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Governo articula empréstimo para socorrer Correios com BB, Caixa e bancos privados

Idiana Tomazelli / FOLHA DE SP

 

CORREIOS AGÊNCIA EM SP

 

O governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) articula com Banco do BrasilCaixa Econômica Federal e bancos privados a concessão de um empréstimo para socorrer os Correios, segundo três pessoas a par do assunto ouvidas pela Folha.

A operação terá garantia do Tesouro Nacional e será atrelada à adoção de medidas de ajuste previstas em um plano de reestruturação da empresa.

Segundo os interlocutores, a empresa precisa de R$ 10 bilhões em 2025 e mais R$ 10 bilhões em 2026, perfazendo um total de R$ 20 bilhões. O dinheiro será usado para capital de giro e também para custear as medidas de ajuste previstas no plano (como demissões voluntárias, mudanças no plano de saúde e renegociação de passivos atrasados, entre outras ações).

O empréstimo em negociação deve cobrir pelo menos os montantes necessários para este ano, mas o valor final da operação ainda está em discussão. A realização de um aporte complementar de recursos pelo Tesouro Nacional não está descartada, mas o tamanho desse repasse será definido de acordo com o espaço fiscal do governo.

A operação de crédito foi discutida em reunião na última quinta-feira (9) entre os ministros Fernando Haddad (Fazenda), Esther Dweck (Gestão), Frederico de Siqueira Filho (Comunicações) e representantes do Tesouro Nacional, da PGFN (Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional), do Banco do Brasil e da Caixa.

Segundo os interlocutores ouvidos pela reportagem, ainda não está fechado qual será a participação de cada banco na operação, que também atrai o apetite de instituições privadas. BTG Pactual, Citibank e ABC Brasil, que já são credores dos Correios em uma operação contratada no primeiro semestre deste ano, participam das conversas.

Os ministérios das Comunicações e da Gestão repassaram os questionamentos aos Correios, que não quiseram se pronunciar. A Fazenda não quis comentar. Banco do Brasil e ABC Brasil disseram não comentar casos específicos. Caixa, BTG Pactual e Citibank não responderam até a publicação deste texto.

As discussões do plano para socorrer os Correios se aceleraram após a troca de comando na empresa, agora chefiada por Emmanoel Schmidt Rondon, funcionário de carreira do Banco do Brasil. Ele é tido como alguém de perfil técnico e focado em gestão. A leitura no governo é de que, com a entrada de Rondon, houve mais espaço e estrutura técnica para levar adiante o plano de recuperação da companhia.

Em situação financeira bastante delicada, os Correios registraram um prejuízo de R$ 2,64 bilhões no segundo trimestre de 2025. O rombo é quase cinco vezes o resultado negativo verificado em igual período de 2024, quando ficou em R$ 553,2 milhões.

No primeiro semestre, o rombo alcançou R$ 4,37 bilhões, o triplo do prejuízo de R$ 1,35 bilhão observado em igual período de 2024. O valor foi antecipado pela coluna Painel, da Folha.

Assim que assumiu o comando da empresa, Rondon teve como primeira missão a renegociação de um empréstimo de R$ 1,8 bilhão contratado pelos Correios neste ano junto a um sindicato de bancos formado por BTG Pactual, Citibank e ABC Brasil —os mesmos que agora devem participar da nova operação. Na época, o objetivo da companhia era dar fôlego ao caixa já debilitado.

O pagamento foi programado em seis parcelas mensais a partir de junho de 2026, mas o contrato original possuía cláusulas restritivas (chamadas de covenants) cujo descumprimento poderia disparar a cobrança antecipada dos valores —entre elas, uma relacionada à ocorrência de eventos com impactos jurídicos ou judiciais.

O forte aumento do custo com sentenças judiciais registrado no segundo trimestre de 2025 serviu de gatilho para o acionamento da cláusula, e os bancos chegaram a reter algumas centenas de milhões que a empresa tinha a receber para quitar parcelas de forma antecipada —o que deixou os Correios, por algumas horas, sem dinheiro suficiente para pagar toda a folha de salários.

A situação deflagrou uma operação emergencial para concluir a renegociação com os bancos, destravar o dinheiro em caixa e assegurar o cumprimento de suas obrigações correntes.

As novas condições do contrato preveem uma taxa de juros maior e pagamento da primeira parcela em janeiro de 2026 —uma antecipação em relação ao prazo original, mas ainda melhor do que o desembolso imediato requerido pelo acionamento da cláusula.

Agora, com a situação de curtíssimo prazo já equacionada, os Correios tentam tirar do papel o plano de reestruturação mais amplo. A avaliação é que, embora haja a necessidade de um gasto maior em 2025 e 2026, a partir de 2027 haverá uma economia significativa de despesas. Hoje, o custo fixo da companhia varia de R$ 20 bilhões a R$ 25 bilhões ao ano, o que dificulta o ajuste em períodos de queda de receitas.

A expectativa dos envolvidos também é de que haja melhora no faturamento a partir da execução do plano, que prevê um reposicionamento da empresa no mercado e a busca por novas fontes de receita.

Colaborou Nathalia Garcia

Desvio de recursos é mais um estrago trazido pelas emendas parlamentares

Por  Editorial / O GLOBO

 

É lamentável que recursos de emendas parlamentares — especialmente as transferências diretas ao caixa de prefeituras, conhecidas como emendas “Pix” — não consigam sequer cumprir o objetivo básico de chegar ao destino. Reportagem do GLOBO refez o trajeto de algumas e mostrou como se perdem pelo caminho.

 

Por vezes, o dinheiro é depositado pelas prefeituras numa conta de passagem, depois transferido a outras, misturando-se a verbas usadas para pagar despesas correntes como água, luz ou folha de servidores. Quando se procura o recurso, sumiu. A sucessão de transferências dificulta o rastreamento.

 

Um exemplo é o que aconteceu no município maranhense de Arari. A estrada de terra de 30 quilômetros que liga a localidade de Canarana ao centro da cidade costuma ficar intransitável no período de chuvas, deixando moradores isolados. Em 2023, uma emenda destinou R$ 1,25 milhão para recuperar estradas vicinais de Arari. O dinheiro saiu, mas não chegou ao destino. “Esse valor simplesmente desapareceu, não foi para obra nenhuma”, afirma a prefeita Maria Alves Muniz (MDB). O prefeito anterior, Rui Filho (União), argumenta que o recurso foi usado no custeio da prefeitura e em ações emergenciais.

