Governantes, como o presidente da República, também são funcionários públicos.
Como se demonstra o "interesse pessoal"? A expressão "interesse ou sentimento pessoal" disposta na lei torna necessário que se demonstre com provas que o agente público acusado tinha a intenção de barrar, por exemplo, a investigação de um outro delito.
"Simplesmente um erro [do agente] não pode ser considerado prevaricação. Senão, qualquer escolha errada poderia ser um crime. Engessaria totalmente qualquer administração federal, estadual ou municipal", diz o juiz Eduardo André Brandão, presidente da Associação dos Juízes Federais.
Sem se referir ao caso em discussão na CPI da Covid, o professor de direito da PUC-SP Marco Antonio Marques da Silva, que é desembargador aposentado, diz que o benefício para quem comete o crime pode ser patrimonial, mas também moral.
"A vantagem de natureza moral pode ser ganhar relevância ou obter prestígio junto a determinado grupo, agremiação. O 'sentimento pessoal' [expresso na lei] pode ser a afeição, empatia ou benevolência por uns ou ódio, parcialidade, por outros. Ou paixão política."
Qual seria o interesse de Bolsonaro no caso Covaxin? No caso da compra da vacina indiana, investigado na CPI da Covid, senadores consideram que o interesse de Bolsonaro pode ter sido proteger aliados, como o líder do governo na Câmara, Ricardo Barros (PP-PR).
Em notícia-crime apresentada nesta segunda-feira (28), Randolfe Rodrigues (Rede-AP) e outros dois parlamentares afirmam que a suposta omissão do presidente ocorreu "ou por envolvimento próprio no esquema criminoso ou por necessidade de blingagem dos amigos do rei".
Segundo afirmou em depoimento o deputado federal Luis Miranda na semana passada, Bolsonaro foi informado em março de irregularidades na compra da vacina Covaxin e atribuiu a Barros a pressão no Ministério da Saúde pela concretização do negócio.
Qual é a pena para a prevaricação? A legislação estabelece pena de detenção de três meses a um ano, além de multa. Por ser de menor potencial ofensivo, o caso tramita nos Juizados Especiais Criminais, conforme lei de 1995. Essa unidade do Judiciário objetiva não aplicar penas privativas de liberdade.
Em 2007, houve um acréscimo no Código Penal especificando a omissão relacionada à entrada de celulares em presídios como crime de prevaricação de agente público. A pena é a mesma do delito convencional.
Quais são os precedentes desse tipo de crime na política? Nas altas esferas de governo, embora o crime já tenha sido debatido em outras crises políticas, a condenação não é tão comum.
"É preciso buscar um 'elemento subjetivo'. Ele [acusado] tinha realmente a intenção? Ele queria agir dessa forma? Às vezes não se pega o dolo direto, mas se sabe que é impossível que ele não tenha consciência de que deveria tomar a providência", diz o professor Marco Antonio Marques da Silva.
Um exemplo recente de condenação por prevaricação foi a aplicada em 2019 pelo STJ (Superior Tribunal de Justiça) a Cícero Amélio da Silva, ex-presidente do Tribunal de Contas de Alagoas.
A corte considerou que ele favoreceu um prefeito ao reter os autos de um processo em seu gabinete antes de uma eleição. Mas essa ação ainda tem recursos pendentes.
No caso da boate Kiss, que pegou fogo em Santa Maria (RS) em 2013 matando 242 pessoas, um oficial dos Bombeiros foi condenado por prevaricação porque a Justiça Militar gaúcha considerou que ele não puniu um subordinado que administrava uma empresa privada de prevenção a incêndios, o que era proibido.
A prevaricação pode se tornar uma acusação de crime de responsabilidade contra o presidente? Em tese, o delito de prevaricação poderia ser enquadrado como um crime de responsabilidade do presidente da República. A chamada Lei do Impeachment, de 1950, usada nos processos de afastamento contra Fernando Collor (1992) e Dilma Rousseff (2016), inclui expressões de sentido amplo, como "proceder de modo incompatível com a dignidade, a honra e o decoro do cargo".
Embora também chamados de "crime", os de responsabilidade não são um tipo penal, mas uma infração político-administrativa.
Na notícia-crime desta segunda-feira, os senadores também dizem que a omissão do presidente da República em relação ao contrato da Covaxin poderia constituir um crime de responsabilidade nessa legislação.
