Populismo penal - O ESTADO DE SP
Entre novembro e dezembro do ano passado, o presidente Jair Bolsonaro tomou duas decisões que beneficiam corporações cujos votos sempre cortejou em seus 30 anos de trajetória política – policiais federais, policiais civis, policiais militares, policiais rodoviários e bombeiros.
A primeira decisão foi o envio ao Congresso de um projeto de lei com regras para anistiar e isentar de punições – por meio do chamado excludente de ilicitude – integrantes de forças de segurança que atuaram e atuam em operações da chamada Garantia da Lei e da Ordem. Previsto pela legislação penal, o excludente de ilicitude é o instituto jurídico que exclui a culpabilidade de condutas ilegais de agentes policiais em determinadas circunstâncias. Segundo o artigo 24 do Código Penal, “não há crime quando o agente pratica o fato em estado de necessidade, em legítima defesa e em estrito cumprimento de dever legal ou no exercício regular de direito”.
O projeto de Bolsonaro amplia o alcance desse artigo, determinando que também “não haverá crime” se os excessos cometidos por um agente policial “decorrerem de escusável medo, surpresa ou violenta emoção”. O anúncio do envio do projeto para o Congresso foi feito pelo presidente em discurso que pronunciou na convenção de lançamento de seu novo partido, o Aliança pelo Brasil.
A segunda decisão foi a sanção da Lei n.° 13.967, ocorrida um dia após o Natal. Ela alterou o Decreto-Lei n.° 667 que entrou em vigor em 1969, tendo por objetivo reorganizar as polícias militares e os corpos de bombeiros militares dos Estados, dos Territórios e do Distrito Federal. Com quatro artigos, a Lei n.° 13.967 alterou o dispositivo desse decreto que tipifica e classifica sanções disciplinares aplicáveis aos membros das duas corporações e regulamenta o funcionamento do Conselho de Ética e Disciplina Militares. A principal alteração foi a extinção de penas disciplinares que implicam “medidas privativas e restritivas de liberdade”. Em linguagem não jurídica, a lei extinguiu a pena de prisão disciplinar para policiais militares e bombeiros. E fixou o prazo de doze meses para que os Estados e o Distrito Federal implementem essa decisão.
As duas decisões tomadas por Bolsonaro são perigosas para o funcionamento do Estado de Direito. Isso porque, ao reduzir as punições aplicáveis a agentes armados pelo poder público que exorbitam de suas prerrogativas, elas ampliam ainda mais a discricionariedade desses profissionais. E o resultado pode ser trágico, na medida em que essas mudanças legais tendem a aumentar a impunidade justamente de quem tem a responsabilidade de zelar pela ordem pública.
Infelizmente, as duas decisões adotadas por Bolsonaro são uma espécie de endosso a um extenso rol de reivindicações irresponsáveis e inconsequentes que têm sido apresentadas nos últimos anos por corporações de policiais militares ao Executivo e ao Legislativo. O caso mais ilustrativo ocorreu em 2017, quando os policiais militares do Espírito Santo deflagraram uma greve ilegal. A paralisação deixou um rastro de violência e criminalidade. Diante de tamanha afronta à lei, a corregedoria da Polícia Militar abriu 2,6 mil processos administrativos contra os grevistas. Mas, pressionada pela corporação, a Assembleia Legislativa aprovou por unanimidade um projeto enviado pelo chefe do Executivo concedendo anistia aos amotinados. Nos meses seguintes à concessão da anistia, várias corporações policiais estaduais, sabendo até onde podia ir sua indisciplina, tentaram fazer o mesmo que seus colegas capixabas.
As duas decisões de Bolsonaro, portanto, não podem ser vistas apenas como meras concessões populistas para angariar votos dos membros das corporações militares. Acima de tudo, a consequência natural do alargamento do conceito de excludente de ilicitude e de revogação de penas disciplinares de policiais que cometem excessos constitui uma ameaça às instituições.
Sindicatos na encruzilhada - O ESTADO DE SP
Em 2018, o porcentual de pessoas sindicalizadas atingiu o menor patamar da série histórica iniciada em 2012. Os dados são da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) Contínua: Características Adicionais do Mercado de Trabalho, feita pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). No ano passado, de um total de 92,3 milhões de pessoas ocupadas, 11,5 milhões (12,5%) estavam associados a algum sindicato. Num ano, entre 2017 e 2018, 1,552 milhão de pessoas deixaram de ser sindicalizadas, numa redução de 2,1 pontos porcentuais. Em cinco anos consecutivos de reduções, os sindicatos perderam 3,098 milhões de associados.
