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Uma pequena revolução - o Estado de SP

O fim da possibilidade de coligação nas eleições proporcionais, medida legislativa que entra em vigor no pleito deste ano, tem o potencial de deflagrar uma pequena revolução no sistema de representação no País.

Até a eleição de 2018, os partidos podiam coligar-se para a disputa de eleições proporcionais. Com isso, legendas minúsculas e com insignificante capacidade de representação tinham a possibilidade de herdar votos dados à coligação, graças aos chamados “puxadores de votos”, e eleger candidatos que, de outra forma, não teriam a menor chance de chegar ao Legislativo.

Esse fenômeno teratológico permitia que o voto dado pelo eleitor em um candidato elegesse outro, muitas vezes de orientação ideológica e propostas totalmente distintas. Também sustentava partidos cuja existência em si mesma desmoraliza a política, por se tratar de empreendimentos pessoais de políticos oportunistas, que os alugavam a esta ou àquela candidatura para ampliar o tempo de TV da coligação.

Isso acabou neste ano porque agora os partidos, nas eleições proporcionais, devem fazer campanha para si mesmos, sem pegar carona em legendas maiores ou coligar-se com outros partidos menores. Conforme a legislação aprovada em 2017, cada partido deve lançar seus próprios candidatos a vereador.

Assim, em cidades pequenas, cujas Câmaras têm até dez vereadores, a probabilidade é que somente dois ou três partidos consigam eleger representantes. Dessa forma, haverá um enxugamento progressivo do quadro partidário no nível municipal. A tendência é que a representatividade das legendas remanescentes aumente. Não significa necessariamente que essa representatividade reflita de fato as aspirações dos eleitores, mas já é alguma coisa, em vista da barafunda partidária que vigora hoje no País.

O sistema, portanto, deixará aos poucos de estimular o aventureirismo eleitoral, responsável pela tremenda fragmentação partidária que tanto dificulta a governabilidade e tanto facilita o trabalho de caciques políticos interessados somente em ter acesso ao Fundo Partidário e em vender tempo de TV nas campanhas eleitorais. Os partidos que ficarão pelo caminho podem se fundir uns com os outros, de modo a melhorar sua competitividade para os próximos pleitos, ou desaparecerão – sem que ninguém dê pela sua falta.

O fim das coligações nas eleições proporcionais vem se somar a outras mudanças menores, mas igualmente importantes. Uma delas, que já valeu nas duas últimas eleições, é a que determina que, para se eleger, um candidato ao Legislativo tem de obter ao menos 10% do quociente eleitoral – que é a divisão do número de votos válidos na eleição pelo total de cadeiras em disputa.

Além disso, o acesso ao Fundo Partidário e ao tempo de TV está limitado, desde a eleição de 2018, pelo desempenho do partido – a chamada cláusula de barreira. Naquele pleito, 14 partidos, cerca de metade das legendas hoje existentes, não conseguiram vencer essa barreira e devem perecer por inanição, a não ser que se juntem a outros partidos.

Nada disso significa que os partidos que consigam sobreviver a essa série de restrições sejam de fato autênticos representantes dos eleitores. Como se sabe, mesmo entre as grandes legendas há pouco de ideologia e doutrina e muito de arrivismo eleitoreiro. Raras agremiações exibem consistência partidária e podem apresentar-se como representação autêntica de seus correligionários e eleitores. E a maioria continua incapaz de se financiar por meio de seus apoiadores privados, tendo que recorrer ao dinheiro público depositado nos cada vez mais generosos fundos partidário e eleitoral.

Portanto, não há mudanças na legislação eleitoral que, por si mesmas, bastem e sejam realmente efetivas para melhorar a qualidade da representação. É preciso que o eleitorado demande dos partidos que tenham clareza de propósitos, muito além das mesquinhas disputas por nacos de poder e das ambições pessoais de seus líderes. É dessa educação cívica que depende fundamentalmente o aperfeiçoamento do sistema de representação e, portanto, da governabilidade do País.

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