 

Arari não é caso isolado. Na paraibana Zabelê, a construção de um parque com ciclovia, pista de corrida, praça de alimentação e espaço para eventos ficou na promessa. Uma emenda de R$ 3 milhões destinada ao município em julho de 2023 deveria garantir a obra. Mas, em fevereiro, a conta em que o valor havia sido depositado tinha apenas R$ 240. Em São Luiz do Anauá (RR), a obra de um pórtico orçado em R$ 2 milhões foi abandonada depois que recursos de uma emenda foram transferidos a outras contas. No mesmo município, um conjunto habitacional com cem casas permanece inacabado, com apenas uma unidade concluída.

 

Inspeções determinadas pelo ministro Flávio Dino, do Supremo Tribunal Federal, mostram que o modus operandi de transferência de recursos a outras contas foi usado em pelo menos 20 municípios nos últimos anos. Em maio, ele proibiu o mecanismo, estabelecendo que o dinheiro seja movimentado só na conta aberta para receber o recurso. No ano passado, determinou um pente-fino nos R$ 20 bilhões enviados desde 2020 em emendas “Pix”.

 

Por mais que o Supremo venha cobrando transparência, não param de surgir escândalos. Operações policiais têm flagrado recursos de emendas escondidos em gavetas, sapatos e até em sacola jogada pela janela. Quanto menor a transparência, maior a chance de a verba se perder. As emendas parlamentares já representam uma distorção no planejamento, por alocar recursos segundo critérios paroquiais, e não técnicos — recebem dinheiro os municípios com melhores padrinhos no Congresso, não necessariamente os mais necessitados. Têm avançado sobre o Orçamento a um patamar sem paralelo no mundo e comprimido os recursos livres à disposição do Executivo. Tudo fica pior quando o dinheiro nem sequer chega ao destino.

 

TCU eleva cobranças ao governo Lula contra manobras fiscais

Idiana Tomazelli / folha de sp

 

TCU (Tribunal de Contas da União) elevou as cobranças contra manobras do governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) para cumprir regras fiscais, com decisões que foram interpretadas por membros do Executivo como um risco até mesmo de reprovação das contas do presidente.

Um de seus posicionamentos mais duros foi o aviso de que a equipe econômica deve perseguir o centro da meta de resultado primário, e não o piso, como vem sendo praticado desde a implementação do novo arcabouço fiscal. Mas esse não foi o único recado recente.

No início de outubro, o plenário da corte de contas decidiu avisar que considera irregular a inclusão de receitas incertas no Orçamento para evitar o congelamento de despesas. Além disso, a área técnica do tribunal já prepara um novo alerta contra a "prática reiterada de exclusão de despesas e/ou renúncias de receitas" para conseguir cumprir a meta fiscal.

Para dois integrantes do governo ouvidos pela Folha sob reserva, as decisões recentes do tribunal são um recado político claro de que o TCU pode recomendar ao Congresso Nacional a reprovação das contas de Lula caso não haja mudanças na condução da política fiscal do governo.

última vez que isso ocorreu foi em 2016, quando as contas de 2015 de Dilma Rousseff (PT) foram reprovadas na esteira das pedaladas fiscais, que envolveram a autorização de gastos sem previsão no Orçamento e o atraso no repasse de recursos a bancos oficiais para o pagamento de benefícios sociais e subsídios.

O grau de sensibilidade do governo a esses recados, no entanto, ainda varia entre órgãos e pessoas. Técnicos que vivenciaram a época do julgamento das pedaladas são os mais cautelosos e defendem a adoção de medidas ainda neste ano para evitar acusações futuras de que os gestores cometeram ilegalidades. Na época, a demora para agir foi entendida como uma continuidade das práticas irregulares e ajudou a fundamentar a reprovação das contas pelo TCU.

Outro grupo acredita na possibilidade de reverter as decisões desfavoráveis do tribunal.

Procurado, o Ministério da Fazenda não se manifestou. O Ministério do Planejamento e Orçamento disse que "sempre observa e cumpre as decisões do TCU". O tribunal afirmou que "se manifesta por meio de seus acórdãos".

No fim de setembro, o plenário do TCU decidiu, de forma unânime, que perseguir o piso inferior da meta de resultado primário é irregular e não condiz com as regras estipuladas na legislação. Para a corte de contas, o correto é buscar o alvo central fixado pelo próprio governo.

A meta fiscal deste ano é de déficit zero, mas a margem de tolerância prevista na lei do arcabouço fiscal permite um resultado negativo de até R$ 31 bilhões. O governo vem perseguindo esse limite inferior e, no último relatório de avaliação do Orçamento, previu um déficit de R$ 30,2 bilhões, ou seja, dentro do intervalo da meta.

O Executivo já avisou que vai pedir reconsideração da decisão. No entanto, se até a divulgação do próximo relatório de avaliação de receitas e despesas (em 22 de novembro) não houver reversão do posicionamento do TCU, técnicos que assessoram a JEO (Junta de Execução Orçamentária) admitem que a recomendação será adotar um congelamento de R$ 30 bilhões para buscar o centro da meta.

Embora o recurso ao TCU tenha o efeito de suspender a decisão do plenário, técnicos lembram que, na época das pedaladas, isso não foi suficiente para blindar gestores que se fiaram nisso para adiar o ajuste nas contas.

Em 2014, o tribunal alertou que as práticas eram irregulares, e um grupo dentro do governo defendeu a correção imediata dos problemas, enquanto outro apostou no efeito suspensivo do recurso.

No fim, a corte de contas não só manteve o entendimento, mas também apontou que o ajuste, feito apenas no fim de 2015, deveria ter acontecido imediatamente após o primeiro aviso. A condenação acabou servindo de fundamento para o impeachment de Dilma em 2016.

É por causa desse retrospecto que parte dos técnicos não quer arriscar ter agora o mesmo desfecho.

Os mais cautelosos também buscam fazer uma leitura mais ampla das posições recentes do TCU e, a partir dela, concluem que o cenário não é favorável.

Críticos avaliam que o tribunal está construindo um palco político para a oposição colocar no governo o carimbo de irregularidade fiscal. Dentro da corte, no entanto, a avaliação tanto de ministros quanto de técnicos é de que o TCU apenas está exercendo seu papel.