São várias as causas que contribuíram para a diminuição de tamanho e de relevância dos sindicatos. Em relação ao período analisado pela pesquisa, podem ser mencionados o aumento da informalidade e, principalmente, a mudança da legislação trabalhista. Em novembro de 2017, entrou em vigor a reforma trabalhista (Lei n.º 13.467/2017), aprovada durante o governo de Michel Temer, que extinguiu a obrigatoriedade da contribuição sindical. Agora, sem a necessidade de pagar a contribuição sindical, só se sindicaliza quem de fato tem interesse.
A Pnad Contínua apresenta um perfil do sindicalizado brasileiro. Em 2018, a maior taxa de sindicalização ocorreu entre trabalhadores do setor público (25,7%), seguido dos trabalhadores do setor privado com carteira assinada (16%). Trabalhadores por conta própria tiveram taxa de sindicalização de 7,6% e aqueles sem carteira, 4,5%.
Em 2018, todas as categorias tiveram redução da taxa de sindicalização. A maior queda foi a de empregador, que passou de 15,6% em 2017 para 12,3% em 2018. Nove das dez categorias profissionais listadas pelo IBGE apresentaram no ano passado a menor taxa de sindicalização desde 2012.
Também houve queda de sindicalizados em todos os níveis de instrução. Historicamente, quanto maior era o nível de instrução, maior a taxa de sindicalização. Mesmo sendo o grupo que teve em 2018 a maior queda em termos porcentuais, 20,3% dos ocupados com nível superior completo eram sindicalizados. A queda foi constatada também em todas as regiões do País, com destaque para o Norte e Centro-Oeste, que tiveram queda de 20% do contingente de trabalhadores sindicalizados.
Vale notar que, de 2017 para 2018, houve aumento de 1,4% da população ocupada. No entanto, o crescimento se deu em atividades não formais, o que contribuiu pouco para o total de sindicalizados. “São as duas atividades que mais geraram ocupação: a de transporte por causa dos aplicativos e a de alimentação pelo fenômeno dos ambulantes de comida, como o pessoal que vende quentinhas. As duas atividades cresceram com trabalhadores mais precarizados, normalmente sem carteira de trabalho ou por conta própria, que são trabalhadores que de fato não têm mobilização sindical”, afirmou Adriana Beringuy, pesquisadora do IBGE.
Se o quadro de drástica redução do número de sindicalizados traz desafios para os sindicatos, ele ajuda a expor problemas existentes há muito tempo, mas que estavam ocultos até então pelas receitas do imposto sindical. Com uma fonte certa de recursos, os sindicatos não precisavam atender aos interesses dos sindicalizados para serem sustentáveis financeiramente. Eles não precisavam representar os trabalhadores. As lideranças sindicais podiam agir como bem entendessem, que os recursos chegariam da mesma forma. Assim, ao longo do tempo, tal sistema serviu para que os sindicatos ficassem cada vez mais distantes dos trabalhadores, numa verdadeira cisão de perspectivas e interesses entre os sindicatos e seus associados. Ou seja, o sindicato tornou-se autônomo em relação aos trabalhadores.
A reversão dessa trajetória de queda do número de sindicalizados passa por fortalecer a representação. De outra forma, a fuga de trabalhadores dos sindicatos só tende a se agravar. Afinal, não faz sentido associar-se a uma entidade que não trabalha em prol do associado, e sim em favor de seus dirigentes.
A recuperação do emprego com carteira assinada
22 de dezembro de 2019 | 05h00
O mercado de trabalho formal está registrando neste ano seu melhor desempenho desde 2013, antes, portanto, da recessão que a gestão econômica do governo Dilma Rousseff legou ao País. Com a criação de 99.232 postos com carteira assinada em novembro, de acordo com dados do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged), da Secretaria de Trabalho do Ministério da Economia, o mercado de trabalho formal soma a abertura de 948.344 vagas em 2019.
Diante desses números, o presidente Jair Bolsonaro afirmou que “com toda certeza, como falta o mês de dezembro, devemos bater 1 milhão de novos empregos (no ano)”. É possível, mas é pouco provável que isso ocorra, pois no último mês normalmente o número de vagas fechadas no mercado formal costuma ser maior do que o de abertas.