É a primeira vez que a oposição faz essa acusação contra o presidente? Antes do caso Covaxin, o próprio Bolsonaro já esteve no centro de discussões sobre possível prevaricação.
A Rede foi ao STF na semana passada pedir liminar para que Bolsonaro exiba as provas de fraude eleitoral em 2018 que ele diz possuir. Para o partido, como servidor público, o presidente tem obrigação legal de tomar uma atitude para esclarecer os fatos. O crime de prevaricação é mencionado na peça.
Uma outra solicitação de partido enviada ao Supremo que cita prevaricação foi do PC do B, no início do ano, que tratava da crise da escassez de oxigênio nos hospitais de Manaus.
Deputados da legenda viram indícios de que o presidente e seu então ministro da Saúde, Eduardo Pazuello, deixaram de praticar ato ao qual estavam obrigados "para atender a sentimento ou interesse próprios".
Como foram as discussões em outros governos? O debate sobre prevaricação atingiu fortemente desde a redemocratização outros dois presidentes durante seus mandatos, mas não teve maiores consequências judiciais.
O delator do mensalão do PT, Roberto Jefferson (PTB), afirmou em 2005 que informou o então presidente Lula sobre pagamentos para parlamentares antes do escândalo vir à tona. "Eu disse: 'Delúbio [tesoureiro do PT] vai botar uma dinamite na sua cadeira. Ele continua dando 'mensalão' aos deputados", afirmou Jefferson à Folha.
Lula sempre disse que desconhecia o esquema e acabou não incluído em denúncia da Procuradoria-Geral da República sobre o assunto.
Mais recentemente, a oposição a Michel Temer (MDB) chegou a apresentar pedido de impeachment após um de seus ministros, Marcelo Calero, acusar outro, Geddel Vieira Lima, de intervir em um órgão federal para liberar a construção de um prédio residencial próximo de área tombada na Bahia.
Calero dizia que tinho sido pressionado também pelo presidente nessa questão. O caso virou uma ação de improbidade contra Geddel, na qual Temer não foi acusado.
Meses mais tarde, em 2017, o comportamento do então presidente novamente gerou debates sobre prevaricação quando foi divulgado áudio de conversa dele com o empresário Joesley Batista, da JBS. Joesley, no diálogo, falava em acertos com juízes e com um procurador. Também nesse caso não houve acusação criminal.
O QUE ACONTECEU APÓS A REVELAÇÃO DO CASO PELA FOLHA
Reportagem aponta pressão atípica (18.jun)
Em depoimento mantido em sigilo pelo MPF (Ministério Público Federal) e obtido pela Folha, Luís Ricardo Fernandes Miranda, chefe da divisão de importação do Ministério da Saúde, afirmou ter sofrido pressão de forma atípica para tentar garantir a importação da vacina indiana Covaxin
'É bem mais grave' (22.jun)
Irmão do servidor do Ministério da Saúde, o deputado federal Luís Miranda (DEM-DF) disse à Folha que o caso é "bem mais grave" do que a pressão para fechar o contrato
Menção a Bolsonaro (23.jun)
Luis Miranda afirmou ter alertado o presidente sobre os indícios de irregularidade. "No dia 20 de março fui pessoalmente, com o servidor da Saúde que é meu irmão, e levamos toda a documentação para ele"
CPI aprova depoimentos (23.jun)
Os senadores da comissão aprovaram requerimento de convite para que o servidor Luís Ricardo Miranda preste depoimento. A oitiva será nesta sexta-feira (25) e o deputado Luis Miranda também será ouvido.