Em outra decisão, o plenário resolveu dar ciência ao Ministério da Fazenda de que incluir no PLOA (projeto de Lei Orçamentária Anual) estimativas de receitas frágeis, que envolvam elevado grau de incerteza, viola princípios de prudência e responsabilidade previstos na LRF (Lei de Responsabilidade Fiscal).

O caso concreto era a arrecadação com acordos após julgamentos de disputas tributárias no Carf (Conselho Administrativo de Recursos Fiscais). O governo chegou a contabilizar R$ 56 bilhões em 2024 e R$ 28 bilhões em 2025, mas quase nenhum centavo ingressou efetivamente nos cofres do governo. Enquanto constaram nas estimativas, esses valores ajudaram a mitigar contenções de gastos.

Na linguagem do TCU, "dar ciência" significa informar ao órgão a certeza de que a situação analisada é irregular. Embora não seja uma determinação, isto é, uma ordem direta para o governo adotar determinada conduta, trata-se de uma espécie de aviso de que, se o gestor persistir na irregularidade, isso pode gerar responsabilização no futuro. É um degrau acima do alerta.

O processo que analisou as receitas foi relatado pelo ministro Jorge Oliveira. Ele foi ministro e homem de confiança do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), que o indicou à cadeira no TCU, e será o próximo presidente do tribunal, sucedendo Vital do Rêgo.

Novos alertas ao governo também estão na esteira de julgamentos da corte de contas. No início de setembro, auditores da AudFiscal (unidade responsável por auditorias ligadas às contas públicas) emitiram parecer recomendando alertar o Executivo pela "prática reiterada de exclusão de despesas e/ou renúncias de receitas" para fins de cumprimento da meta fiscal.

Segundo os técnicos, as exceções somam R$ 89,9 bilhões em 2024 e 2025 e contribuem não só para dilapidar a credibilidade das regras, mas também para impulsionar o endividamento do país. O parecer ainda será avaliado pelo relator, ministro Benjamin Zymler —o mesmo autor da decisão sobre o centro da meta fiscal— e levado ao plenário do tribunal.

TCU FEZ AUDITORIA EM RECEITAS

Fazer oposição não é traição

Dora Kramer / Jornalista e comentarista de política / FOLHA DE SP

 

Ninguém precisa ensinar a Luiz Inácio da Silva (PT), presidente três vezes, que governar é uma coisa e fazer campanha é outra, embora ele insista em exercer as duas atividades como se fossem a mesma coisa.

Ele se vale de dois fatores: a habilidade de candidato e a benevolência mais ou menos geral decorrente da memória do mito do operário que virou chefe da nação. Mas há momentos, e este está com jeito de ser agora, em que é preciso fazer escolhas.

Governistas dizem nos bastidores que, depois da derrota da semana passada na Câmara, Lula quer recompor a base de apoio parlamentar. Ao mesmo tempo, presidente e ministro da Fazenda vão aos microfones praticamente chamar os congressistas de traidores da pátria.

Pois tem algo de paradoxal aí. Ou bem o presidente pretende reatar relações produtivas com os parlamentares ou o candidato segue a estratégia de tratá-los como adversários para ganhar pontos com a população corretamente irritada com condutas e decisões inaceitáveis num Legislativo que se preze.

A derrubada de uma MP além de não ser fato inédito é prerrogativa assegurada na Constituição. No caso específico, o governo já havia sido avisado de que aumento de impostos não passaria no Congresso. Isso foi desenhado em junho, na recusa do decreto de novas alíquotas para o IOF.

Presidente Lula e ministro Fernando Haddad (PT) trataram a questão como crime de lesa-pátria. Na visão deles, a oposição inviabiliza o país por razões político-eleitorais.

Ninguém precisa ensinar ao PT o que é fazer oposição. Mas é bom recordar que a derrota dita lesiva foi sobre uma MP, enquanto os petistas, se maioria fossem há mais de 30 anos, o Plano Real teria sido rejeitado. Votaram contra, assim como fizeram com a privatização das telecomunicações. Só para citar dois pontos que de fato prejudicariam o Brasil, se prevalecesse a ótica do atraso.

Mas, tudo bem, assim é. Portanto, o governo não pode sonhar com a unanimidade e reverência de todos porque isso não é do embate democrático.

A um mês da COP30, confira os desafios do Brasil para liderar a agenda climática

ISTOÉ COM AGENCIA BRASIL

 

Dentro de exatamente um mês, grande parte dos olhos do mundo estarão voltados para a região Norte do Brasil, mais especificamente a região amazônica. Em 10 de novembro, começará a 30ª Conferência das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (COP30), em Belém. 

 

O encontro internacional na capital paraense seguirá até o dia 21. São esperadas delegações de governos e organizações da sociedade civil de todas as partes do planeta para buscar soluções para o aquecimento global e a mudança climática. Enquanto a cidade faz ajustes de infraestrutura, logística e acomodações, especialistas e negociadores brasileiros se esforçam para chegar a consensos que ajudem a salvar o planeta e os povos.

Negociações

Na última semana, o secretário Nacional de Mudança do Clima do Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima, Aloisio Lopes de Melo, uma das principais autoridades do governo brasileiro no tema, traçou os principais desafios e assuntos de interesse do Brasil, país que ocupa a presidência da COP30.

Ele participou de um encontro com representantes de instituições científicas, na sede da Financiadora de Estudos e Projetos (Finep), no Rio de Janeiro. “É uma responsabilidade enorme do governo brasileiro ser a presidência nesse momento tão crítico”, ressaltou.

 

Na ocasião, os especialistas participantes do encontro pediram mais poder de decisão da ciência na COP30Aloisio Melo é uma das vozes que participam da elaboração do Plano Clima, a política nacional para enfrentamento das mudanças climáticas, com ações previstas entre 2024 e 2035. Com base na apresentação do secretário nacional, a Agência Brasil elaborou um guia sobre os principais desafios da presidência brasileira da COP30.

 

Multilateralismo

Na avaliação do secretário, o Brasil ocupa a presidência do encontro em um contexto “bastante complexo”, com conflitos políticos e bélicos, fazendo com que o primeiro desafio seja o fortalecimento do multilateralismo. “O primeiro desafio é a necessidade de afirmar esse arcabouço multilateral como necessário, fundamental e efetivo para enfrentar a mudança do clima”, afirma ele, se referindo a protocolos como o Acordo de Paris, que limita o aumento da temperatura a 1,5° Celsius (C) acima dos níveis pré-industriais.