Ainda assim, no que se refere ao número de empregos com carteira assinada, 2019 deverá ser o melhor dos últimos seis ou sete anos. Em 2015 e 2016, os piores anos da recessão, foram fechados, respectivamente, 945,4 mil e 858,3 mil vagas no mercado formal entre os meses de janeiro e novembro. Em 2017 o mercado começou a reagir lentamente. A reação intensificou-se no ano seguinte e parece consolidar-se neste ano.
Em novembro, os setores que mais abriram vagas com carteira assinada foram comércio (106.834 postos), serviços (44.287) e serviços industriais de utilidade pública (419). Só no Estado de São Paulo o número de empregados formais no comércio varejista aumentou em 27.398. As contratações no varejo são comuns nesta época, por causa do aumento das vendas no período.
Embora tenha fechado 24.815 postos em novembro, a indústria de transformação registra, no ano, a abertura de 123.931 vagas, claro sinal de que também esse segmento – cuja crise começou bem antes da recessão de 2015 e 2016 – está se recuperando. Entre todos os segmentos da economia, a indústria de transformação é o que oferece as melhores oportunidades de emprego em termos de rendimento, mas também exige melhor qualificação dos trabalhadores.
A despeito dos bons números do Caged, a situação geral do mercado de trabalho – que inclui o trabalho informal e o por conta própria – preocupa. A população desocupada é de 12,4 milhões de pessoas e a população subutilizada, de 27,1 milhões
Recupera-se a arrecadação federal
25 de dezembro de 2019 | 04h00
Produção industrial, vendas de bens e serviços e aumento da massa salarial foram fatores que ajudaram a arrecadação federal em novembro. Esses fatores explicam o crescimento da receita em relação a novembro de 2018 de 5,28% nominais e de 1,54% real. No período de janeiro a novembro, as receitas totais atingiram R$ 1,39 trilhão, com crescimento real de 1,88% em relação ao total de R$ 1,32 trilhão arrecadado em igual período de 2018.
Os números da Análise da Arrecadação das Receitas Federais mostram que mesmo sem considerar fatores não recorrentes como reorganizações societárias e receitas provenientes do Programa de Regularização Tributária houve aumento real de 1,56% entre os primeiros 11 meses de 2018 e de 2019. Isso significa que os tributos tradicionais mostram boa capacidade arrecadatória, pondo em questão a necessidade de um novo tributo sobre transações digitais defendido pelo ministro da Economia, Paulo Guedes.
Nem a queda do dólar em relação ao real, que afeta a arrecadação, alterou muito os indicadores de novembro.
Destacaram-se, em novembro, os tributos sobre os lucros das empresas (IRPJ e CSLL) e sobre a renda das famílias. O IR retido na fonte sobre os rendimentos do trabalho atingiu R$ 12,3 bilhões, alta real de 9,15% em relação a novembro de 2018. Isso presume recuperação de salários, também constatada na pesquisa Salariômetro, feita pela Fipe-USP com base em dados do Ministério do Trabalho. O IR na Fonte sobre o Trabalho teve aumento real de 4,75% entre os primeiros 11 meses de 2018 e de 2019.
Com os ganhos de capital na alienação de bens, inclusive ações, o IRPF arrecadou R$ 3,5 bilhões em novembro, 31,36% acima do arrecadado em igual mês do ano passado.
Há recuperação da arrecadação apesar da ligeira queda, em novembro, da receita previdenciária e, em especial, da Cofins e PIS-Pasep. Estas são as duas maiores fontes de tributos federais, com arrecadação superior à do IRPJ-CSLL e do IR sobre a renda do trabalho.
A elevação da receita de IRPJ-CSLL, que são tributos típicos das empresas, evidencia, segundo os técnicos do Fisco, a melhora do desempenho das companhias, especialmente as não financeiras. Este é um ponto importante para dar sustentação à retomada da economia.
Valor recorde da produção agropecuária
26 de dezembro de 2019 | 03h00
As últimas estimativas do Valor Bruto da Produção Agropecuária (VBP) feitas pelo Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa) dão conta de que está praticamente garantido, em 2019, um novo recorde. A previsão é da criação de um valor de R$ 616,97 bilhões no ano, meio bilhão de reais acima da cifra de 2017, que marcou o recorde anterior. A contribuição das commodities agrícolas, cujas cotações foram muito voláteis, foi menor que a dos itens proteicos, mais demandados no exterior, em especial, pela China.