Os parlamentares também aprovaram requerimento de convocação (modelo no qual a presença é obrigatória) do tenente-coronel Alex Lial Marinho, que seria um dos autores da pressão em benefício da Covaxin. A CPI também decidiu pela quebra de sigilo bancário, fiscal, telefônico e telemático de Lial Marinho
Denúncia grave (23.jun)
Presidente da CPI, o senador Omar Aziz (PSD-AM) afirmou que as denúncias de pressão e a possibilidade de que o presidente Jair Bolsonaro tenha tido conhecimento da situação talvez seja a denúncia mais grave recebida até aqui pela comissão
Bolsonaro manda PF investigar servidor e deputado (23.jun)
O presidente mandou a Polícia Federal investigar o deputado Luis Miranda e o irmão dele, Luis Ricardo Fernandes Miranda. O ministro da Secretaria-Geral, Onyx Lorenzoni, e Elcio Franco, assessor especial da Casa Civil e ex-secretário-executivo do Ministério da Saúde, foram escalados para fazer a defesa do presidente. Elcio é um dos 14 investigados pela CPI
Empresa diz que preço para Brasil segue tabela (23.jun)
A Precisa Medicamentos, representante no Brasil do laboratório indiano Bharat Biotech, afirmou que o preço de US$ 15 por dose da vacina oferecido ao governo segue tabela mundial e é o mesmo praticado com outros 13 países
Governistas dizem que Bolsonaro repassou suspeitas a Pazuello (24.jun)
Senadores governistas da CPI afirmaram que o presidente pediu que Pazuello verificasse as denúncias envolvendo a compra da Covaxin assim que teve contato com os indícios
'Acusação é arma que sobra' (24.jun)
Bolsonaro fustigou integrantes da CPI, repetiu que não há suspeitas de corrupção em seu governo e afirmou que a acusação sobre a vacina é a arma que sobra aos seus opositores. "Me acusam de quase tudo, até de comprar uma vacina que não chegou no Brasil. A acusação é a arma que sobra", disse o presidente na cidade de Pau de Ferros, no Rio Grande do Norte
'Foi o Ricardo Barros que o presidente falou' (25.jun)
Em depoimento à CPI da Covid, o deputado federal Luis Miranda (DEM-DF), que é irmão do servidor do Ministério da Saúde Luis Ricardo Miranda, afirmou ter alertado Bolsonaro. “A senhora também sabe que foi o Ricardo Barros que o presidente falou", disse o parlamentar à senadora Simone Tebet (MDB-MS). Segundo ele, Bolsonaro afirmou: "Vocês sabem quem é, né? Sabem que ali é foda. Se eu mexo nisso aí, você já viu a merda que vai dar, né? Isso é fulano. Vocês sabem que é fulano"
Ou os irmãos Miranda gravaram o presidente ou estão blefando. Bolsonaro paga para ver?
29 de junho de 2021 | 03h00
Quanto mais abre a boca, mais o presidente Jair Bolsonaro se enrola e mais vai aplainando o caminho para a volta do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva ao Palácio do Planalto. Já não há mais dúvida: Bolsonaro é o maior adversário dele mesmo e o principal cabo eleitoral de Lula em 2022. Quanto mais um cai, mais o outro se consolida.
A campanha de Bolsonaro foi a que captou antes e usou melhor o grande catalisador da eleição de 2018: qualquer coisa, menos o PT. Nada como um dia atrás do outro, ou de uma eleição atrás da outra, e agora foi a campanha de Lula que captou antes e pretende usar melhor o catalisador de 2022: qualquer coisa, menos Bolsonaro.
Ao abrir a boca ontem, o presidente produziu mais uma pérola: “Não tenho como saber o que acontece nos ministérios”. Em meio à pandemia, aos ataques e ao desprezo às vacinas, também admitiu, como quem não quer nada: “Eu nem sabia como é que estava a tratativa...” Ou seja, como estava a pressa e a pressão para comprar a preço de ouro a Covaxin, vacina indiana que não tinha autorização nem na Índia, quanto mais da Anvisa.
O presidente fala do jeito mais displicente sobre questões graves e complexas, como mortes, pandemia, economia, governo, China, Joe Biden, ambiente, índios, máscaras, vacinas, deixando a impressão de que, ou ele se finge de bobo, ou é bobo mesmo. E, definitivamente, governando é que ele não está.
Nenhum presidente é obrigado a saber tudo de todos os ministérios, mas como não saber nada do Ministério da Saúde durante uma pandemia que já matou mais de 510 mil brasileiros? E como não sabia das tratativas da Covaxin? Foi ele quem enviou mensagem para o primeiro-ministro da Índia, Narendra Modi, em favor dessa vacina, depois de desdenhar de Pfizer e Coronavac!