“Tem que mostrar que é necessário, para uma ação de enfrentamento da mudança do clima, um esforço coordenado internacionalmente”, diz Melo. “Tem um bombardeio ao sistema multilateral, e essa COP tem que mostrar que esse sistema é capaz de dar resposta e de mostrar ação”, completa.

Ambição dos países

Outro desafio e a ambição dos países. Segundo ele, a base do Acordo de Paris é de países apresentando suas contribuições voluntárias para manter a trajetória de limitar o aumento de 1,5° C. “Isso depende de que os países apresentem seus compromissos e, depois, que esses compromissos sejam suficientes para nos conduzir a essa trajetória”.

 

Melo aponta que cerca de 50 nações entregaram Contribuição Nacionalmente Determinada (NDC, na sigla em inglês) e aproximadamente 100 não o fizeram, mas apresentaram compromissos.

 

No início deste ano, o Acordo de Paris sofreu um revés, com o anúncio do então recém-empossado presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, de que deixaria o tratado internacional.

 

Por outro lado, o Brasil revisou a Política Nacional sobre Mudança do Clima para alinhar compromissos ao Acordo de Paris e avançar rumo a emissões líquidas (diferença entre emissão e captura) de gases do efeito estufa zero até 2050.

 

Setor privado

O secretário nacional destaca que, no setor privado, a inovação em torno da descarbonização já é um direcionador assumido em várias indústrias e setores.

“As métricas estão claras, as estratégias e a agenda tecnológica estão bastantes definidas”.

Segundo ele, esse encontro de mundos público e privado mostra que os entes estão em movimento.

Financiamento

Mais um desafio é o financiamento, que enfrenta a necessidade de mobilizar US$ 1,3 trilhão até 2035. “São números bastante astronômicos”.

Aloisio Melo diz que “muita gente” está trabalhando nessa busca, e cita conversas que envolvem o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, e ministros da pasta de outros países.

“Mas tem uma pergunta a se fazer: qual desse montante é o valor que vai ser destinado à agenda de pesquisa, desenvolvimento, inovação e implementação, ajudar os países, em especial os em desenvolvimento, a implementar efetivamente as medidas?”, questiona.

Adaptação

O secretário nacional considera que a COP30 terá o marco de “falar seriamente” sobre adaptação. “A presidência colocou isso com agenda prioritária”.

“É uma agenda muito densa em informação, conhecimento”, diz o secretário, acrescentando que a adaptação é uma prioridade também do Plano Clima brasileiro. Ele espera que a COP consiga aprovar um marco de indicadores de adaptação.

Aloisio Melo destacou que a equipe brasileira fez parte do grupo internacional que elencou a proposta de 100 indicadores globais de adaptação que deverá ser validada. “Vai ser referência para os países a partir de agora, se for aprovada”.

 

Transição justa

O secretário classifica a transição energética como um dos temas mais sensíveis e complexos da COP30. Ele lembra que está acordado entre os países o afastamento dos combustíveis fósseis, triplicar o uso de energias renováveis globalmente e duplicar a eficiência energética.

“A nossa perspectiva do MMA é que essa COP tem que criar o caminho para que os países definam claramente qual é o passo a passo para chegar a zero ou ao mínimo possível de uso de combustíveis fósseis”.

Aloisio pede que um acordo internacional tenha indicadores para endereçar questões socioeconômicas e fiscais relevantes.

“Países produtores, como nós, somos dependentes dessa receita, do ponto de vista para fechar conta de governo, tem impacto macroeconômico, tem impacto distributivo”, pondera.

Mas Melo é taxativo: “se não endereçarmos isso, que são 70% das emissões globais, a gente não está falando seriamente de enfrentar a mudança do clima”.

 

Desmatamento

Um tema que terá atenção na COP30 é a questão do desmatamento e degradação florestal. Melo cita o Fundo Tropical das Florestas (TFFF), uma espécie de recompensa para países que preservam suas florestas tropicais. “A gente vai ser aportador nesse fundo”.

 

Oceano

O secretário Nacional de Mudança do Clima chama atenção ainda para novos conhecimentos que precisam ser adquiridos. Ele cita o exemplo dos oceanos.

“O tema dos oceanos ganhou muita relevância ao longo do tempo, inclusive do ponto de vista da ação climática”, diz. “Mas, certamente, ainda há muitas demandas para entender melhor a interação entre oceano e clima, o que está ocorrendo com o oceano, e entender melhor os potenciais impactos para o sistema climático, mas também para os sistemas humanos”, completa.

Teatrinho

Por Notas & Informações / O ESTADÃO DE SP

 

O governo negociou até o último minuto, mas não conseguiu convencer a Câmara a aprovar a medida provisória (MP) que tributava títulos isentos e aumentava a taxação das bets. Editada para sustentar um Orçamento absolutamente fictício, a MP perdeu validade após um requerimento de retirada de pauta ser aprovado por 251 votos a 193.

 

Foi, certamente, uma derrota da equipe econômica, mas nem mesmo o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, parece estar muito preocupado com o que terá de fazer para salvar a meta fiscal. Afinal, na tentativa de aprovar a MP, o governo já havia aceitado ceder muito mais do que deveria e esvaziado a capacidade de arrecadação da proposta.

 

Já na semana passada, o relator da MP, deputado Carlos Zarattini (PT-SP), sinalizou que o governo aceitaria manter a isenção das Letras de Crédito Imobiliário (LCI) e do Agronegócio (LCA). Um dia antes da votação, ele retirou também o dispositivo que aumentava a tributação sobre as apostas esportivas de 12% para 18%.

 

Se o problema da medida provisória fosse realmente de mérito, esses gestos teriam sido mais que suficientes para garantir a aprovação do texto. Afinal, as principais demandas dos parlamentares das bancadas ruralista e das bets haviam sido plenamente atendidas.

 

A questão de fundo, no entanto, não era econômica. Depois da aprovação da isenção do Imposto de Renda para quem ganha até R$ 5 mil por mês e da taxação da alta renda por unanimidade e da mobilização nas ruas contra a anistia aos golpistas e a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) da Blindagem, a Câmara precisava urgentemente mudar de assunto e mostrar alguma força ante um governo cuja popularidade começou a se recuperar.