Os indicadores reforçam a percepção da importância da produção agropecuária para a economia. O porcentual de aumento estimado para o setor pelos técnicos do Mapa – 2,1% entre 2018 e 2019 – é superior aos das previsões para a alta do PIB, de 1,2%.
Em nota técnica do Departamento de Financiamento e Informação, da Secretaria de Política Agrícola do Mapa, as explicações para a alta são claras: “O mercado internacional favorável, onde os preços das carnes, principalmente de frango e de suínos, situaram-se em níveis maiores, e as quantidades exportadas fizeram que os resultados atingissem posições favoráveis ao setor em 2019”. Na pecuária, por exemplo, “apenas o leite teve queda de valor, 2,1%”.
A demanda interna dos itens proteicos costuma ser forte nos fins de ano e já provocou efeitos colaterais. Os preços da carne foram decisivos para a inflação medida tanto pelo IGP-M da Fundação Getúlio Vargas (FGV), que superou 2%, como pelo IPCA-15 do IBGE. O Relatório de Inflação do Banco Central prevê níveis mais elevados de IPCA em dezembro e janeiro, sob influência da elevação dos preços das proteínas.
A situação só não é mais grave para os preços porque há oferta de carnes, graças à produção elevada. Porcentualmente, os maiores crescimentos vieram do valor das safras de frangos (+13,1) e de suínos (+12,5%), mas, em termos relativos, o valor da produção de bovinos é mais importante e deverá atingir R$ 96 bilhões (+5,1%).
Entre os produtos agrícolas, o milho foi decisivo para o aumento do VBP de 2019, mas uma grande contribuição também veio da batata inglesa, da banana, do amendoim, do tomate e da mamona. São bons os auspícios para 2020, quando o crescimento do VBP é estimado em 3%, para R$ 635,2 bilhões.
Está em curso uma leve melhora das contas fiscais
27 de dezembro de 2019 | 04h00
Há uma expectativa favorável quanto ao resultado primário do governo central tanto para o trimestre de dezembro de 2019 a fevereiro de 2020 como para os anos de 2019 e de 2020. É o que mostra o relatório de dezembro Prisma Fiscal da Secretaria de Política Econômica (SPE) do Ministério da Economia, cujos indicadores se baseiam nas expectativas das consultorias econômicas fornecidas ao governo.
Mais importante é o déficit primário do governo central, estimado em média em R$ 7,86 bilhões no mês em curso e inferior em quase R$ 3,5 bilhões aos R$ 11,31 bilhões previstos no Prisma Fiscal do mês passado. Com isso, a estimativa média do déficit primário do governo central deste ano caiu entre novembro e dezembro de R$ 88,7 bilhões para R$ 87,18 bilhões.
A melhora do resultado primário deverá se refletir sobre a dívida bruta do governo geral, reduzida de 78,6% para 78,1% do Produto Interno Bruto (PIB) entre novembro e dezembro. O porcentual continua elevado, mas a tendência de queda é relevante para os investidores internos e externos, pois significa mais segurança para os aplicadores. Graças à evolução positiva da situação fiscal decorrente da recuperação da economia, crescem as expectativas de melhora da nota do Brasil dada pelas agências de classificação de risco.
Previsões mais positivas para este ano aparecem na arrecadação das receitas federais, na receita líquida e na despesa total do governo central. Mas nem todas expectativas para 2020 são favoráveis – caso da arrecadação federal e da receita líquida do governo central.
Por isso, as estimativas de resultado primário do governo central para o ano que vem são piores. Mas, graças à redução dos juros, a dívida bruta do governo geral deverá cair como proporção do PIB, de 79,35% previstos em novembro para 78,75% estimados neste mês.
Os números do Prisma Fiscal de dezembro são indicativos do efeito positivo que a retomada mais acelerada da economia do que se previa já exerce sobre as contas públicas.
Mais importante é que esse efeito poderá persistir ao longo do próximo ano. É o que sugere a última pesquisa Focus do Banco Central, mostrando que o crescimento do PIB deverá aumentar de 1,12% em 2019 para 2,25% em 2020. O desafio das contas fiscais é preservar a melhora no ano – eleitoral – que vem.