Ok. Vamos dar a Bolsonaro o benefício da dúvida. Vai que ele falou a verdade e não sabia de nada mesmo, já que estava superocupado, andando de moto, atacando jornalistas e inaugurando pontezinhas no Norte e agênciazinhas da CEF no Sul. Mas e, depois, quando recebeu as informações e os documentos do deputado Luis Miranda e seu irmão Luis Ricardo, responsável pelas importações no Ministério da Saúde?
Foi no dia 20 de março, sábado. A partir daí, não há como dar benefício da dúvida, porque ninguém, por mais desmemoriado, tem o direito de esquecer uma denúncia envolvendo US$ 45 milhões. Ele sabia exatamente o que estava acontecendo no ministério, sabia exatamente das tratativas (ou mutretas) com a Covaxin e simplesmente lavou as mãos. Tem nome: prevaricação.
Toda a confusão imobilizou o presidente e o Centrão. Nem Bolsonaro sabe o que fazer com o seu líder Ricardo Barros, nem o Centrão de Barros sabe o que fazer com Bolsonaro. Luis Miranda está no comando da situação: ou gravou a conversa com o presidente, ou blefou ao jogar isso no ar. Alguém tem como desmenti-lo? E quem quer pagar para ver?
A situação vai se complicando, com a notícia-crime contra Bolsonaro no Supremo por prevaricação e com novas descobertas instigantes. A Precisa, que representa a Covaxin no Brasil e tem uma reputação “mais ou menos”, aumentou seus negócios com o governo em 6.000% na era Bolsonaro. E não era a única a ter privilégios e defensores poderosos.
A vacina Convidecia, da chinesa CanSino, passou pelo mesmo processo atípico, também não tinha autorização da Anvisa e pedia um preço ainda maior do que a Covaxin. Onde é a sede da representante dela no Brasil? Em Maringá (PR), cidade do líder do governo e ex-ministro da Saúde Ricardo Barros – o dos “rolos”. Deve ser tudo coincidência, como os bolsonaristas-mor Luciano Hang e Carlos Wizard serem pró-Convidencia desde criancinhas.
Rosa Weber, do STF, encaminha à PGR notícia-crime contra Bolsonaro por suposta prevaricação
29 de junho de 2021 | 00h21
A ministra Rosa Weber, do Supremo Tribunal Federal (STF), encaminhou à Procuradoria-Geral da República (PGR) a notícia-crime protocolada por senadores da CPI da Covid que pedem abertura de inquérito contra o presidente Jair Bolsonaro por suposta prevaricação no caso envolvendo a compra da vacina Covaxin. Rosa foi sorteada relatora do caso na Corte.
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Senadores enviam ao STF notícia-crime contra Bolsonaro por prevaricação no Caso Covaxin
A peça assinada pelos senadores Randolfe Rodrigues (Rede-AP), vice-presidente da CPI da Covid, Fabiano Contarato (Rede-ES) e Jorge Kajuru (Podemos-GO) defende que Bolsonaro cometeu crime de prevaricação ao não determinar à Polícia Federal investigações de possíveis irregularidades relatadas pelo deputado federal Luis Miranda (DEM-DF) e seu irmão servidor do Ministério da Saúde na compra da Covaxin. Os irmãos Miranda depuseram na CPI na última sexta-feira e disseram que alertaram o presidente sobre o suposto caso de corrupção. Os dois envolveram o líder do governo na Câmara, deputado Ricardo Barros (Progressistas-PR) no que Bolsonaro teria chamado de "rolo" na pasta.
A notícia-crime também pede que o presidente da República responda em 48 horas se foi comunicado das denúncias feitas pelos irmãos Miranda. De acordo com a lei, se comunicado, Bolsonaro teria de ter pedido a abertura de investigação ao ouvir as suspeitas, sob pena de cometer crime de prevaricação.
Agora, a manifestação sobre a notícia-crime cabe ao procurador-geral da República, Augusto Aras. Se der prosseguimento à abertura de inquérito, Aras pode desagradar Bolsonaro e afetar seus planos de ser reconduzido ao cargo. A escolha do PGR cabe ao presidente da República. Além disso, Aras é cotado para ser indicado à vaga do ministro Marco Aurélio Mello no STF, caso o atual advogado-geral da União (AGU), André Mendonça, favorito do Palácio do Planalto para o posto, tenha seu nome rejeitado pelo Senado Federal, que pode validar ou não a indicação de Bolsonaro.