 

Mas a campanha eleitoral está em pleno curso, como evidencia a atuação do governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas, para a derrubada da MP. Embora insista que disputará a reeleição e negue ter a intenção de disputar a Presidência da República, Tarcísio se envolveu pessoalmente nas articulações contra o texto e persuadiu o Centrão a quebrar o acordo que havia firmado com o governo.

Oficialmente, os parlamentares que votaram contra a MP retomaram o discurso segundo o qual a sociedade não aguenta mais aumento de impostos. Nos bastidores, a intenção era simplesmente frear o Executivo, que já recorreu a várias medidas eleitoreiras para recuperar a popularidade e não esconde ter um arsenal em mãos para lançar até o ano que vem.

 

O governo não acusou o golpe, mas estava em uma situação relativamente confortável. Se a aprovação da MP era benéfica, a derrota também lhe servia bem. De um lado, Lula continuará a posar como defensor da justiça social e a investir na narrativa que opõe ricos e pobres. De outro, o Executivo não hesitará em retaliar o Congresso por meio do contingenciamento de emendas parlamentares.

 

Haddad ainda terá de encontrar formas de repor a arrecadação e cobrir um buraco de R$ 35 bilhões no Orçamento do ano que vem, mas mudar a meta fiscal está fora de cogitação. Lula já disse para o ministro relaxar. Se o chefe não está angustiado, por que Haddad deveria estar?

 

A peça orçamentária tende a ser tão ficcional quanto a deste ano, e nem por isso alguma despesa deixou de ser realizada. Com a derrota da MP, a agenda do governo no Congresso está praticamente encerrada. Ninguém, a esta altura, acredita que os parlamentares aprovarão o corte linear de 10% nos benefícios fiscais, mas o Congresso ainda terá de aprovar o Orçamento se quiser executar ao menos parte de suas emendas antes da eleição.

 

O motivo central do desequilíbrio fiscal segue o mesmo. Não será por meio de medidas para aumentar o Imposto sobre Operações Financeiras (IOF), acabar com a isenção da LCI e da LCA ou elevar a tributação sobre as bets e as fintechs que o problema será resolvido.

 

Fato é que as despesas crescem em um ritmo maior que o das receitas e o País terá de encarar essa questão em algum momento. Por enquanto, nem o governo, nem a oposição, nem o Congresso e muito menos o Judiciário parecem interessados em resolvê-lo.

Lula e PT reacendem mote de campanha contra Congresso e ricos após derrota na Câmara

Ranier BragonCarolina Linhares / FOLHA DE SP

 

Seguindo a mesma ação adotada após a derrota de junho na tentativa de aumentar o IOF, o presidente Lula e a esquerda partiram para o ataque após a Câmara dos Deputados barrar nesta quarta-feira (8) a medida provisória de aumento de impostos.

Tendo como fio condutor o discurso de ricos contra pobres, as redes sociais governistas foram inundadas nesta quinta (9) com os motes "Congresso inimigo do povo" e "taxação BBB", em referência a bancos, bets e bilionários, na tentativa de carimbar o centrão e a oposição como defensores de milionários e de privilégios em detrimento da população de baixa renda.

A oposição reagiu também em tom de campanha, dizendo que o Brasil não aguenta mais imposto. Segundo esse discurso, o governo fecha os olhos para corte de gastos e busca encher o cofre em ano eleitoral tirando do bolso da população.

Lula disse em suas redes sociais ainda na quarta, logo após o resultado na Câmara, que os parlamentares jogavam contra o Brasil. Na manhã desta quinta (9), em entrevista à Rádio Piatã FM, da Bahia, voltou à carga.

"Eu fico triste, muito triste, porque ontem o Congresso Nacional poderia ter aprovado para que os ricos pagassem um pouco mais de imposto", disse o presidente.

"É engraçado porque o povo trabalhador paga 27,5% de Imposto de Renda do seu salário e os ricos não querem pagar 12%. Eles acham que ontem, 'ah, derrotamos o governo'. Não derrotaram o governo, derrotaram o povo brasileiro, derrotaram a possibilidade de melhorar a qualidade de vida do povo brasileiro tirando mais dinheiro dos ricos e distribuindo para os os pobres."

Em grupos de WhatsApp governistas e nas redes sociais, vídeos feitos com inteligência artificial voltaram a carimbar o centrão e a oposição como defensores de privilégios de bilionários

O principal alvo foi Tarcísio de Freitas (Republicanos), hoje principal nome cotado para concorrer com Lula em 2026 e apontado pelo PT e por governistas como um dos principais fiadores da derrota aplicada ao governo na Câmara. Tarcísio nega, embora o líder do PL, Sóstenes Cavalcante (RJ), tenha, na tribuna, agradecido ao empenho do governador de São Paulo.

Em um dos vídeos, um homem de terno e gravata oferece um brinde em um ambiente luxuoso, dizendo que gostaria de agradecer aos bolsonaristas e ao governador de São Paulo. "Finalmente só o pobre vai pagar imposto, viva as bets, os bancos e os bilionários."

Em outro, uma mulher criada com inteligência artificial diz: "Está ouvindo o barulho das garrafas de champagne estourando? As bets, os banqueiros e os bilionários estão fazendo a festa". Outra completa: "Deputados bolsonaristas e o centrão acabaram de tirar R$ 35 bilhões dos cofres públicos".

"Com essa votação não tem jeito. O Congresso abraça, definitivamente, o título de 'Congresso inimigo do povo'," disse o líder da bancada do PT na Câmara, Lindbergh Farias (RJ), em postagem nas suas redes sociais.

A ministra Gleisi Hoffmann, que chefia a articulação política de Lula, também foi à internet escrever: "O que Tarcísio quer esconder é que ele é o candidato dos bilionários, das bets e dos golpistas."

Tarcísio postou vídeo nesta quinta para responder às críticas e negar participação na derrota do governo.

"A estratégia do PT sempre foi essa: vender um mundo perfeito na publicidade, gastando o seu dinheiro para isso, para espalhar fake news, o medo, o ódio, em cima de quem pensa diferente deles", disse o governador, afirmando que estava interrompendo o trabalho em São Paulo e fazendo a declaração apenas porque "paciência tem limite".

"Agora o PT quer me acusar de ter trabalhado para evitar que o governo cobre mais impostos da população. Estou trabalhando por São Paulo, para mudar a vida das pessoas, para fazer a diferença. [...] Ficar jogando uns contra os outros de forma absurda e querer que a população apoie aumento de impostos, ninguém, nem eu nem o país, vai apoiar."

O governador Ronaldo Caiado (União Brasil-GO), outro dos pré-candidatos à Presidência da oposição, também criticou a MP de Lula e defendeu sua rejeição em postagem na internet. "Atenção, deputados: votar a favor da MP 1303 é votar para aumentar impostos e dar um presente de R$ 30 bilhões para o governo Lula torrar em 2026".

Nos bastidores, parlamentares governistas dizem que o resultado desta quarta no plenário da Câmara reforçou ao governo Lula a oportunidade de ganhar a opinião pública com as campanhas.

recente onda de maré positiva no governo Lula começou justamente após a derrubada pelo Congresso de decretos que aumentava o IOF, em junho.

O PT começou a patrocinar nas redes uma forte ofensiva com o mote ricos versus pobres, com vídeos produzidos por inteligência artificial e que tiveram como alvo o Congresso, o centrão e a oposição. A iniciativa bem-sucedida tirou o governo das cordas pela primeira vez nas redes sociais, colocando na defensiva o mote da oposição, o de que "ninguém aguenta mais imposto".

Apesar da ofensiva desta quinta, congressistas questionam o alcance dessa propaganda e sua eficácia em furar a bolha da esquerda. Além disso, veem risco de piora na relação de Lula com o Congresso já que a campanha contra os deputados atinge também o presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), que tem demonstrado certa aproximação com o governo.

Depois do desgaste com a PEC da Blindagem e as manifestações de rua, Motta vinha num esforço, que incluiu uma série de entrevistas, de melhorar a imagem da Câmara, ressaltando a aprovação de pautas de segurança pública e a isenção do Imposto de Renda.

Parlamentares dizem ainda que foi um erro do PT retirar da MP a taxação das bets, decisão que petistas atribuem ao forte lobby do setor e à tentativa de obter um acordo. Para eles, essa alteração no texto do relator Carlos Zarattini (PT-SP) rachou a base governista e enfraqueceu o discurso de que a oposição é que age para privilegiar esse setor.

É esperado que o centrão volte a retaliar o governo em novas votações e, por isso, governistas afirmam que o Palácio do Planalto deve acionar o Congresso o mínimo possível.

Como resposta mais prática e imediata, deputados do PT defendem que o governo mapeie e exonere cargos ligados a parlamentares que têm votado contra Lula. Dizem esperar ainda que o ministro da Fazenda, Fernando Haddad (PT), apresente alternativas para recuperar a arrecadação prevista com a medida.

 

LULA E TARCISIO EM POSTS

 

Plano do governo Lula sobre clima desagrada agronegócio e cria tensão às vésperas da COP-30

Por Paula Ferreira / O ESTAEÃO DE SP

 

 

BRASÍLIA - Uma versão do Plano Clima para a Agricultura e a Pecuária elaborada pelo governo Luiz Inácio Lula da Silva desagradou o setor às vésperas da COP-30, conferência das Nações Unidas que discutirá em Belém soluções para o aquecimento global. A série de documentos, liderada pelo Ministério do Meio Ambiente, prevê estratégias para cortar emissões de gases de efeito estufa para cada setor econômico.

 

Representantes do agronegócio, um dos principais motores da economia nacional, contestam os cálculos sobre a contribuição do setor para a poluição atmosférica. Veem ainda risco de prejuízo à imagem internacional do segmento, frequentemente alvo de críticas de produtores europeus. Já ambientalistas apontam a necessidade de engajamento do setor, diante da alta de emissões do metano, o segundo principal gás causador da crise climática, e do desmatamento para criação de pastagem em biomas como Amazônia e Cerrado.

 

À reportagem, a pasta do Meio Ambiente diz trabalhar na revisão dos cálculos. Segundo o Estadão apurou, o governo já prevê reduzir em cerca de 30% o volume de emissões atribuídas ao agronegócio. Procurado, o Ministério da Agricultura não falou. O governo federal fixou a meta de cortar em 67% as emissões de gases estufa em 2035, na comparação com os níveis de 2005, o que exigirá esforços de todos os setores. Por isso, elabora o Plano Clima para diversas áreas.

A versão preliminar do documento, alvo de críticas, prevê que a agropecuária reduza suas emissões em 36% até 2030 e até 54% para 2035. O modelo de cálculo para a meta é uma das principais críticas do agro.

 

O Plano Clima fixa em 813 MtCO₂ (toneladas de CO₂ equivalente, que é uma média de gases estufa) a quantidade de emissões sob responsabilidade do agronegócio, o que é contestado pelo setor.

 

A crítica está no fato de o plano incluir na conta desmates em assentamentos da reforma agrária e comunidades tradicionais. Também diz que são ignoradas remoções de gás carbônico em territórios protegidos em imóveis privados, como Reserva Legal (RL) e Área de Preservação Permanente (APP), e de mitigação por uso de bioinssumos e tecnologias de agricultura de baixo carbono. Com isso, a agropecuária passa de segunda para principal emissora de gases estufa no Brasil, responsável por 70% das emissões.

 

No dia 24, a Sociedade Rural Brasileira (SRB) pediu, em nota, que o plano seja revisto e apresentado só após a COP-30. O governo, porém, descarta por ora a possibilidade de atender ao pleito, uma vez que o País quer ir à conferência com trabalho realizado. A SRB argumenta que o documento pode prejudicar o setor no mercado global. Uma das preocupações é com o mercado europeu, que tem aumentado exigências ambientais para produtos comercializados com o bloco.

 

“O Plano Clima precisa ser pautado em consenso técnico, clareza metodológica e alinhamento político para assegurar sua efetividade e proteger a competitividade do agro brasileiro nos mercados globais”, disse na nota Sérgio Bortolozzo, presidente da SRB. Em entrevista ao Estadão/Broadcast no dia 26, o vice-presidente da Confederação de Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), Muni Lourenço, reforçou o pedido de revisão. Segundo ele, o plano traz “condições que limitarão o desenvolvimento do agro brasileiro”.

 

A avaliação da CNA é de que o plano afeta a imagem setor na COP-30. O ponto mais crítico para a entidade é a alocação do desmatamento legal e ilegal como responsabilidade do agronegócio, ou seja, no balanço de emissões do setor.

O agronegócio pede a revisão da metodologia por considerar que a gestão do desmate é de responsabilidade do governo, o que tem apoio do Ministério da Agricultura.

Conforme o Código Florestal, além das APPs, é obrigação do proprietário preservar um porcentual de 20% da propriedade para reserva legal, no caso do Cerrado, e 80% na Amazônia. Em áreas de transição de um bioma para o outro, o porcentual é de 35%. Para ambientalistas, o mero cumprimento da lei não deve entrar na conta de remoções do agronegócio.

 

Para a advogada Andreia Bonzo, uma das líderes do tema de Clima na Coalizão Brasil, o plano coloca o agro como vilão e não como parte da solução, o que é prejudicial. Ela opina que é preciso rever o cálculo e considerar as remoções de gases por meio de áreas preservadas.

“Se continuar com a narrativa de vilanização do agro, não consegue dar mais força para o agro verde, sustentável”, analisa.

Reação tardia

Após a repercussão no setor, o Ministério da Agricultura enviou à pasta do Meio Ambiente nota técnica em conjunto com a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) defendendo alterar o plano. Segundo o texto, a abordagem usada diverge do padrão previsto pelo Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas (IPCC), da ONU.

 

A Agricultura defendeu excluir da conta do agro emissões geradas por assentamentos e comunidades tradicionais, “prevenindo, assim, danos à imagem internacional dos produtos brasileiros e potenciais barreiras comerciais.” A pasta pediu ainda exclusão de emissões ligadas ao uso de combustíveis fósseis na produção.

A reação gerou desconforto dentro do governo, uma vez que o Ministério de Agricultura participou da confecção do plano que foi para consulta pública. Nos bastidores, a avaliação foi de que após as críticas do setor, a pasta tentou jogar o desgaste no colo do Meio Ambiente, embora tenha participado da discussão desde o início.

 

Em meio à repercussão, a pasta da Agricultura passou a atuar internamente para que a proposta inclua remoções de carbono da atmosfera em áreas preservadas pelo setor. A pasta não respondeu aos questionamentos da reportagem.

 

O Observatório do Clima, que reúne mais de 130 organizações da sociedade civil, enviou a carta ao Ministério do Meio Ambiente no dia 24 dizendo que o agro quer “comprometer a integridade das metas nacionais de redução de emissões do Plano Clima”. A entidade pede que o governo endureça os critérios para que o setor contribua com a estratégia por meio da redução do desmatamento legal.

 

Na carta, defende que a contagem de remoções do agro considere a preservação só nos casos em que as propriedades preservem mais do que é exigido pelo Código Florestal, ou seja, reduzindo o desmate legal.

Dados compilados pelo MapBiomas mostram que entre 1985 e 2024 o Brasil perdeu 111,7 milhões de hectares em áreas naturais. O tamanho é maior do que o território da Bolívia. Ao mesmo tempo, a agropecuária se expandiu pelo País, de modo que o porcentual de municípios cuja maior parte do território é ocupada pela atividade saltou de 47% para 59%.

 

Na Amazônia no ano passado, apenas 2% da vegetação nativa era secundária, ou seja, de áreas que foram desmatadas e que agora estão em processo de regeneração.

 

“Já que as florestas desmatadas para fazer pasto continuam sendo pasto depois de 40 anos, é obvio que estão sendo usadas para a agropecuária”, diz o coordenador de Política Internacional do Observatório do Clima, Claudio Angelo. Ele afirma que o setor tem práticas positivas, como remoções de carbono do solo por meio do manejo de pastagem, a serem consideradas. Mas rebate a defesa do agro de que a preservação de áreas protegidas por lei tenha que ser contabilizada.

 

“Se quiser entrar num esquema de pagamento por serviços ambientais, precisa zerar o seu desmatamento legal, porque aí abre mão do custo de oportunidade da terra para manter aquela floresta”, diz.

 

Governo deve rever pontos

O Plano Clima está passando por revisão do Ministério do Meio Ambiente e atenderá parte das reivindicações feitas pelo setor agropecuário. O Estadão apurou que as críticas feitas pelo OC ainda não foram objeto de análise.

 

Segundo o secretário Nacional de Mudança do Clima da pasta, Aloísio Lopes de Melo, o governo está sistematizando bases de dados do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), do Cadastro Ambiental Rural e do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) para excluir da conta do agro áreas de assentamento e territórios quilombolas.

 

“Dá para ter visão clara do que são assentamentos rurais, que têm participação importante, de fato, em termos de emissões e de desmatamento. Também dá para segregar territórios quilombolas, mas aí as áreas são menores com desmatamento é menor”, afirmou Melo ao Estadão. No dia 30, foi apresentada proposta ao setor em reunião. Segundo a diretora executiva de Inovação, Negócios e Transferência de Tecnologia da Embrapa, Ana Euler, a mudança reduz as emissões para o agro.

 

“Da primeira versão apresentada para a versão atual, há redução de 30% das alocações das emissões de gases ligados ao efeito estufa ao setor”, afirmou Euler, ao Broadcast/Estadão.

 

Fontes da área ambiental do governo afirmam que apesar da revisão da proposta, a situação ainda não está pacificada. Com o impasse, o tema será discutido em reunião na Casa Civil para que a pasta bata o martelo sobre o modelo.

Remoções

Em relação à contabilização de remoções, o secretário Aloísio Melo diz que considera “pertinente” a reivindicação do agro e que há trabalho em curso sobre a metodologia, mas que não é uma resposta que venha “de hoje para amanhã”.

 

Ele afirma que a reformulação está passando por escrutínio de especialistas e sob comando do Ministério da Ciência. “A gente quer que todos os esforços sejam refletidos e capturados da melhor forma possível, com a melhor informação e ciência disponível.”

 

Segundo ele, as críticas serão levadas em consideração para pactuação de novo texto dentro do governo. “É um setor muito relevante para a economia do País e que tem de ter endereçamento, considerar seriamente as questões levantadas”, disse.

 

O secretário afirma que a intenção é aparar as arestas para que haja discurso uníssono na COP-30./COLABOROU ISADORA DUARTE, DO AGRO BROADCAST

 

gado

Acusado de atuar contra MP dos impostos, Tarcísio faz ataque mais duro a Haddad e diz que PT mente

Bruno Ribeiro / FOLHA DE SP

 

O governador Tarcísio de Freitas (Republicanos) fez seu mais duro ataque direto ao ministro da Fazenda, Fernando Haddad (PT), ao se defender de críticas após ser apontado como um dos principais articuladores da derrubada da MP (medida provisória) que aumentava impostos.

Em vídeo nas redes sociais, além de acusar o PT de praticar ofensas e mentiras, ele disse: "Tenha vergonha, Haddad, respeite os brasileiros." A assessoria do ministro informou que ele não iria comentar. O ministro havia dito que o governador defendeu a derrubada da medida para "proteger a Faria Lima".

O vídeo foi gravado durante visita do governador à fábrica da Toyota, em Porto Feliz, no interior do estado, na manhã desta quinta (9), pouco após a declaração do ministro. O governador havia ido vistoriar a fábrica, danificada por uma tempestade no mês passado. Tarcísio fez o registro com a equipe de redes sociais que o acompanha diariamente.

Na véspera, Tarcísio negou à Folha que tivesse articulado a derrubada da MP. Contudo, à noite, quando o governo foi derrotado, o líder do PL na Câmara, Sóstenes Cavalcanti (PL-RJ), agradeceu o empenho dele e de outros governadores pelo resultado.

A seus auxiliares, segundo a reportagem apurou, Tarcísio repetiu que não telefonou a lideranças partidárias pedindo a derrubada da MP. O líder do PL teria conversado com ele e dito a Tarcísio que se empolgou no momento da vitória, de acordo com a versão que circula no Palácio dos Bandeirantes — a reportagem não conseguiu falar com Sóstenes.

A gravação de Tarcísio, que começa com ele dizendo que "paciência tem limite", foi feita um dia depois de ele publicar um vídeo pedindo desculpas à população por causa de uma fala feita por ele durante uma entrevista coletiva que repercutiu mal e foi explorada nas redes sociais pela esquerda.

Na ocasião, ele disse que passaria a se preocupar com a crise da contaminação de bebidas alcoólicas por metanol quando ela atingisse também a Coca-Cola, sua bebida preferida.

Segundo a Folha apurou, desde a semana passada o governador havia subido o tom das críticas ao PT no que seria uma reação pela forma como o tema das bebidas foi abordado.

Em uma entrevista coletiva no começo da crise, ele disse que não havia indícios de participação do "crime organizado" na adulteração de bebidas. Mas o Ministério da Justiça informou que investigava indícios de que o metanol que foi parar no álcool consumido pela população pudesse ter sido importado pelo PCC (Primeiro Comando da Capital).

A interlocutores, em conversas recentes, ele relembrou atritos recentes e informações desencontradas no episódio das desapropriações da favela do Moinho, no centro da capital, quando petistas fizeram uma série de críticas à condução do caso pelo governo paulista.

"Há meses a gente vem sendo alvo de uma ampla campanha de desconstrução de imagem e reputação por parte do PT. Ofensas, mentiras nas redes sociais — tudo certo, nada diferente do que a gente sempre viu no PT", disse no vídeo.

"A estratégia do PT sempre foi essa: vender o mundo perfeito na publicidade, gastando seu dinheiro para isso, e espalhar também o medo e o ódio contra quem pensa diferente deles", complementou.

Tarcísio tem demonstrado mais impaciência ao reafirmar que seu plano é tentar a reeleição em São Paulo no ano que vem, embora siga sendo considerado o principal nome da oposição para concorrer à Presidência contra Lula (PT). Horas antes de gravar o vídeo, uma nova pesquisa Quest/Genial apontou que a aprovação do petista segue em tendência de alta iniciada em julho e que o petista venceria ele e os demais potenciais adversários no segundo turno.

Na campanha de 2022, quando concorreu ao governo contra Haddad, Tarcísio havia feito críticas ao rival, a quem chamou de "pior prefeito da história de São Paulo". Após a posse, contudo, a relação por um período foi de cordialidade, e eles chegaram a trabalhar juntos pela reforma tributária.

À noite, perfil do PT nas redes sociais divulgaram um vídeo em que, sem citar Tarcísio, Haddad diz que a MP "buscava garantir investimentos em saúde, educação e previdência, cobrando uma contribuição justa dos super-ricos" e que a oposição defendeu "bilionários, bancos e bets" --atacar o grupo é parte da estratégia de comunicação do partido.TARCISIO NA FABRICA DA TOYOTA

Uma derrota anunciada

Dora Kramer / Jornalista e comentarista de política / FOLHA DE SP

 

A derrubada da medida provisória alternativa ao aumento do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) era uma fava contada. Surpreendente foi o governo acreditar que pudesse ganhar.

Os sinais da derrota estavam à vista de todos. A começar pelo aviso dado meses atrás de que o Congresso não aprovaria mais nada que implicasse novas cobranças de tributos. Tanto que em junho invalidou o decreto de aumento do IOF, depois parcialmente recuperado no Supremo Tribunal Federal.

Na retomada do tema, a recusa ficou demonstrada na demora do exame da MP, deixado para o último dia do prazo legal. Na véspera, a medida passou raspando pela comissão especial mista, com a irrisória vantagem de um voto.

A cigana, portanto, não enganou ninguém. Foi o Palácio do Planalto que se deixou enganar, talvez pela suposição de que o bom momento do governo fizesse a oposição mudar de ideia, diante da significativa recuperação da popularidade do presidente da República, registrada na pesquisa Genial/Quaest divulgada na manhã de quarta-feira (8).

Em reação à derrota, o governo ameaça suspender a liberação de emendas parlamentares e apresentar novas medidas para assegurar o aumento de arrecadação.

Vai entrar numa nova queda de braço perdida, mas é do jogo de quem optou desde o início por uma política fiscal de muitos gastos e poucos cortes.

Temerária, contudo, é outra parte da resposta: a tentativa de jogar o Congresso contra a população, dizendo, como fez o presidente Lula (PT), que a recusa da proposta é uma ação contra o país. Com isso, enveredou pelo perigoso terreno da antipolítica, no qual viceja o populismo.

A expressão da vontade da maioria do Parlamento é prerrogativa do colegiado, não uma ação de lesa-pátria a ser assim considerada quando o governo de turno sofre uma derrota.

O repúdio a mais medidas de arrecadação estava posto lá atrás e foi feito com clareza. Portanto, a insistência revelou-se no mínimo imprudente e as reclamações posteriores, improcedentes.

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